Estamos
iniciando o ano litúrgico, com o primeiro domingo do Advento. O texto do
Evangelho das missas (Mt 24,37-44) é tirado do último grande discurso de Jesus
antes de sua Paixão e morte.
Composição – Para compô-lo, Mateus reescreveu o chamado “discurso
escatológico” do capítulo 13 de Marcos (lembre-se que o Evangelho de Mateus tem
como fonte o Evangelho de Marcos), ampliando-o e mudando substancialmente o
tema central: se no discurso transmitido por Marcos, a questão principal é a
dos sinais que precederão a destruição de Jerusalém e do Templo, no discurso
reelaborado por Mateus a questão central é a da vinda do Filho do homem e das
atitudes com que os discípulos devem preparar essa vinda.
Qual a razão? – A mudança do tema do discurso pode ser explicada pela situação
em que vivia a comunidade de Mateus e suas necessidades. Estamos na década de
80. Passaram dez anos sobre a destruição de Jerusalém e ainda não aconteceu a segunda
vinda de Jesus. Os crentes estão desanimados e desiludidos… O evangelista contempla
com preocupação os sinais de abandono, de desleixo, de rotina, de esfriamento
que começam a aparecer na comunidade e sente que é preciso renovar a esperança
e levar os crentes a comprometer-se na história, construindo o “Reino”.
Exortação – Nesta situação, Mateus descobre que as palavras de
Jesus encerram um profundo ensinamento e compõe com elas um conselho dirigido
aos cristãos. Esta exortação fundamenta-se numa profunda convicção: a vinda do
“Filho do homem” é um fato certo, ainda que não aconteça logo; enquanto não
chega o momento, é preciso preparar este grande acontecimento, vivendo de
acordo com os ensinamentos de Jesus.
Linguagem – A linguagem destes capítulos é estranha e enigmática…
Trata-se, no entanto, de um gênero usado com alguma frequência por alguns
grupos judeus e cristãos da época de Jesus. É a linguagem “apocalíptica”,
porque o seu objetivo é “revelar algo escondido” (“apocaliptô). Em muitas
ocasiões, esta revelação é dirigida a comunidades que vivem numa situação de
sofrimento, de desespero, de perseguição; o objetivo é animá-las, dar-lhes
esperança, mostrar-lhes que a vitória final será de Deus e daqueles que forem fiéis.
Vigilantes – Para Mateus, a vinda do Senhor é certa, embora ninguém
saiba o dia nem a hora (Mt 24,36); aos crentes resta estar vigilantes,
preparados e ativos… Para transmitir esta mensagem, Mateus usa três quadros… O
primeiro é o quadro da humanidade na época de Noé: os homens viviam, então,
numa alegre inconsciência, preocupados apenas em gozar a sua “vidinha”
descomprometida; quando o dilúvio chegou, apanhou-os de surpresa e despreparados…
Se o “aproveitar a vida” ao máximo for para o homem uma prioridade fundamental,
ele arrisca-se a deixar de lado o que é importante e a não cumprir o seu papel
no mundo.
Trabalho – O segundo quadro coloca-nos diante de duas situações
da vida cotidiana: o trabalho agrícola e a moagem do trigo… Os compromissos e
trabalhos necessários à subsistência do homem também não podem ocupá-lo de tal
forma que o levem a negligenciar o essencial: a preparação da vinda do Senhor.
Alerta – O terceiro quadro apresenta o exemplo do dono de uma
casa que adormece e deixa que a sua casa seja saqueada pelo ladrão… Os crentes
não podem, nunca, deixar-se adormecer, pois o seu sono pode levá-los a perder a
oportunidade de encontrar o Senhor que vem.
Prioridade – A questão fundamental é, portanto, esta: o crente
ideal é aquele que está sempre vigilante, atento, preparado, para acolher o
Senhor que vem. Não perde oportunidades, porque não se deixa distrair com os
bens deste mundo, não vive obcecado com eles e não faz deles a sua prioridade
fundamental… Mas, dia a dia, cumpre o papel que Deus lhe confiou, com empenho e
com sentido de responsabilidade.