sábado, 26 de novembro de 2011

Situação política na época do nascimento de Jesus

Palestina – Jesus nasceu e viveu na região da Palestina (hoje Israel).  Na época em que ele nasceu, a Palestina era dominada pelo Império Romano (desde o ano 31 a.C.), cujo imperador era Otávio Augusto.  Desde 37 a.C. a região formava um “reino cliente”, com alguma independência de Roma, sendo administrado pelo rei Herodes Magno (“O Grande”). 

Império Romano – Portanto, na época do nascimento de Jesus, mais da metade do mundo conhecido era dominada pelo Império Romano (toda a região do Mar Mediterrâneo, a Palestina, norte da África e Egito), sendo a Palestina um reino parcialmente independente, cedido pelo imperador romano a Herodes.  Nesta região viviam os judeus, um povo com língua (hebraico ou aramaico), religião e costumes próprios. 

Rei – Herodes (Magno) era um Idumeu (povo que havia invadido a Palestina e assumido a religião judaica, porém excluído pelos judeus), casado com Mariana (judia), com a qual teve 2 filhos (Alexandre e Aristóbulo), além de outros filhos de casamentos anteriores. Administrativamente Herodes era um político hábil: trouxe paz para a região, reconstruiu Jerusalém (com obras pagãs como teatros e anfiteatros, inaceitáveis para os judeus), instituiu os jogos atléticos em homenagem ao imperador (os jovens competiam nus) e reconstruiu o templo dos judeus com o dobro do tamanho. 

Herodes – Era, porém, obcecado pelo poder. Para mantê-lo, tornou-se um tirano e criminoso: mandou matar dois cunhados, 45 aristocratas, os dois filhos que teve com Mariana (depois de deixá-los presos por um ano), mandou afogar seu cunhado no rio Jordão, mandou matar a sogra, mandou queimar vivo dois sábios; cinco dias antes de morrer (aos 70 anos) mandou matar seu filho Antipater.  Também é atribuída a Herodes a morte de sua mulher Mariana. Em 36 anos de reinado, não se passou um só dia sem execução de inocentes.  Enciumado com o nascimento de Jesus (Mt 2,1-12), mandou matar todos os meninos com menos de 2 anos nascidos em Belém. 

Filhos – Herodes morreu entre março ou abril do ano -4 (aproximadamente dois anos após o nascimento de Jesus), sendo seu reino dividido entre seus filhos: Herodes Antipas, que ficou com a Galiléia e Peréia (norte); Herodes Filipe, que ficou com as 5 províncias ao leste do rio Jordão; Herodes Arquelau, ficou com a Judéia e Samaria (ao sul). Arquelau se mostrou mais tirano que o pai.  Nos primeiros dias de sua posse matou muitos judeus.  Num só dia foram mortas 3.000 pessoas. 

Arquelau – O Evangelho de Mateus deixa bem claro a situação de opressão do povo (Mt 2,16-23) por ocasião do nascimento do Messias: José, Maria e Jesus se refugiaram no Egito com medo de Herodes e, depois da morte deste, retornaram para a Galiléia, com medo de Arquelau (que reinava na Judéia e Samaria, apenas). Em razão de inúmeros protestos dos judeus, em 6 d.C. Arquelau foi destituído do cargo pelo Imperador Otávio, passando a Judéia a ter administração direta de Roma, através de procuradores.  Trinta anos depois, Poncius Pilatus se tornaria o mais famoso dos procuradores. 

Antipas – Herodes Antipas, muito ambicioso, casou-se com a filha do rei da Arábia, ao mesmo tempo em que conquistava a estima e confiança do imperador romano.  Numa viagem a Roma, hospedou-se na casa do irmão, Herodes Filipe, apaixonando-se por Herodíades, mulher do irmão.  Algum tempo depois, Herodíades foi morar na Palestina com Herodes Antipas e levou junto a sua filha Salomé.  A situação de adultério foi denunciada por João Batista, que foi decapitado por vingança de Herodíades. 

Como se vê, a plenitude dos tempos, ocasião escolhida por Deus para o nascimento de seu Filho, foi uma época sombria da história de judeus e pagãos. O que nos leva a refletir sobre uma frase de São Tomás de Aquino: “Deus não ama o homem porque o homem seja bom, mas o homem é bom porque Deus o ama”.

sábado, 19 de novembro de 2011

Foi a mim que o fizestes

final. Você sabe dizer em que época foi realizado esse discurso? (resposta abaixo).

 O evangelho deste domingo é o famoso texto de Mateus 25, 31-46 sobre o Juízo Final. Nesse texto, enfatiza-se a sorte eterna dos que optaram ou não pela vivência da "justiça do Reino dos Céus". Mostra que a vivência dessa justiça será o critério de Deus para o julgamento final. Ilustra-se, de uma maneira viva, o sentido da frase lapidar do Sermão da Montanha: "Se a justiça de vocês não for superior à dos doutores da lei e dos fariseus, não entrarão no Reino do Céu" (5, 20). 

Cristo Rei – Chegamos ao último domingo do ano litúrgico, no qual celebramos a festa de Cristo Rei. O Evangelho faz-nos assistir ao último ato da história: o juízo universal. Que diferença há entre esta cena e a de Cristo ante os juízes em sua Paixão! Então, todos estavam sentados e Ele, em pé, amarrado; agora todos estão em pé e Ele está sentado no trono. Os homens e a história julgam Cristo; nesse dia, Cristo julgará os homens e a história. Ante Ele decide-se quem permanece em pé e quem cai. Esta é a fé imutável da Igreja que em seu Credo proclama: “De novo virá com glória para julgar vivos e mortos, e seu reino não terá fim”. 

Juízo – O Evangelho diz-nos também como acontecerá o juízo: “tive fome, e me destes de comer, tive sede e me destes de beber...”. O que acontecerá, portanto, com quem não só não deu de comer a quem tinha fome, mas também lhe tirou a comida; não só não acolheu, mas provocou que o outro se convertesse em forasteiro? Isto não afeta só a uns poucos criminosos.  

Impunidade – É possível que se instaure um ambiente geral de impunidade, no qual se utilizem carreiras para violar a lei, para corromper ou deixar corromper, com a justificativa de que todos fazem isso. Mas a lei nunca foi abolida. De repente, chega um dia, no qual se começa uma investigação e sucede-se uma grande devastação, como a que aconteceu na Itália, com “Mãos Limpas” [escândalos de corrupção da administração pública italiana, nos anos noventa].  

Todos fazem – Mas não é esta a situação na qual vivemos, em certo sentido, todos nós, investigados e investigadores, frente à lei de Deus? Violam-se tranquilamente os mandamentos, um após o outro, inclusive o que diz “não matarás” (para não falar do que diz “não cometerás adultério”), com o pretexto de que, de todos os modos, o fazem todos, que a cultura, o progresso e inclusive a lei humana já o permitem. Mas Deus nunca pensou em abolir nem os mandamentos nem o Evangelho e este sentido geral de segurança não é mais que um engano fatal. 

Tempo – Há alguns anos, restaurou-se o afresco do juízo universal, de Miguelangelo. Mas há outro juízo universal que é preciso restaurar: não está pintado em paredes de ladrilho, mas no coração dos cristãos. Ficou totalmente descolorido e está convertendo-se em ruínas. “O mais além, e com ele o juízo, converteu-se em uma brincadeira, em algo tão incerto que se diverte pensando que havia uma época na qual esta idéia transformava toda a existência humana” (Soren Kierkegaard). Alguém poderia tentar consolar-se, dizendo que, depois de tudo, o dia do juízo está muito longe, talvez faltem milhões de anos. Mas Jesus, no Evangelho, responde: “Tolo! Ainda esta noite te reclamarão a alma” (Lucas 12, 20). 

Misericórdia – O tema do juízo se entrecruza, na liturgia deste domingo, com o de Jesus bom pastor. No salmo responsorial se diz: “O Senhor é meu Pastor, nada me faltará: em verdes prados me faz repousar” (Salmo 22, 1-2). O sentido está claro: agora Cristo se revela a nós como bom pastor; dia virá em que será nosso juiz. Agora é o tempo da misericórdia, então será o tempo da justiça. A nós cabe escolher, enquanto estamos a tempo. 

Este texto é de autoria do padre Raniero Cantalamessa OFM – pregador da Casa Pontifícia, Vaticano.

sábado, 12 de novembro de 2011

Os talentos

No Evangelho das missas deste domingo (Mt 25,14-30), Jesus apresenta a parábola dos talentos. 

Ambiente – Mais uma vez, o Evangelho apresenta-nos o tema da segunda vinda de Jesus. A catequese que Mateus apresenta neste discurso tem em conta as necessidades da sua comunidade cristã. Estamos no final do séc. I (década de 80). Os cristãos, fartos de esperar a segunda vinda de Jesus, esqueceram o seu entusiasmo inicial… Instalaram-se na mediocridade, na rotina, no comodismo, na facilidade. As perseguições que se adivinham provocam o desânimo e a deserção… Era preciso reaquecer o entusiasmo dos crentes, despertar a fé, renovar o compromisso cristão com Jesus e com a construção do Reino. 

Talentos – Por esta razão, Mateus encoraja a todos, para que se lembrem de que a segunda vinda do Senhor acontecerá no final da história humana; e que, até lá, os crentes devem “colocar os seus talentos para render”, vivendo na fidelidade aos ensinamentos de Jesus e comprometidos com a construção do Reino. A parábola fala de “talentos” que um senhor distribuiu entre os servos. Um “talento” significa uma quantia muito considerável… Corresponde a 36 quilos de prata e ao salário de aproximadamente 3.000 dias de trabalho de um operário não qualificado. 

A “parábola dos talentos” – Conta que um “senhor” partiu em viagem e deixou a sua fortuna nas mãos dos seus servos. A um, deixou cinco talentos, a outro dois e a outro um. Quando voltou, chamou os servos e pediu-lhes contas do que haviam feito com o que tinham recebido. Os dois primeiros duplicaram a soma recebida; mas o terceiro tinha escondido cuidadosamente o talento que lhe fora confiado, pois conhecia a exigência do “senhor” e tinha medo. Os dois primeiros servos foram louvados pelo “senhor”, ao passo que o terceiro foi severamente criticado e condenado. 

O Reino – Provavelmente a parábola, tal como saiu da boca de Jesus, era uma “parábola do Reino”. O “senhor” exigente seria Deus, que reclama para Si uma lealdade a toda a prova e que não aceita meios tons e situações de acomodação e de preguiça. Os servos a quem Ele confia os valores do Reino devem acolher os seus dons e fazer com que eles rendam, a fim de que o Reino seja uma realidade. No Reino, ou se está completamente comprometido, ou não se está. 

Dons – No texto de Mateus, o “senhor” é Jesus que, antes de deixar este mundo, entregou bens consideráveis aos seus “servos” (os discípulos). Os “bens” são os dons que Deus, através de Jesus, ofereceu aos homens – a Palavra de Deus, os valores do Evangelho, o amor que se faz serviço aos irmãos e que se dá até a morte, a partilha e o serviço, a misericórdia e a fraternidade, os carismas e ministérios que ajudam a construir a comunidade do Reino… Os discípulos de Jesus são os depositários desses “bens”. A questão é, portanto, esta: como devem ser utilizados estes “bens”? Eles devem dar frutos, ou devem ser cuidadosamente conservados enterrados? Os discípulos de Jesus podem – por medo, por comodismo, por desinteresse – deixar que esses “bens” fiquem infrutíferos? 

Os bens – Na perspectiva da parábola, os “bens” que Jesus deixou aos seus discípulos têm de dar frutos. A parábola apresenta como modelos os dois servos que mexeram com os “bens”, que demonstraram interesse, que se preocuparam em não deixar parados os dons do “senhor”, que fizeram investimentos, que não se acomodaram nem se deixaram paralisar pela preguiça, pela rotina, ou pelo medo. Por outro lado, a parábola condena veementemente o servo que entregou intactos os bens que recebeu. Ele teve medo e, por isso, não correu riscos; mas não só não tirou desses bens qualquer fruto, como também impediu que os bens do “senhor” fossem criadores de vida nova. 

Comodismo – Através desta parábola, Mateus incentiva a sua comunidade a estar alerta e vigilante, sem se deixar vencer pelo comodismo e pela rotina. Esquecer os compromissos assumidos com Jesus e com o Reino, demitir-se das suas responsabilidades, deixar na gaveta os dons de Deus, aceitar passivamente que o mundo se construa de acordo com valores que não são os de Jesus, instalar-se na passividade e no comodismo é privar os irmãos, a Igreja e o mundo dos frutos a que têm direito. 

Construir – O discípulo de Jesus não pode esperar o Senhor de mãos erguidas e de olhos postos no céu, alheio aos problemas do mundo e preocupado em não se contaminar com as questões do mundo… O discípulo de Jesus espera o Senhor profundamente envolvido e empenhado no mundo, ocupado em distribuir a todos os homens, seus irmãos, os “bens” de Deus e em construir o Reino.

sábado, 5 de novembro de 2011

As bem-aventuranças

No Evangelho das missas deste domingo serão lidas as bem-aventuranças, também chamadas Sermão da Montanha (Mt 5,1-12). 

Verdadeiro Apóstolo – O Sermão da Montanha nos apresenta um retrato das qualidades do verdadeiro discípulo, daquele que, no seguimento de Jesus, procura viver os valores do Reino de Deus. Basta uma leitura superficial para ver que a proposta de Jesus está na contramão da proposta da sociedade vigente – tanto a do tempo de Jesus, como a de hoje. O texto de Mateus deixa claro que o seguimento de Jesus exige uma mudança radical na nossa maneira de pensar e viver. 

"Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus” – Este versículo chama a atenção pelo fato de estar com o verbo no presente: o Reino já é dos pobres em espírito e dos perseguidos por causa da justiça. O Senhor promete a felicidade na bem-aventurança eterna e, ao mesmo tempo, já nesta vida (“deles é”, não diz “deles será”). As bem-aventuranças são o mais surpreendente código de felicidade, e não se trata de uma felicidade qualquer: é uma felicidade incomparável, interior e profunda, embora ainda não possuída de modo perfeito e completo na vida terrena.  

Os pobres em espírito – No Antigo Testamento, o pobre está já delineado não só como uma situação socioeconômica, mas como um valor religioso muito elaborado: é pobre quem se apresenta diante de Deus com uma atitude humilde, sem méritos pessoais, considerando a sua realidade de homem pecador, necessitado do perdão divino, da misericórdia de Deus para ser salvo. Assim, além de viver com uma sobriedade e uma austeridade de vida reais, efetivas, é necessário que aceite e queira tais condições de pobreza – não como algo imposto pela necessidade, mas, voluntariamente, com afeto. 

Pobreza – A ‘explicação’ de Mateus, “em espírito”, sublinha a exigência dessa mesma pobreza: não é pobre em espírito quem só é assim porque é obrigado pela sua situação socioeconômica, mas também aquele que, além disso, é pobre, querendo essa pobreza de modo voluntário. Esta atitude religiosa de pobreza está muito relacionada com a chamada infância espiritual. O cristão considera-se diante de Deus como um filho pequeno que não tem nada como propriedade; tudo é de Deus, o seu Pai, e tudo que tem deve a Ele. De qualquer modo, a pobreza em espírito – ou seja, a pobreza cristã – exige o desprendimento dos bens materiais e austeridade no uso deles.  

Bem-aventurados os humildes, porque possuirão a terra. A tradução preferiu um termo mais suave do que “os mansos”, que são os que sofrem serenamente e sem ira, ódio ou abatimento, as perseguições injustas e as contrariedades. De fato só os humildes são capazes da virtude da mansidão, pois não dão demasiada importância a si próprios. A “terra” é a nova terra prometida, isto é, o Céu.  

Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados. Refere-se aos aflitos, e muito particularmente os que têm o coração cheio de mágoa por terem ofendido a Deus e que, com vontade de reparação, choram e lamentam os seus pecados.  

Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. A ideia de justiça na Sagrada Escritura é uma ideia de natureza religiosa: justo é aquele que cumpre a vontade de Deus e justiça corresponde à santidade, vocação a que todos são chamados.  

Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus. São, em geral, os que têm uma intenção reta, os que são capazes de um amor puro, limpo e nobre, os que têm um olhar reto e íntegro; está, portanto, englobada a castidade, mas não é só ela.  

Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus (uma tradução mais expressiva do que pacíficos). São os que promovem a paz entre os homens e dos homens com Deus, fundamento sério de toda a paz no mundo.  

Bem-aventurados sereis, quando, por minha causa, vos insultarem, vos perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós. Jesus deixa claro qual é a consequência de assumir esse projeto de vida: a perseguição! Um sistema baseado em valores antievangélicos não pode aguentar quem a contesta e questiona: algo que a história dos mártires testemunha muito bem.