sábado, 28 de maio de 2011

Os mandamentos de Jesus

No Evangelho deste domingo (Jo 14,15-21) será lido um trecho do longo discurso de despedida de Jesus na última ceia, onde é retomado o tema dos mandamentos de Jesus e sua observância. 

Ambiente – Estamos na noite de 6 de abril do ano 30, quinta-feira, na véspera da morte de Jesus na cruz, durante a “Ultima Ceia”, com todos os apóstolos. A decisão de matar Jesus já está tomada pelas autoridades judaicas e Jesus sabe-o. A morte na cruz é mais do que uma probabilidade: é o cenário imediato.

Discurso – Durante a Ceia, Jesus despediu-Se dos discípulos e fez-lhes as últimas recomendações. As palavras de Jesus soam a um “testamento final”: Ele sabe que vai partir para o Pai e que os discípulos vão continuar no mundo. Jesus fala-lhes, então, do caminho que percorreu (e que ainda tem de percorrer, até à consumação da sua missão e até chegar ao Pai); e convida os discípulos a seguir o mesmo caminho de entrega a Deus e de amor radical aos irmãos. 
 

Caminho – É seguindo esse “caminho” que eles se tornarão Homens Novos e que chegarão a ser “família de Deus”. Os discípulos, no entanto, estão inquietos e desconcertados. Será possível percorrer esse “caminho” se Jesus não caminhar ao lado deles? Como é que eles manterão a comunhão com Jesus e como receberão d’Ele a força para doar, dia a dia, a própria vida?

Presente – No entanto, Jesus garante aos discípulos que não os deixará sós no mundo. Ele vai para o Pai; mas vai encontrar forma de continuar presente e de acompanhar, a par e passo, a caminhada dos seus discípulos. É preciso, no entanto, que os discípulos continuem a seguir Jesus, a manifestar a sua adesão a Ele, a amá-l’O. A consequência desse amor é o cumprir os mandamentos que Jesus deixou.
 

Paráclito – Como é que Jesus vai estar presente ao lado dos discípulos, dando-lhes a coragem para percorrer “o caminho” do amor e do dom da vida? Jesus fala no envio do “Paráclito”, que estará sempre com os discípulos. A palavra grega “paráklêtos”, utilizada por João, pertence ao vocabulário jurídico e designa, nesse contexto, aquele que ajuda ou defende o acusado. Pode, portanto, traduzir-se como “advogado”, “auxiliar”, “defensor”. A partir daqui, pode deduzir-se, também, quer o sentido de “consolador”, quer o sentido de “intercessor”.  

Espírito – No Novo Testamento, a palavra só aparece em João, onde é usada quer para designar o Espírito (Jo 14,26; 15,26; 16,7), quer o próprio Jesus (que no céu, cumpre uma missão de intercessão - cf. 1 Jo 2,1). O “Paráclito” que Jesus vai enviar é o Espírito Santo. Enquanto esteve com os discípulos, Jesus ensinou-os, protegeu-os, defendeu-os; mas, a partir de agora, será o Espírito que ensinará e cuidará da comunidade de Jesus.  

Duplo papel – O Espírito desempenhará um duplo papel: em termos internos, conservará a memória da pessoa e dos ensinamentos de Jesus, ajudando os discípulos a interpretar esses ensinamentos à luz dos novos desafios; por outro, dará segurança aos discípulos, guiá-los-á e defendê-los-á quando eles tiverem de enfrentar a oposição e a hostilidade do mundo.  

Órfãos – Depois de garantir aos discípulos o envio do “Paráclito”, Jesus reafirma aos discípulos que não os deixará “órfãos” no mundo. A palavra utilizada (“órfãos”) é muito significativa: no Antigo Testamento, o “órfão” é o protótipo do desvalido, do desamparado, do que está totalmente à mercê dos poderosos e que é a vítima de todas as injustiças. Jesus é claro: os seus discípulos não vão ficar indefesos, pois Ele vai estar ao lado deles.  

Comunhão – No dia em que Jesus for para o Pai e os discípulos receberem o Espírito, a comunidade descobrirá que faz parte da família de Deus (v. 20-21). Jesus identifica-Se com o Pai, por ter o mesmo Espírito; os discípulos identificam-se com Jesus, por ação do Espírito. A comunidade cristã está unida com o Pai, através de Jesus, numa experiência de unidade e de comunhão de vida entre Deus e o homem. Nesse dia, a comunidade será a presença de Deus no mundo: ela e cada membro dela convertem-se em morada de Deus, o espaço onde Deus vem ao encontro dos homens. Na comunidade dos discípulos e através dela, realiza-se a ação salvadora de Deus no mundo.

sábado, 21 de maio de 2011

As Aparições de Cristo Ressuscitado

Após os acontecimentos da Paixão, Jesus apareceu inúmeras vezes para os apóstolos, discípulos e todo o povo. Depois de 40 dias, aconteceu a ascensão aos céus, não havendo mais relatos de aparições. 

Quantas foram as aparições – Vamos enumerar as aparições de Jesus citadas na Bíblia. Pegue sua Bíblia e confira. 

O que é aparição? – Inicialmente devemos definir claramente o que é aparição. Esta resposta pode ser orientada pela afirmação de Lucas em At 1,3: "É a eles que Jesus se apresentava vivo após a sua Paixão; tiveram mais de uma prova disto, enquanto, durante quarenta dias, Ele lhes aparecera e mantivera conversação com eles sobre o Reino de Deus". Portanto são consideradas aparições apenas as situações em que Jesus conversou, respondeu perguntas, comeu, instruiu, foi tocado; estas aparições aconteceram nos 40 dias seguintes a sua Paixão, ou seja, entre os dias 7 de abril e 17 de maio do ano 30. Após a ascensão aos céus ocorreram apenas visões, expressadas de diversas formas (clarão de luz, em sonho, etc.). 

Quantas foram? A Bíblia descreve um total de 11 aparições: nove citadas nos Evangelhos e duas nas Cartas de São Paulo.


Aparições descritas nos Evangelhos:

1 – a Madalena e às mulheres no túmulo - Mt 28,9-11; Jo 20,13-18; Mc 16,9-11;

2 – aos 11 na montanha da Galiléia - Mt 28,16-20; Mc 16,15 (talvez 1Cor 15,5);

3 – aos discípulos de Emaús - Lc 24,13-35; Mc 16,12;

4 – aos 11 apóstolos durante uma refeição – Lc 24,36-43; Mc 16,14; At 1,4-5; At 10,41 (talvez 1Cor 15,5);

5 – aos discípulos sem Tomé - Jo 20,19-23 (talvez 1Cor 15,5);

6 – aos discípulos com Tomé - Jo 20,24-29; (talvez 1Cor 15,5);

7 – à beira do lago - Jo 21,1-23 (talvez At 10,41);

8 – a Simão - Lc 24,34; 1 Cor 15,5;

9 – na ascensão aos céus, em Betânia - Lc 24,50-53; Mc 16,19; At 1,8


Aparições descritas nas cartas de Paulo:

10 – a mais de quinhentas pessoas - 1Cor 15,6;

11 – a Tiago - 1Cor 15,7;


Algumas Visões (não consideradas como aparições):

1 – Visão de Paulo no caminho para Damasco no ano 37 – At 9,3; At 22,6; At 26, 12; 1Cor 15,8; 1Cor 9,1; Gal 1,12;

2 – A visão de Ananias no ano 37 – At 9, 10-16;

3 – A visão de Paulo no Templo em Jerusalém em abril do ano 58 – At 22,18;

4 – Outra visão de Paulo em Jerusalém em abril do ano 58 – At 23, 11;

5 – A visão de João citada em Ap 1,9s, escrito entre os anos 95 e 100. 

Algumas observações – As citações em Mt 28,5; Mc 16,5; Lc 24,4 são apenas aparições de anjos.

sábado, 14 de maio de 2011

O Bom Pastor

O capítulo 10 do 4º Evangelho é dedicado à catequese do “Bom Pastor”. O autor utiliza esta imagem para propor uma catequese sobre a missão de Jesus: a obra do “Messias” consiste em conduzir o homem às pastagens verdejantes e às fontes cristalinas de onde brota a vida em plenitude.

Símbolo – A imagem do “Bom Pastor” não foi inventada pelo autor do 4º Evangelho. Literariamente falando, este discurso simbólico está construído com materiais provenientes do Antigo Testamento. Em especial, este discurso tem presente Ez 34 (onde se encontra a chave para compreender a metáfora do “pastor” e do “rebanho”). Falando aos exilados da Babilónia, Ezequiel constata que os líderes de Israel foram, ao longo da história, maus “pastores”, que conduziram o Povo por caminhos de morte e de desgraça; mas – diz Ezequiel – o próprio Deus vai agora assumir a condução do seu Povo; Ele porá à frente do seu Povo um “Bom Pastor” (o “Messias”), que o livrará da escravidão e o conduzirá à vida.

Partes – O texto do Evangelho, que hoje nos é proposto, está dividido em duas partes, ou em duas parábolas. Na primeira parábola (Jo 10,1-6), Jesus apresenta-se preferencialmente como “o Pastor”, cuja ação se contrapõe a esses dirigentes judeus que se arrogam o direito de pastorear o “rebanho” do Povo de Deus, mas sem serem “pastores”.

Judeus – Jesus não usa meias palavras: os dirigentes judeus são ladrões e bandidos, que se servem das suas prerrogativas para explorar o Povo (ladrões) e usam a violência para o manter sob a sua escravidão (bandidos). Aproximam-se do Povo de Deus de forma abusiva e ilegítima, porque Deus não lhes confiou essa missão (“não entram pela porta”): foram eles que a usurparam. O seu objetivo não é o bem das “ovelhas”, mas o seu próprio interesse.

Jesus – Ao contrário, Jesus é “o Pastor” que entra pela porta: ele tem um mandato de Deus e a sua missão foi-Lhe confiada pelo Pai. Em Ezequiel, o papel do “pastor” correspondia, em primeiro lugar, a Deus e ao enviado de Deus, o “Messias” descendente de David. Ao apresentar-se como Aquele “que entra pela porta”, com autoridade legítima, Jesus declara-Se o “Messias” enviado por Deus para conduzir o seu Povo e para guiá-lo para as pastagens onde há vida em plenitude. Ele entra no redil das “ovelhas” para cuidar delas, não para explorá-las.

Pastor – Como é que Jesus exercerá a sua missão de “pastor”? Em primeiro lugar, irá chamar as “ovelhas”. “Chama-as pelo seu nome”, porque conhece cada uma e com cada uma quer ter uma relação pessoal. Não obrigará ninguém a responder-Lhe; mas os que responderem ao seu chamamento farão parte do seu “rebanho”. Depois, o “pastor” caminhará “diante das ovelhas” e estas  lhe seguirão. Ele indica-lhes o caminho, pois Ele próprio é “o caminho” (Jo 14,6) que leva à vida plena.

Porta – Na segunda parábola (Jo 10,7-9), Jesus apresenta-Se como “a porta”. Aqui, Ele já não é o pastor legítimo que passa pela porta, mas “a porta”. Significa que Jesus é o único lugar de acesso para que as “ovelhas” possam encontrar as pastagens que dão vida. “Passar pela porta” que é Jesus significa aderir a Ele, segui-lo, acolher as suas propostas. As “ovelhas” que passam pela porta que é Jesus (isto é, que aderem a Ele) podem passar para a terra da liberdade (onde não mandam os dirigentes que exploram e roubam), onde encontrarão “pastos” (vida em plenitude).

Vida – O nosso texto termina com a reafirmação do contraste entre Jesus e os dirigentes: os líderes religiosos judaicos utilizam o “rebanho” para satisfazer os seus próprios interesses egoístas, despojam e exploram o povo; mas Jesus só procura que o seu “rebanho” encontre vida em plenitude.

sábado, 7 de maio de 2011

A CAMINHO DE EMAÚS...

No Evangelho das missas deste domingo será lido o trecho da aparição de Jesus aos discípulos de Emaús.  Vamos examinar a descrição de Lucas. 

A Aparição – Era o domingo da ressurreição. Dois discípulos caminhavam de Jerusalém para a aldeia de Emaús, distante 12 quilômetros. Durante as duas horas de caminhada, comentavam os fatos ocorridos naquele dia. Jesus se aproxima, passa a caminhar com eles e, puxando a conversa, pergunta sobre o que discutem.  Eles não reconhecem Jesus. Cléofas, admirado, lhe diz que ele deve ser a única pessoa em Jerusalém que não sabe o que aconteceu com Jesus Nazareno. Jesus lhes descreve toda a história da salvação, começando por Moisés, passando por toda a Escritura. Ao chegar à casa de um deles, Jesus distribuiu o pão, sendo reconhecido por eles. Os discípulos voltaram para Jerusalém para contar aos apóstolos o que tinha acontecido. 

Jerusalém – O relato vai da Jerusalém do desalento e, percorrendo um caminho de diálogo, termina na Jerusalém da alegria. O momento negativo do episódio não é a ausência de Jesus, mas a impossibilidade de reconhecê-lo. O companheiro desconhecido de viagem havia provocado nos dois caminhantes uma reflexão que tinha como base a experiência da convivência com Jesus. Essa reflexão levara-os a constatar duas contradições: Jesus fora profeta poderoso, mas isso não impedira que fosse julgado, condenado e crucificado; além do mais, como ele demonstrara ser tão poderoso, os dois discípulos confiaram na redenção de Israel, mas, transcorridos três dias desde a morte do Mestre sem que nada acontecesse, sepultaram suas esperanças.  

Jesus ensina – Jesus lembra os desanimados; por sua pouca perspicácia e pela lerdeza de seus corações, não souberam interpretar os acontecimentos à luz dos Profetas, razão pela qual empenha-se ele próprio em evocar as profecias e interpretá-las. Aquele que os discípulos chamavam “profeta” agora é “o Cristo”, e quem fora condenado à morte pela cruz agora entra em sua glória. Os discípulos, entretanto, pedem àquele que lhes parecera ser um “forasteiro” em Jerusalém, que “fique” com eles quando chegam ao final da jornada.  

Ritual Eucarístico – O último ato dessa longa passagem é uma acurada descrição do comportamento de Jesus: como se senta à mesa, toma o pão, abençoa-o, parte-o e o distribui. Por fim os discípulos reconhecem Jesus, que desaparece repentinamente. E o momento positivo daquela experiência, cuja conclusão não é a presença visível de Jesus, mas uma ação que tem todas as características de um ritual, é acompanhada pelo fervor do coração e pela revelação do sentido das Escrituras, tendo um epílogo em Jerusalém, onde vão prestar testemunho aqueles que haviam visto Jesus ressuscitado. 

Jesus Presente – O episódio de Emaús é uma grandiosa síntese de ausência e presença, morte e vida, cruz e glória, solidão e encontro, fuga renunciadora e retorno anuncia­dor. Emaús é uma cena de presença de Jesus. Não tem como resultado nenhuma missão específica, porque, logo depois, ocorre outra grande aparição a todos os apóstolos reunidos (Lc 24,36-49). O episódio de Emaús tem implícito, porém, um grande ensinamento: os dois discípulos simbolizam, para Lucas, toda a comunidade cristã. Tal como os discípulos, a comunidade experimenta a ausência de Jesus — uma ausência misteriosa, porque na realidade Jesus caminha ao lado de seus discípulos, embora se mantenha incógnito. As Escrituras — interpretadas pelo próprio Jesus — e a Igreja prestam testemunho de sua existência. 

Escrituras e Eucaristia – As Escrituras não são, entretanto, o elemento conclusivo: reconfortam o coração, mas o reconhecimento só se dá quando o pão é parti­do. O encontro no rito não restabelece a presença física como durante a vida terrena de Jesus porque se resolve com uma nova ausência. É exatamente o que acontece na Igreja, beneficiada pela Comunhão no mistério e afligida por uma ausência que só se resolve na Eucaristia.