sábado, 26 de agosto de 2017

Pedro e a cátedra do primeiro Papa



No Evangelho das missas deste domingo (Mt 16,13-19), Pedro reconhece Jesus como Messias, é proclamado como base (pedra fundamental) da Igreja e recebe as chaves do Reino dos Céus.

Época – Mateus escreve na década de 80, quando os discípulos de Jesus oriundos do judaísmo estavam sendo expulsos das sinagogas e os cristãos começavam a estruturar-se em uma instituição religiosa própria, na qual a figura de referência era Pedro, já martirizado em Roma. Pedro era lembrado pelo seu testemunho corajoso diante da perseguição do Império Romano.

O que é cátedra? A “cátedra” quer dizer a sede fixa do bispo, colocada na igreja matriz de uma diocese, que por este motivo é chamada “catedral”. É o símbolo da autoridade do bispo e de seu “magistério” (ensinamento evangélico transmitido à comunidade cristã) como sucessor dos apóstolos. Quando o bispo toma posse da Igreja particular que lhe foi confiada, com a mitra e o báculo, senta-se em sua cátedra. Dessa sede guiará, como mestre e pastor, o caminho dos fiéis, na fé, na esperança e na caridade!

Qual foi a “cátedra” de São Pedro? Ele foi escolhido por Cristo como “rocha” sobre a qual edificaria a Igreja (Mt 6,18) e começou seu ministério em Jerusalém, depois da Ascensão do Senhor e de Pentecostes. A primeira “sede” da Igreja foi o Cenáculo e é provável que naquela sala (onde estava presente Maria Santíssima), se reservasse um posto especial a Simão Pedro. Depois, a sede de Pedro foi Antioquia (na Síria, hoje Turquia), cidade evangelizada por Barnabé e Paulo. Nela, “pela primeira vez os discípulos receberam o nome de ‘cristãos’” e Pedro foi o primeiro bispo. De Antioquia a Providência levou Pedro a Roma.

Caminho – Portanto, de Jerusalém (Igreja nascente), Pedro passa pela Antioquia (primeiro centro da Igreja que agrupava pagãos e judeus), chegando a Roma, centro do Império, onde concluiu com o martírio sua carreira ao serviço do Evangelho. Por este motivo, a sede de Roma, que havia recebido a maior honra, recebeu também a tarefa confiada por Cristo a Pedro, de estar ao serviço de todas as Igrejas particulares, para a edificação e a unidade de todo o Povo de Deus.

Roma – A sede de Roma, depois destas migrações de São Pedro, foi reconhecida como a sede do sucessor de Pedro e a “cátedra” de seu bispo representou a do apóstolo encarregado por Cristo de apascentar todo seu rebanho. Testificam isso os mais antigos Padres da Igreja, como Santo Irineu, Tertuliano e São Jerônimo.

Santo Irineu – Irenaeus (130 a 202, bispo de Lyon), em seu livro “Contra as heresias” (ano 180), descreve a Igreja de Roma como a “maior e mais antiga, conhecida por todos, fundada e constituída em Roma pelos dois gloriosos apóstolos Pedro e Paulo”, e acrescenta: “Com esta Igreja, por sua exímia superioridade, deve estar em acordo a Igreja universal, ou seja, os fiéis que estão por toda parte”.

Tertuliano – Tertuliano (160 a 220) foi um dos maiores escritores cristãos. No livro “Prescrições contra todas as heresias”, afirma: “Esta Igreja de Roma é bem-aventurada! Os apóstolos derramaram nela, com seu sangue, toda a doutrina”. A cátedra do bispo de Roma representa, portanto, não só seu serviço à comunidade romana, mas também sua missão de guia de todo o Povo de Deus.

São Jerônimo – São Jerônimo (347 a 420), doutor da Igreja, fez a tradução da Bíblia para o latim. Em seu livro “As Cartas”, dá um testemunho particularmente interessante, porque menciona explicitamente a “cátedra” de Pedro, apresentando-a como porto seguro de verdade e de paz. Assim escreve: “Decidi consultar a cátedra de Pedro, onde se encontra essa fé que a boca de um apóstolo exaltou; venho agora pedir alimento para minha alma ali, onde recebi a veste de Cristo. Não sigo outro primado senão o de Cristo; por isso, ponho-me em comunhão com tua beatitude, ou seja, com a cátedra de Pedro. Sei que sobre esta pedra está edificada a Igreja”.


Vaticano – No altar principal da basílica de São Pedro encontra-se o monumento à cátedra do apóstolo Pedro (obra do artista Bernini): é um grande trono de bronze, sustentada pelas estátuas de quatro doutores da Igreja – dois do Ocidente (Santo Agostinho e Santo Ambrósio) e dois do oriente (São João Crisóstomo e Santo Atanásio).

sábado, 19 de agosto de 2017

Como aconteceu a Assunção de Maria?



Neste domingo a Igreja comemora a Assunção de Maria, conforme o dogma publicado pelo Papa Pio XII (1950): “A Virgem Imaculada, que fora preservada de toda a mancha de culpa original, terminando o curso da sua vida terrena, foi elevada à glória celeste em corpo e alma”.

Mistério – Os detalhes da morte, enterro e assunção da Virgem Maria são um dos maiores mistérios do Novo Testamento. A Igreja usa o texto da Carta de São Paulo (1Cor 15, 20-23) e do Apocalipse (Ap 11, 19; 12, 1), para fundamentar o dogma. Nenhuma descrição ou fato histórico é citado. Apresentamos aqui as descobertas mais recentes sobre o assunto:

Cronograma – Um cronograma aproximado da vida de Maria seria o seguinte: nasceu no ano 20 a.C., aproximadamente, filha de Ana e Joaquim. No final do ano 7 a.C. (com 13 anos) deu à luz Jesus, na cidade de Belém. Maria assistiu a crucificação e morte de Jesus em abril do ano 30 d.C., com 50 anos de idade. Segundo Hipólito de Tebas (autor bizantino do século VII), a Virgem Maria viveu onze anos após a morte de Jesus, morrendo no ano de 41 d.C. (com 61 anos de idade).

João Paulo II – Em catequese, no dia 9 de julho de 1997, o Papa João Paulo II disse que o primeiro testemunho de fé na assunção da Virgem Maria aparece nas histórias apócrifas, intituladas "Transitus Mariae", cujo núcleo original remonta aos séculos II e descreve a morte, o sepultamento, o túmulo e a ascensão de Maria aos Céus. Segundo a palavra do Pontífice este texto reflete uma intuição da fé do povo de Deus.

O texto – O autor do “Transitus Mariae” usa o pseudônimo de Melitão. Existiu um Melitão, Bispo de Sardes, no ano de 150, mas não deve ser o mesmo. O autor diz que escutou de São João apóstolo a seguinte história: Maria vivia em sua casa, quando recebeu a visita de um anjo anunciando que, em três dias, seria elevada aos céus. Então ela pediu ao anjo que gostaria que todos os apóstolos estivessem reunidos.

Morte – Três dias depois, Maria morreu na presença de todos os apóstolos. Pedro recebeu uma mensagem de Cristo: ele deveria tomar o corpo de Maria e levar à direita da cidade, até o oriente, onde encontraria um sepulcro novo. Ali deveria depositar o corpo de Maria e aguardar um novo aparecimento de Cristo.

Enterro – Os apóstolos assim fizeram: colocaram o corpo num caixão, saíram de Jerusalém, à direita da cidade, entraram no Vale de Josafat (ou vale do Cedron), no caminho para o Monte das Oliveiras, depositaram o corpo no sepulcro, fecharam com uma pedra e ficaram esperando.

Assunção – Cristo ressuscitado apareceu, saudando a todos: “A paz esteja convosco”. Pedro disse: “Senhor, se possível, parece justo que ressuscite do corpo de sua mãe e a conduza contigo ao Céu”.  Jesus disse: “Tu que não aceitasse a corrupção do pecado não sofrerás a corrupção do corpo no sepulcro”. E os anjos a levaram ao paraíso. Enquanto ela subia, Jesus falou aos apóstolos: “Do mesmo modo que estive com vocês até agora, estarei até o fim do mundo”. E desapareceu entre as nuvens junto com os anjos e Maria.

Impressionante descoberta – A arqueologia estudou durante anos os detalhes da pequena igreja existente no local descrito pelo texto “Transitus Mariae” sem nada encontrar. Em 1972, uma chuva torrencial alagou a igreja e exigiu a reconstrução do piso. Ao remover o piso, apareceu um grande porão, com uma câmara funerária do primeiro século. Todas as descrições do livro apócrifo estavam confirmadas.

QUER LER MAIS – Se você se interessou pelo assunto, nós podemos lhe oferecer a história completa do “Túmulo de Maria” escrita pelo teólogo católico Ariel Alvarez Valdes (17 páginas, em espanhol) com fotos e desenhos do túmulo. Também podemos oferecer o texto completo do livro apócrifo “Transitus Mariae”, escrito no século II (16 páginas, em espanhol). Solicite por E-mail.

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

POR QUE JESUS MULTIPLICOU OS PÃES DUAS VEZES?




A multiplicação dos pães é descrita duas vezes no Evangelho de Mateus (14,13-21 e 15, 29-39) e no Evangelho de Marcos (6, 34-44 e 8, 1-9). Os outros evangelistas descrevem o milagre apenas uma vez (Lc 9, 10-17 e Jo 6, 1-14). Por que os evangelistas repetirem a narração? Ou Jesus teria realizado dois milagres?

Mesmos detalhes – Nas duas narrações são descritos os mesmos detalhes: a) Jesus foi às margens do lago da Galileia; b) uma grande multidão se reuniu em torno dele; c) as pessoas ficaram com fome; d) Jesus perguntou onde encontrar comida; e) disseram que era impossível de obter; f) alguém ofereceu alguns pães e peixes; g) Jesus fez as pessoas se sentarem no chão; h) tomou o pão, abençoou-o e distribuiu para a multidão; i) todos comeram e ficaram saciados; j) sobraram várias cestas de pão.

Um ou dois milagres? – A pergunta dos apóstolos ("Como é que alguém poderia dar-lhes pão suficiente aqui no deserto? em Mc 8, 4) seria tola, se os discípulos já tivessem visto Jesus realizar a primeira multiplicação – como não lembrar de outra multidão alimentada milagrosamente? Portanto, historicamente, deve ter havido um único milagre dos pães, que desdobrou-se em duas versões, como se fossem dois eventos diferentes.

Por que um milagre e duas narrações? – Os primeiros cristãos viram que a multiplicação dos pães era um prenúncio da Eucaristia que Jesus celebrou na Última Ceia. No Evangelho de João, depois da multiplicação, Jesus pede para que as pessoas não fiquem apenas com o pão que enche o estômago, mas que busquem outro pão, o que dá a vida eterna. Esse fato, explica o “enigma” das duas narrativas. Vejamos:

Necessidade – O milagre narrado ocorreu em território judeu (Mc 6,32), o que poderia parecer um convite exclusivo aos judeus para participar na Eucaristia. Assim, quando os primeiros cristãos começaram a pregar aos pagãos, quiseram deixar claro que eles também eram chamados a participar da Eucaristia. A maneira encontrada foi criar uma narração paralela da multiplicação dos pães, realizada em território pagão (Mc 7,31).

Os números – A primeira multiplicação (para os judeus), se fez com cinco pães (Mc 6,38), número simbólico que representava o Pentateuco, a Lei de Moisés, o alimento da alma. Na segunda narração (para os pagãos), são sete pães (Mc 8,5), pois de acordo com o Genesis, haveria 70 nações pagãs no mundo. Na primeira multiplicação comeram 5.000 pessoas (Mc 6,44), ou seja, 5 (número sagrado judeu) vezes 1000 (multidão, o povo judeu). Na segunda, comeram 4.000 pessoas (Mc 8, 9), ou seja, 4 (pontos cardeais da Terra) vezes 1000 (multidão, povos da Terra). Na primeira multiplicação sobraram 12 cestas (Mc 6,43), representando as 12 tribos de Israel; na segunda, sobraram sete cestos (Mc 8,8), porque 70 eram as nações pagãs.

Pessoas – Na primeira narrativa, as pessoas vieram de cidades vizinhas (Mc 6,33), representando o povo judeu mais perto de Jesus. Na segunda, as pessoas vieram "de longe" (Mc 8,3), ou seja, das nações pagãs longe do judaísmo. Na primeira, as pessoas reuniram-se em grupos de 100 e 50 pessoas para comer (Mc 6,40), como fizera o povo de Israel, no deserto (Ex 18, 25, Dt 1,15). Na segunda, as pessoas se organizaram espontaneamente, representando a liberdade das nações pagãs.

Pastor esperado – Na primeira narrativa, Jesus sente pena "porque eram como ovelhas sem pastor" (Mc 6, 34), referência à profecia de Ezequiel (Ez 34,5-6.13). Na segunda, sente pena "porque estavam três dias sem comer" (Mc 8, 2), indicando que até os pagãos são amados e cuidados por Deus. No primeiro milagre, as pessoas se sentam "sobre a grama verde" (Mc 6,39), uma alusão ao Salmo 22, bem conhecido dos judeus. No entanto, no segundo milagre as pessoas se sentam "sobre a terra" (Mc 8,6), simbolizando o mundo inteiro, de onde vieram os pagãos.

Palavras – No primeiro texto, as sobras foram coletadas em doze " kófinos " (Mc 6,43), cestos de vime usados pelos judeus. No segundo, foram sete "spyrís" (Mc 8,8), vaso de cordas usados pelos pagãos. Nos dois textos, Jesus tomou os pães e "deu graças" (Mc 6,41 e Mc 8,6), o que significa bendizer a Deus pela comida antes de comer. No texto para os judeus é usada a palavra euloguéin (usada no círculo familiar judaico), enquanto no texto pagão usou-se eujaristéin (usada no ambiente grego).


Concluindo – Jesus realizou o milagre da multiplicação dos pães às margens do lago da Galileia, após um longo dia de pregação com os judeus das regiões vizinhas. Com a consciência de que Jesus era o Messias esperado, aquele milagre adquiriu enorme importância, pois tornou-se uma antecipação da celebração da Eucaristia. A necessidade de levar o Evangelho a outros povos gerou a segunda narração, uma cena que não existiu historicamente, mas que reflete perfeitamente a vontade de Jesus: que ninguém fique longe do Pão, do seu amor, de sua amizade. Hoje este continua a ser o sonho de nossa Igreja: que aqueles que estão confusos, alienados e desorientados venham para a comunidade cristã e se sintam confortáveis nela, sem ser marginalizado ou rejeitado, para que Jesus possa ser o Pão repartido.