Neste
domingo celebramos a Festa da Ascensão de Jesus. Na primeira leitura, repete-se
a mensagem essencial desta festa: Jesus, depois de ter apresentado ao mundo o
projeto do Pai, entrou na vida definitiva da comunhão com Deus.
Crise – A primeira leitura (At 1,1-11), tirada do livro dos “Atos dos Apóstolos”,
dirige-se a comunidades que vivem num certo contexto de crise. Estamos na
década de 80, cerca de cinquenta anos após a morte de Jesus. Passou já a fase
da expectativa pela vinda iminente do Cristo glorioso para instaurar o “Reino”
e há certa desilusão. As questões doutrinais trazem alguma confusão; a
monotonia favorece uma vida cristã pouco comprometida e as comunidades
instalam-se na mediocridade; falta o entusiasmo e o empenho… O quadro geral é o
de certo sentimento de frustração, porque o mundo continua igual e a esperada
intervenção vitoriosa de Deus continua adiada. Quando vai concretizar-se, de
forma plena e inequívoca, o projeto salvador de Deus?
Igreja – É neste ambiente que podemos inserir o texto que hoje nos é proposto como primeira leitura. Nele, o catequista Lucas avisa que (após a ida de Jesus para junto do Pai) o projeto de salvação e de libertação que Jesus veio apresentar passou para as mãos da Igreja, animada pelo Espírito. A construção do “Reino” é uma tarefa que não está terminada, mas que é preciso concretizar na história e exige o empenho contínuo de todos os crentes. Os cristãos são convidados a redescobrir o seu papel, no sentido de testemunhar o projeto de Deus, na fidelidade ao “caminho” que Jesus percorreu.
Despedida – O texto começa com uma apresentação inicial; logo após, vem o tema da
despedida de Jesus. O autor começa por fazer referência aos “quarenta dias” que
mediaram entre a ressurreição e a ascensão, durante os quais Jesus falou aos
discípulos “a respeito do Reino de Deus” (o que parece estar em contradição com
o Evangelho, onde a ressurreição e a ascensão são apresentadas no próprio dia
de Páscoa – Lc 24). O número quarenta é, certamente, um número simbólico: é o
número que define o tempo necessário para que um discípulo possa aprender e
repetir as lições do mestre. Aqui define, portanto, o tempo simbólico de
iniciação ao ensinamento do Ressuscitado.
Missão – Nas palavras de Jesus, Lucas expressa a sua experiência missionária: o Espírito irá derramar-se sobre a comunidade crente e dará a força para testemunhar Jesus em todo o mundo, desde Jerusalém a Roma. Na realidade, trata-se do programa que Lucas vai apresentar ao longo do livro, posto na boca de Jesus ressuscitado. O autor quer mostrar com a sua obra que o testemunho e a pregação da Igreja estão entroncados no próprio Jesus e são impulsionados pelo Espírito.
Ascensão – O último tema é o da ascensão. Evidentemente, esta passagem necessita de
ser interpretada para que, através da roupagem dos símbolos, a mensagem apareça
com toda a claridade. Temos, em primeiro lugar, a elevação de Jesus ao céu. Não
estamos falando de uma pessoa que, literalmente, descola da terra e começa a
elevar-se; estamos falando de um sentido teológico (não é um “repórter”, mas
sim o “teólogo” falando): a ascensão é uma forma de expressar, simbolicamente,
que a exaltação de Jesus é total e atinge dimensões supra-terrenas; é a forma
literária de descrever o culminar de uma vida vivida para Deus, que agora
reentra na glória da comunhão com o Pai.
Nuvem – Temos, depois, a nuvem que subtrai Jesus aos olhos dos discípulos. Pairando a meio caminho entre o céu e a terra a nuvem é, no Antigo Testamento, um símbolo privilegiado para exprimir a presença do divino. Ao mesmo tempo, simultaneamente, esconde e manifesta: sugere o mistério do Deus escondido e presente, cujo rosto o Povo não pode ver, mas cuja presença adivinha nos acidentes da caminhada.
Expectativa – Temos os discípulos a olhando para o céu. Significa a expectativa dessa comunidade que espera ansiosamente a segunda vinda de Cristo, a fim de levar ao seu termo o projeto de libertação do homem e do mundo. Por fim os dois homens vestidos de branco. Eles convidam a comunidade dos discípulos a continuar na história a obra de Jesus.
Caminho – O sentido fundamental da ascensão não é que fiquemos admirando a elevação de Jesus; mas é convidar-nos a seguir o “caminho” de Jesus, olhando para o futuro e entregando-nos à realização do seu projeto de salvação no meio do mundo.