domingo, 30 de agosto de 2015

Jesus e os 613 ritos judaicos


O Evangelho das missas deste domingo (Mc 1,14-8,30) descreve a discussão de Jesus e os discípulos com os fariseus, sobre o não cumprimento das tradições judaicas. Estamos na Galiléia, no mês de maio do ano 29.

Regras – Os povos antigos, em geral, e os judeus, em particular, sentiam um grande desconforto quando tinham de lidar com certas realidades desconhecidas e misteriosas (quase sempre ligadas à vida e à morte), que não podiam controlar nem dominar. Criaram, então, um conjunto abundante de regras que interditavam o contato com essas realidades (por exemplo, os cadáveres, o sangue, a lepra, etc.) ou que, pelo menos, regulamentavam a forma de lidar com elas, de forma a torná-las inofensivas.

Judeus – No contexto judaico, quem infringia – mesmo involuntariamente – essas regras colocava-se numa situação de marginalidade e de indignidade que impedia de se aproximar do mundo divino (o culto, o Templo) e de integrar a comunidade do Povo santo de Deus. Dizia-se então, que a pessoa ficava “impura”. Para readquirir o estado de “pureza” e poder reintegrar-se, era preciso realizar um rito de “purificação”, cuidadosamente estipulado na “Lei”.

Tradições judaicas – Na época de Jesus, as regras da “pureza” tinham sido absurdamente ampliadas pelos doutores da Lei, criando-se uma obsessão pelos rituais de “purificação”. Para os fariseus, a “tradição dos antigos” não se restringia às normas escritas contidas na Lei (Torah), mas abrangia 613 leis, das quais 248 eram preceitos de formulação positiva e 365 eram preceitos de formulação negativa. Essas eram, para os fariseus, o caminho para tornar Israel um Povo santo e para apressar a vinda libertadora do Messias. É sobre isso que se centra a polêmica entre Jesus e os fariseus que o Evangelho deste domingo.

Lavar as mãos – Um desses ritos consistia na lavagem das mãos antes das refeições. (Ex 30,17-21). Na perspectiva dos doutores da Lei, a purificação das mãos antes das refeições não era uma questão de higiene, mas uma questão religiosa… Em cada momento corria-se o risco de, mesmo sem saber, deparar-se com uma realidade impura e de a tocar; para evitar que a “impureza” presa às mãos se introduzisse no corpo junto com os alimentos, exigia-se a lavagem das mãos antes das refeições.

Apenas ritos – Para Jesus, a obsessão dos fariseus com os ritos externos de purificação era sintoma de uma grave deficiência na maneira de ver e de viver a religião; ele denunciou essa vivência religiosa de repetição de práticas externas e formalistas, mas que não tinha preocupação com a vontade de Deus (“este povo honra-Me com os lábios, mas o seu coração está longe de mim” – v. 6) ou com o amor aos irmãos.

Mais ritos – Trata-se de uma religião vazia e estéril (“é vão o culto que Me prestam” – v. 7), que não vem de Deus mas foi inventada pelos homens (“as doutrinas que ensinam não passam de preceitos humanos” – v. 7). Àqueles que apostavam na religião dos ritos estéreis, Jesus chamava “hipócritas” (v. 6): interessava-lhes mais o “parecer” do que o “ser”, interessava mais a materialidade do que a essência das coisas… Eles cumpriam as regras, mas não amavam; vestiam a máscara da religião, mas não se preocupavam minimamente com a vontade de Deus. Esta religião é uma mentira, uma hipocrisia, ainda que revestida de ares muito santos e muito piedosos.

Princípios – Depois, Jesus dirige-Se à multidão e formula o princípio decisivo da autêntica moralidade: “não há nada fora do homem que ao entrar nele o possa tornar impuro; o que sai do homem é que o torna impuro” (v. 15). E explica: “do interior do homem é que saem os maus pensamentos: imoralidades, roubos, assassínios, adultérios, cobiças, injustiças, fraudes, devassidão, inveja, difamação, orgulho, insensatez. Todos estes vícios saem lá de dentro e tornam o homem impuro” (v. 22-23).

A verdadeira religião – não passa, portanto, pelo cumprimento de regras externas, que regulam o que o homem come ou não come; mas passa por uma autêntica conversão do coração, que leve o homem a deixar a vida velha e a transformar-se num Homem Novo, que assume e que vive os valores do Reino. A preocupação com as regras externas de “pureza” é uma preocupação estéril, que não toca o essencial – o coração do homem; pode até distrair-nos do essencial, dando falsas segurança e sensação de estar na vontade de Deus. A nossa verdadeira preocupação deve ser moldar o coração, para que os nossos sentimentos, desejos, pensamentos, projetos, decisões se concretizem, no dia a dia, na escuta atenta dos desafios de Deus e no amor aos irmãos.

QUER SABER MAIS – Se você quer saber quais são as 613 mandamentos da Lei judaica, solicite por E-mail, que lhe enviaremos gratuitamente.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Tu tens palavras de vida eterna


No Evangelho das missas deste domingo (Jo 6, 60-69), Jesus continua a sua missão na Galiléia: é o mês de abril do ano 29, exatamente um ano antes da sua crucificação, morte e ressurreição.

Discípulos – A cena se desenrola na cidade de Cafarnaum, onde Jesus, logo após a reunião na sinagoga, no sábado, discutiu com os judeus que contestavam as suas palavras ("Eu sou o pão que desceu do céu"). Muitos discípulos, que escutavam a discussão, murmuravam: "Esse modo de falar é duro demais. Quem pode continuar ouvindo isso?". E Jesus disse: "Isso escandaliza vocês? Imaginem então se vocês virem o Filho do Homem subir para o lugar onde estava antes! O Espírito é que dá a vida, a carne não serve para nada. As palavras que eu disse a vocês são espírito e vida. Mas entre vocês há alguns que não acreditam".

Pedro – A partir desse momento, muitos discípulos voltaram atrás e não andavam mais com Jesus. Então, Ele disse aos doze: "Vocês também querem ir embora?" Simão Pedro respondeu: "A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. Agora nós acreditamos e sabemos que tu és o Santo de Deus".

Analisando o texto – O texto é a conclusão do grande discurso sobre "O Pão da Vida". Mais uma vez, a Bíblia deixa claro que, diante de Jesus e das suas palavras, o ouvinte tem que tomar uma decisão radical. E os versículos não escondem o fato de que nem todos conseguem optar por Jesus.

Discussão – As primeiras palavras, "depois de ter ouvido isso", demonstram que a divisão nasceu após algum ensinamento de Jesus, sem explicitar o motivo exato da discussão. As preocupações comunitárias dos versículos anteriores – a afirmação de Jesus, de que Ele dá o seu corpo como Pão da Vida, e o fato de o texto se dirigir aos discípulos – indicam que, provavelmente, a fonte de divisão foi o discurso eucarístico.

Divisão – De qualquer maneira, é importante notar que a divisão não se dá entre "os judeus", mas entre os próprios discípulos, muitos dos quais abandonam Jesus neste momento. Sem dúvida, essa história reflete a experiência da comunidade de João, pelo ano 90, quando estava sentindo, na pele, as dores de divisão, pois muitos dos seus membros a estavam abandonando.

Quantidade – É muito interessante a reação de Jesus diante do abandono da maioria dos seus discípulos. Ele não arreda pé, mas, com toda calma, até convida os Doze a saírem, se não podem aceitar a sua palavra. Jesus não se preocupa com números, mas, com a fidelidade ao Pai. Talvez até fique sozinho, mas não vai diluir em nada as exigências do seguimento da vontade do Pai.

Um exemplo – Esse é um exemplo importante para nós, pois muitas vezes caímos na tentação de julgar o êxito pelos números! Igrejas cheias indicam sucesso! Mas nem sempre é assim: é mais importante ser coerente com o Evangelho, custe o que custar, do que "fazer média" com a sociedade, às vezes mediante uma pregação tão insossa, que reduz a religião a mero sentimentalismo, sem conseqüências sociais.

Escrituras – Diante do desafio de Jesus, Pedro resume a visão dos que percebem no Mestre algo mais do que um mero pregador. A quem iriam? Só Jesus tem palavras de vida eterna! Declaração atual, pois é moda na nossa sociedade (até entre muitos católicos praticantes) de correr atrás de tudo que é novidades: supostas aparições, esoterismo, religiões orientais, gnosticismo e tantas outras propostas, às vezes até esdrúxulas, enquanto se ignora a Palavra de Deus nas Escrituras.


Palavras de vida eterna – O texto nos convida a examinar e verificar se estamos realmente buscando a verdade onde ela se encontra ou se a deixamos de lado, achando – como a multidão do texto – que o seguimento de Jesus "é duro demais"! No meio de tantas propostas de vida, estamos convidados a reencontrar a fonte da verdadeira felicidade e da verdadeira vida, fazendo a experiência de Pedro, que descobriu que Jesus "tem palavras de vida eterna".

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Como aconteceu a Assunção de Maria?


No próximo domingo a Igreja comemora a Assunção de Maria, conforme o dogma publicado pelo Papa Pio XII (1950): “A Virgem Imaculada, que fora preservada de toda a mancha de culpa original, terminando o curso da sua vida terrena, foi elevada à glória celeste em corpo e alma”.

Mistério – Os detalhes da morte, enterro e assunção da Virgem Maria são um dos maiores mistérios do Novo Testamento. A Igreja usa o texto da Carta de São Paulo (1Cor 15, 20-23) e do Apocalipse (Ap 11, 19; 12, 1), para fundamentar o dogma. Nenhuma descrição ou fato histórico é citado. Apresentamos aqui as descobertas mais recentes sobre o assunto:

Cronograma – Um cronograma aproximado da vida de Maria seria o seguinte: nasceu no ano 20 a.C., aproximadamente; filha de Ana e Joaquim. No final do ano 7 a.C. (com 13 anos) deu à luz Jesus, na cidade de Belém. Maria assistiu a crucificação e morte de Jesus em abril do ano 30 d.C., com 50 anos de idade. Segundo Hipólito de Tebas (autor bizantino do século VII), a Virgem Maria viveu onze anos após a morte de Jesus, morrendo no ano de 41 d.C. (com 61 anos de idade).

João Paulo II – Em catequese, no dia 9 de julho de 1997, o Papa João Paulo II disse que o primeiro testemunho de fé na assunção da Virgem Maria aparece nas histórias apócrifas, intituladas "Transitus Mariae", cujo núcleo original remonta aos séculos II e descreve a morte, o sepultamento, o túmulo e a ascensão de Maria aos Céus. Segundo a palavra do Pontífice este texto reflete uma intuição da fé do povo de Deus.

O texto – O autor do “Transitus Mariae” usa o pseudônimo de Melitão. Existiu um Melitão, Bispo de Sardes, no ano de 150, mas não deve ser o mesmo. O autor diz que escutou de São João apóstolo a seguinte história: Maria vivia em sua casa, quando recebeu a visita de um anjo anunciando que, em três dias, seria elevada aos céus. Então ela pediu ao anjo que gostaria que todos os apóstolos estivessem reunidos.

Morte – Três dias depois, Maria morreu na presença de todos os apóstolos. Pedro recebeu uma mensagem de Cristo: ele deveria tomar o corpo de Maria e levar à direita da cidade, até o oriente, onde encontraria um sepulcro novo. Ali deveria depositar o corpo de Maria e aguardar um novo aparecimento de Cristo.

Enterro – Os apóstolos assim fizeram: colocaram o corpo num caixão, saíram de Jerusalém, à direita da cidade, entraram no Vale de Josafat (ou vale do Cedron), no caminho para o Monte das Oliveiras, depositaram o corpo no sepulcro, fecharam com uma pedra e ficaram esperando.

Assunção – Cristo ressuscitado apareceu, saudando a todos: “A paz esteja convosco”. Pedro disse: “Senhor, se possível, parece justo que ressuscite do corpo de sua mãe e a conduza contigo ao Céu”.  Jesus disse: “Tu que não aceitasse a corrupção do pecado não sofrerás a corrupção do corpo no sepulcro”. E os anjos a levaram ao paraíso. Enquanto ela subia, Jesus falou aos apóstolos: “Do mesmo modo que estive com vocês até agora, estarei até o fim do mundo”. E desapareceu entre as nuvens junto com os anjos e Maria.

Impressionante descoberta – A arqueologia estudou durante anos os detalhes da pequena igreja existente no local descrito pelo texto “Transitus Mariae” sem nada encontrar. Em 1972, uma chuva torrencial alagou a igreja e exigiu a reconstrução do piso. Ao remover o piso, apareceu um grande porão, com uma câmara funerária do primeiro século. Todas as descrições do livro apócrifo estavam confirmadas.


Quer ler mais – Se você se interessou pelo assunto, nós podemos lhe oferecer a história completa do “Túmulo de Maria” escrita pelo teólogo católico Ariel Alvarez Valdes (17 páginas, em espanhol) com fotos e desenhos do túmulo. Também podemos oferecer o texto completo do livro apócrifo “Transitus Mariae”, escrito no século II (16 páginas, em espanhol). Solicite por E-mail.

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Jesus, pão da vida eterna


No Evangelho das missas deste domingo (Jo 6, 41-51), Jesus continua a sua missão na Galiléia. Estamos no mês de abril do ano 29, exatamente um ano antes da crucificação, morte e ressurreição de Jesus.

Nos domingos anteriores – Vimos que Jesus multiplicou os pães para mais de cinco mil homens nas proximidades da cidade de Betsaida; em seguida, entrou na barca com os apóstolos em direção à cidade de Cafarnaum (durante a viagem no Lago de Genesaré ou Mar da Galiléia, aconteceu uma tempestade e Jesus andou sobre as águas); ao chegarem à Cafarnaum foram seguidos por uma multidão; ao falar para a multidão se declarou como “o pão da vida”.

Judeus – No texto deste domingo, Jesus continua na cidade de Cafarnaum, provavelmente em uma sinagoga, no sábado, discutindo com os judeus. Estes contestavam as palavras de Jesus ("Eu sou o pão que desceu do céu") e comentavam: "Não é este Jesus, o filho de José? Não conhecemos seu pai e sua mãe? Como então pode dizer que desceu do céu?"

Resposta – E Jesus respondeu: “Não murmureis entre vós. Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou não o atrai. E eu o ressuscitarei no último dia. Eu sou o pão da vida. Os vossos pais comeram o maná no deserto e, no entanto, morreram. Eis aqui o pão que desce do céu: quem dele comer nunca morrerá. Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão que eu darei é a minha carne dada para a vida do mundo".

Discurso – Este trecho é conhecido como o discurso de Jesus sobre o "Pão da Vida". O gancho que o evangelista João usa para “pendurar” o discurso, é o pedido dos judeus (no versículo 35), "Senhor, dá-nos sempre desse pão". Em resposta, Jesus começa o seu grande discurso, que divide-se em duas partes. Na primeira parte (41-51), João apresenta o ensinamento de Jesus sobre o pão celestial que nos nutre. A segunda parte está nos versículos 52 a 58, que não serão lidos neste domingo.

Paralelo – Jesus faz uma comparação entre o povo de Israel no deserto e os judeus de seu tempo: como os seus antepassados se queixavam, no deserto, contra o pão que Deus mandava (o maná), agora eles queixavam-se do Novo Maná. Os judeus (aqui se entende as autoridades judaicas e não o povo judeu) diziam conhecer a origem de Jesus, porque só pensavam na sua família, e Jesus mostra que, na verdade, não a conheciam, pois eles não conheciam o Pai, a sua verdadeira origem.

Julgamento final – No versículo 47 (“em verdade, em verdade vos digo: quem crê em mim tem a vida eterna”), o evangelista João revela uma característica de seus textos: a escatologia realizada. Enquanto, para os Sinóticos, o juízo é algo que acontece no último dia, para João, freqüentemente, já aconteceu, pois a pessoa é salva ou já está condenada, pela sua aceitação ou não de Jesus como o Filho de Deus.

Última Ceia – No final, João nos dá o que talvez seja uma variante das palavras da instituição da eucaristia "O pão que eu vou dar é a minha própria carne, para que o mundo tenha a vida" (versículo 51). João enfatiza que o Verbo Divino se tornou carne e tem entregue a sua carne como alimento da vida eterna.


Alimento – Ser atraído por Jesus e crer nele é segui-lo, na adesão concreta ao projeto de Deus. Alimentar-se de Jesus é contemplá-lo e seguir seus passos. Na bondade, na compaixão e no perdão, na fraternidade comunitária e na solidariedade social, na busca da justiça e da paz entra-se em comunhão com Jesus, Pão da Vida Eterna.