O Evangelho das missas deste domingo (Mc 1,14-8,30) descreve
a discussão de Jesus e os discípulos com os fariseus, sobre o não cumprimento
das tradições judaicas. Estamos na Galiléia, no mês de maio do ano 29.
Regras – Os povos antigos, em geral, e os
judeus, em particular, sentiam um grande desconforto quando tinham de lidar com
certas realidades desconhecidas e misteriosas (quase sempre ligadas à vida e à
morte), que não podiam controlar nem dominar. Criaram, então, um conjunto
abundante de regras que interditavam o contato com essas realidades (por
exemplo, os cadáveres, o sangue, a lepra, etc.) ou que, pelo menos,
regulamentavam a forma de lidar com elas, de forma a torná-las inofensivas.
Judeus – No contexto judaico, quem
infringia – mesmo involuntariamente – essas regras colocava-se numa situação de
marginalidade e de indignidade que impedia de se aproximar do mundo divino (o
culto, o Templo) e de integrar a comunidade do Povo santo de Deus. Dizia-se
então, que a pessoa ficava “impura”. Para readquirir o estado de “pureza” e
poder reintegrar-se, era preciso realizar um rito de “purificação”,
cuidadosamente estipulado na “Lei”.
Tradições judaicas
– Na época de Jesus, as
regras da “pureza” tinham sido absurdamente ampliadas pelos doutores da Lei,
criando-se uma obsessão pelos rituais de “purificação”. Para os fariseus, a
“tradição dos antigos” não se restringia às normas escritas contidas na Lei
(Torah), mas abrangia 613 leis, das quais 248 eram preceitos de formulação
positiva e 365 eram preceitos de formulação negativa. Essas eram, para os
fariseus, o caminho para tornar Israel um Povo santo e para apressar a vinda
libertadora do Messias. É sobre isso que se centra a polêmica entre Jesus e os fariseus
que o Evangelho deste domingo.
Lavar as mãos – Um desses ritos consistia na
lavagem das mãos antes das refeições. (Ex 30,17-21). Na perspectiva dos
doutores da Lei, a purificação das mãos antes das refeições não era uma questão
de higiene, mas uma questão religiosa… Em cada momento corria-se o risco de,
mesmo sem saber, deparar-se com uma realidade impura e de a tocar; para evitar
que a “impureza” presa às mãos se introduzisse no corpo junto com os alimentos,
exigia-se a lavagem das mãos antes das refeições.
Apenas ritos – Para Jesus, a obsessão dos
fariseus com os ritos externos de purificação era sintoma de uma grave
deficiência na maneira de ver e de viver a religião; ele denunciou essa
vivência religiosa de repetição de práticas externas e formalistas, mas que não
tinha preocupação com a vontade de Deus (“este povo honra-Me com os lábios, mas
o seu coração está longe de mim” – v. 6) ou com o amor aos irmãos.
Mais ritos – Trata-se de uma religião vazia e
estéril (“é vão o culto que Me prestam” – v. 7), que não vem de Deus mas foi
inventada pelos homens (“as doutrinas que ensinam não passam de preceitos
humanos” – v. 7). Àqueles que apostavam na religião dos ritos estéreis, Jesus
chamava “hipócritas” (v. 6): interessava-lhes mais o “parecer” do que o “ser”, interessava
mais a materialidade do que a essência das coisas… Eles cumpriam as regras, mas
não amavam; vestiam a máscara da religião, mas não se preocupavam minimamente
com a vontade de Deus. Esta religião é uma mentira, uma hipocrisia, ainda que revestida
de ares muito santos e muito piedosos.
Princípios – Depois, Jesus dirige-Se à
multidão e formula o princípio decisivo da autêntica moralidade: “não há nada
fora do homem que ao entrar nele o possa tornar impuro; o que sai do homem é
que o torna impuro” (v. 15). E explica: “do interior do homem é que saem os
maus pensamentos: imoralidades, roubos, assassínios, adultérios, cobiças,
injustiças, fraudes, devassidão, inveja, difamação, orgulho, insensatez. Todos
estes vícios saem lá de dentro e tornam o homem impuro” (v. 22-23).
A verdadeira
religião – não passa, portanto,
pelo cumprimento de regras externas, que regulam o que o homem come ou não
come; mas passa por uma autêntica conversão do coração, que leve o homem a
deixar a vida velha e a transformar-se num Homem Novo, que assume e que vive os
valores do Reino. A preocupação com as regras externas de “pureza” é uma
preocupação estéril, que não toca o essencial – o coração do homem; pode até
distrair-nos do essencial, dando falsas segurança e sensação de estar na
vontade de Deus. A nossa verdadeira preocupação deve ser moldar o coração, para
que os nossos sentimentos, desejos, pensamentos, projetos, decisões se
concretizem, no dia a dia, na escuta atenta dos desafios de Deus e no amor aos
irmãos.
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