O texto do Evangelho das missas deste domingo acontece
durante a última viagem de Jesus a Jerusalém. Estamos em fevereiro do ano 30.
Em pouco mais de um mês, Jesus será preso, condenado e crucificado. Alguns
fariseus, tentando obter uma prova para condenar Jesus, perguntam: “Um homem
pode mandar a sua esposa embora?”
Matrimônio – O tema deste domingo é o
matrimônio. Em nossos dias, o que ameaça o matrimônio é a separação e o
divórcio, enquanto que, nos tempos de Jesus, era o repúdio. Este, certamente,
um mal pior, porque implicava uma injustiça contra a mulher, pois somente o
homem tinha o direito de repudiar a esposa. Lamentavelmente, esse costume ainda
persiste em certas culturas...
Judaísmo – No judaísmo, duas correntes de opiniões
se contrapunham: para uma delas, era lícito repudiar a própria mulher por qualquer
motivo (até se “o feijão queimasse”), e a decisão do marido era soberana, conforme o seu
julgamento ou vontade; para a outra, ao contrário, era preciso um motivo
grave, previsto pela Lei. Os
fariseus submeteram esta questão a Jesus, esperando que adotasse uma postura a
favor de uma ou outra tese. Mas, receberam uma resposta que não esperavam: “Foi
por causa da dureza do coração de vocês que Moisés escreveu esse
mandamento. Mas, desde o início da
criação, Deus os fez homem e mulher. Por isso, o homem deixará seu pai e sua
mãe, e os dois serão uma só carne. Portanto, eles já não são dois, mas uma só
carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não deve separar”.
Moisés – A lei de Moisés sobre o repúdio é
vista por Cristo como algo não desejado, mas tolerado por Deus (como a
poligamia ou outras desordens) por causa da dureza de coração e da imaturidade
humana. Jesus não critica Moisés pela concessão feita; reconhece que, nesta matéria,
o legislador humano não pode deixar de levar em conta a realidade. Mas, volta a
propor a todos o ideal originário da união indissolúvel entre o homem e a
mulher (uma só carne) que, ao menos para seus discípulos, deverá ser a única
forma possível de matrimônio.
Sacramento – Contudo, Jesus não se limita a
reafirmar a lei; acrescenta-lhe a graça. Ou seja, os esposos cristãos não só têm
o dever de se manterem fiéis
até a morte, como têm também a ajuda necessária para fazê-lo. Da morte redentora de Cristo vem
uma força – o Espírito Santo – que permeia todo aspecto da vida do crente,
inclusive o matrimônio. Este, inclusive, é elevado à dignidade de sacramento e
de imagem viva de sua união com a Igreja na cruz (Ef 5, 31-32). Dizer que o
matrimônio é um sacramento significa que ele se converte em um modo de unir-se a
Cristo, por meio do amor ao outro, tornando-se um verdadeiro caminho de
santificação.
Crise - O ideal de fidelidade conjugal
nunca foi fácil (adultério é uma palavra que ressoa sinistramente até na Bíblia)
e hoje, mais difícil ainda. A crise que a instituição do matrimônio atravessa em
nossa sociedade é visível e as legislações civis que permitem o divórcio apenas
poucos meses depois de vida em comum, indiretamente, o estimulam. Palavras
como: “estou farto desta vida”, “se é assim, cada um por si!”, “vou embora”, são
pronunciadas entre cônjuges na primeira dificuldade.
Descartável – Vive-se também, no matrimônio,
a mentalidade comum do “usar e jogar fora”. Se um aparelho ou uma ferramenta
sofre algum dano ou uma pequena avaria, não se pensa em repará-lo, pensa-se só
em substituir. Essa mentalidade, no matrimônio, é mortífera. O que se pode
fazer para conter esta tendência, causa de tanto mal para a sociedade e de
tanta tristeza para os filhos? Substituir a mentalidade do “usar e jogar fora”
pela do “usar e remendar”. Quase ninguém faz remendos mais. Mas se não se fazem
na roupa, deve-se praticar esta arte na vida a dois (Veja Ef 4, 26-27; Col 3,
13; Ga 6, 2).
Santidade – O importante a compreender é
que o matrimônio não se gasta com crises e superações, mas se aperfeiçoa e
melhora. Se olharmos para a vida dos santos, perceberemos que o caminho que
leva à santidade é feita de vazios, aridez e muita força de vontade e cansaço. Muitos
chegaram a duvidar de que estivessem no caminho certo. Seguiram adiante só por
fé e só depois de passar por crises, entenderam o quanto é mais profundo e mais
desinteressado o amor a Deus. Os casais também atravessam, frequentemente, crises
em seu matrimônio. Se, com boa vontade e ajuda, conseguem supera-las, percebem que,
se antes ambos se amavam pela satisfação que isso lhes proporcionava, hoje
talvez se amem um pouco mais com um amor de ternura, livre de egoísmo e capaz
de compaixão; amam-se pelas coisas que passaram e sofreram juntos.
Acolhimento – Apesar de tudo, a vida dos
homens e das mulheres é marcada pela fragilidade própria da condição humana.
Nem sempre, apesar do esforço e boa vontade, as pessoas conseguem ser fiéis aos
ideais que Deus propõe. A vida de todos nós está cheia de fracassos, de
infidelidades, de falhas. Nessas circunstâncias, a comunidade cristã deve usar
de muita compreensão para os que, muitas vezes sem culpa, não conseguiram a
vivência desse projeto de amor. Em nenhuma circunstância os divorciados devem
ser marginalizadas ou afastados da comunidade cristã, que deve acolher,
integrar, compreender, ajudar a quem as circunstâncias da vida impediram de
viver o projeto ideal de Deus. Não se trata de renunciar ao “ideal” proposto;
trata-se de testemunhar a bondade e a misericórdia de Deus para com todos
aqueles a quem a partilha de um projeto comum fez sofrer e que, por diversas
razões, não puderam realizar esse ideal que um dia, diante de Deus e da
comunidade, se comprometeram a viver.
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