domingo, 27 de maio de 2018

Santíssima Trindade




A Solenidade que celebramos neste domingo não é um convite a decifrar o mistério que se esconde por detrás de “um Deus em três pessoas”; mas é um convite a contemplar o Deus que é amor, que é família, que é comunidade e que criou os homens para fazê-los comungar nesse mistério de amor. O Evangelho apresenta o encontro final de Jesus ressuscitado com os seus discípulos, num monte da Galileia.

Encontro marcado – O texto do Evangelho (Mt 28,16-20) situa-nos na Galileia, após a ressurreição de Jesus (embora não se diga se é muito ou pouco tempo após a descoberta do túmulo vazio – Mt 28,1-15). De acordo com Mateus, Jesus – pouco antes de ser preso – havia marcado encontro com os discípulos na Galileia (Mt 26,32); na manhã da Páscoa, os anjos que apareceram às mulheres no sepulcro (Mt 28,7) e o próprio Jesus, vivo e ressuscitado (Mt 28,10), renovam o convite para que os discípulos se dirijam à Galileia, a fim de lá encontrar o Senhor.

Jesus vivo – O texto deste domingo descreve o encontro final entre Jesus e os discípulos divide-se em duas partes. Na primeira, descreve-se o encontro: Jesus vivo e ressuscitado, revela-Se aos discípulos e é reconhecido e adorado como “o Senhor”.

Missão – Na segunda parte, Mateus descreve o envio dos discípulos em missão pelo mundo. A Igreja de Jesus é, essencialmente, uma comunidade missionária, cuja missão é testemunhar no mundo a proposta de salvação e de libertação que Jesus veio trazer aos homens e que deixou nas mãos e no coração dos discípulos.

Cristãos – A primeira nota do envio e do mandato que Jesus dá aos discípulos é a da universalidade… A missão dos discípulos destina-se a “todas as nações”. A segunda nota dá conta das duas fases da iniciação cristã, conhecidas da comunidade de Mateus: o ensino e o batismo. Começava-se pela catequese, cujo conteúdo eram as palavras e os gestos de Jesus. Quando os discípulos estavam informados da proposta de Jesus, vinha o batismo – que selava a íntima vinculação do discípulo com o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

Até o fim dos tempos – Uma última nota: Jesus estará sempre com os discípulos, “até ao fim dos tempos”. Esta afirmação expressa a convicção – que todos os crentes da comunidade de Mateus possuíam – de que Jesus ressuscitado estará sempre com a sua Igreja, acompanhando a comunidade dos discípulos na sua marcha pela história, ajudando-a a superar as crises e as dificuldades da caminhada.

sábado, 12 de maio de 2018

As aparições de Cristo Ressuscitado



No Evangelho deste domingo (Mc 16,15-20), Jesus aparece aos Doze apóstolos com a seguinte mensagem: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda a criatura. Quem acreditar e for batizado será salvo; mas quem não acreditar será condenado. Eis os milagres que acompanharão os que acreditarem: expulsarão os demônios em meu nome; falarão novas línguas; se pegarem em serpentes ou beberem veneno, não sofrerão nenhum mal; e quando impuserem as mãos sobre os doentes, eles ficarão curados”. Depois de ter dito isso, foi elevado ao Céu e sentou-Se à direita de Deus.

Aparições – Esta foi uma das aparições de Jesus. Você sabe dizer quantas vezes Jesus apareceu para as pessoas? Mas, primeiro, nós temos que definir o que é aparição.

O que é aparição? – A resposta foi orientada pela afirmação de Lucas em At 1,3: "É a eles que Jesus se apresentava vivo após a sua Paixão; tiveram mais de uma prova disso, enquanto, durante quarenta dias, Ele lhes aparecera e mantivera conversação com eles sobre o Reino de Deus". Portanto, foram consideradas as aparições em que Jesus conversou, respondeu perguntas, comeu, instruiu, foi tocado; estas aparições aconteceram nos 40 dias seguintes a sua Paixão, ou seja, entre os dias 7 de abril e 17 de maio do ano 30. Após a ascensão aos céus, ocorreram apenas visões, expressadas de diversas formas (clarão de luz, em sonho, etc.).

Pegue sua bíblia e confira – Foram 11 aparições (nove nos Evangelhos e duas nas cartas de São Paulo). Note que uma mesma aparição pode ser descrita por mais de um livro do Novo Testamento.

Descritas nos Evangelhos:

1- a Madalena e às mulheres no túmulo no domingo - Mt 28,9-11; Jo 20,13-18; Mc 16,9-11;
2- aos 11 apóstolos na montanha da Galileia - Mt 28,16-20; Mc 16,15 (talvez 1Cor 15,5);
3- aos dois discípulos de Emaús - Lc 24,13-35; Mc 16,12;
4- aos 11 apóstolos em Jerusalém durante uma refeição – Lc 24,36-43; Mc 16,14; At 1,4-5; At 10,41 (talvez 1Cor 15,5);
5- aos discípulos sem Tomé - Jo 20,19-23 (talvez 1Cor 15,5);
6- aos discípulos com Tomé - Jo 20,24-29; (talvez 1Cor 15,5);
7- à margem do lago de Tiberíades, quando comeu peixe - Jo 21,1-23 (talvez At 10,41);
8- a Simão - Lc 24,34; 1 Cor 15,5;
9- na ascensão aos céus, em Betânia - Lc 24,50-53; Mc 16,19; At 1,8

Descritas nas cartas de Paulo:

10- a mais de quinhentas pessoas - 1Cor 15,6;
11- a Tiago - 1Cor 15,7;

Algumas Visões (não consideradas como aparições):
1- Visão de Paulo no caminho para Damasco no ano 37 – At 9,3; At 22,6; At 26, 12; 1Cor 15,8; 1Cor 9,1; Gal 1,12;
2- A visão de Ananias no ano 37 – At 9, 10-16;
3- A visão de Paulo no Templo em Jerusalém em abril do ano 58 – At 22,18;
4- Outra visão de Paulo em Jerusalém em abril do ano 58 – At 23, 11;
5- A visão de João citada em Ap 1,9s, escrito entre os anos 95 e 100.

Algumas observações – As citações em Mt 28,5; Mc 16,5; Lc 24,4 são apenas aparições de anjos.

sexta-feira, 4 de maio de 2018

O “dever” de amar



O Evangelho deste domingo (Jo 15, 9-17) situa-nos, outra vez, em Jerusalém, numa noite de Quinta-feira do mês de Nisan, do ano trinta. A festa da Páscoa está muito próxima e a cidade está cheia de forasteiros. Jesus também está na cidade com o seu grupo de discípulos. A morte na cruz já é uma ameaça real e Jesus está plenamente consciente disso. Os discípulos também já perceberam que estão vivendo um momento decisivo e que, nas próximas horas, Jesus vai ser tirado deles.

Despedida – É nesse contexto que podemos situar a última ceia de Jesus com os discípulos. Trata-se de uma “ceia de despedida” e tudo o que aí é dito por Jesus soa a “testamento final”… Jesus sabe que vai partir para o Pai e que os discípulos ficarão no mundo, continuando e testemunhando o projeto do “Reino”. Nesse momento de despedida, as palavras de Jesus recordam aos discípulos o essencial da mensagem e apresentam as grandes coordenadas desse projeto que eles devem continuar a concretizar no mundo.

Para uma reflexão deste Evangelho, reproduzimos o comentário do padre Raniero Cantalamessa, pregador da Casa Pontifícia do Vaticano.

Amor – “Este é o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como eu vos amei... O que vos mando é que vos ameis uns aos outros”. O amor, um mandamento? Pode-se fazer do amor um mandamento sem destruí-lo? Que relação pode haver entre amor e dever, dado que um representa a espontaneidade e o outro a obrigação?

Mandamentos – Deve-se saber que existem dois tipos de mandamentos. Existe um mandamento ou uma obrigação, que vem do exterior, de uma vontade diferente à minha, e um mandamento ou obrigação que vem de dentro e que nasce da mesma coisa. A pedra que se lança ao ar ou a maçã que cai da árvore estão “obrigadas” a cair, não podem fazer outra coisa; não porque alguém imponha isso, mas porque nelas há uma força interior de gravidade que as atrai para o centro da Terra.

Leis – De igual forma, há dois grandes modos segundo os quais o homem pode ser induzido a fazer ou não determinada coisa: por constrição ou por atração. A lei e os mandamentos ordinários o induzem do primeiro modo: por constrição, com a ameaça do castigo; o amor, o induz do segundo modo: por atração, por um impulso interior. Cada pessoa, com efeito, é atraída pelo que ama, sem que sofra constrição alguma do exterior. Mostre a uma criança um brinquedo e a você a verá lançar-se para agarrá-lo. O que a impulsiona? Ninguém; é atraída pelo objeto de seu desejo. Ensina um Bem a uma alma sedenta de verdade e se lançará para ele. Quem a impulsiona? Ninguém; é atraída por seu desejo.

Mandamento do amor? Mas se é assim, isto é, se somos atraídos espontaneamente pelo bem e pela verdade que é Deus, que necessidade haveria de fazer deste amor um mandamento e um dever? É que, rodeados como estamos de outros bens, corremos o perigo de errar, de estender falsos bens e perder assim o Sumo Bem. Como uma nave espacial dirigida para o Sol deve seguir certas regras, para não cair na esfera da gravidade de algum planeta ou satélite intermediário, nós, igualmente [devemos ter algumas regras] ao tender para Deus. Os mandamentos, começando pelo “primeiro e maior de todos”, que é o de amar a Deus, servem para isto.

Dever – Tudo isso tem um impacto direto, também, na vida e no amor humano. Cada vez são mais numerosos os jovens que rejeitam a instituição do matrimônio e elegem o chamado amor livre ou a simples convivência. O matrimônio é uma instituição; uma vez contraído, liga, obriga a ser fiel e a amar o companheiro para toda a vida. Mas que necessidade tem o amor, que é instinto, espontaneidade, impulso vital, de transformar-se em um dever?

Sempre – O filósofo Kierkegaard dá uma resposta convincente: “Só quando existe o dever de amar, só então o amor está garantido para sempre contra qualquer alteração; eternamente liberado em feliz independência; assegurado em eterna bem-aventurança contra qualquer desespero”. Quer dizer: o homem que ama verdadeiramente quer amar para sempre. O amor necessita ter como horizonte a eternidade; se não, não é mais que uma brincadeira, um “amável mal-entendido” ou um “perigoso passatempo”. Por isso, quanto mais intensamente o homem ama, mais percebe com angústia o perigo que corre o seu amor, o perigo que não vem de outros, mas dele mesmo. Bem sabe que é volúvel e que amanhã, ai! Poder-se-ia cansar e não amar mais. E já que, agora que está no amor, vê com clareza a perda irreparável que isto comportaria, eis aqui que se previne, “vinculando-se” a amar para sempre. O dever subtrai o amor da volubilidade e o ancora à eternidade. Quem ama é feliz de “dever” amar, parece-lhe o mandamento mais belo e libertador do mundo.