sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Quantos eram os apóstolos?



No Evangelho das missas deste domingo (Mt 4,12-23), Jesus chama os primeiros apóstolos. É comum falar dos “doze apóstolos” de Jesus. Pinturas, quadros e esculturas fizeram famosa a cena do Mestre rodeado por seus doze amigos íntimos e contribuíram para imortalizar esse número, que hoje ninguém mais discute. Mas, os apóstolos de Jesus eram realmente doze? No Novo Testamento aparecem quatro vezes a lista com os nomes dos doze apóstolos (Mc 3, 16-19; Mt 10, 2-4; Lucas 6, 14-16 e At 1, 13). Delas, podemos observar alguns dados.

Os mais próximos – Se tomarmos em primeiro lugar a lista de Mateus, veremos que começa com Simão Pedro. É um dos apóstolos de quem mais dados temos. Sabemos que era oriundo de Betsaida (Jo 1, 44), mas tinha sua moradia em Carfanaum (Mt 8, 14), onde ganhava a vida como pescador no Lago da Galileia. Era casado (1 Cor 9,5) e vivia com seu irmão André e sua sogra (Mc 1, 29-30). O segundo da lista é André, irmão de Simão Pedro. Como este, era oriundo de Betsaida e vivia em Carfanaum, dedicando-se à pesca. Tiago e João eram igualmente pescadores do lago da Galileia (Mc 1, 19) e parece que gozavam de boa posição econômica, já que o pai de ambos, Zebedeu, era dono de uma pequena empresa pesqueira. Pedro, Tiago e João (sem André) constituíam um grupo especial dentro dos doze apóstolos e eram, de alguma forma, os preferidos de Jesus, já que lhes concedeu alguns privilégios. E unicamente a eles colocou um nome novo: a Simão chamou “Pedro”, e a Tiago e João, “Boanerges”, que significa “filhos do trovão” (Mc 3, 17).

Os menos famosos – Os outros oito apóstolos são menos conhecidos. De Felipe, o quinto da lista, só sabemos que era também de Betsaida e, ao que parece, muito amigo de André (Jo 12, 20-22). De Bartolomeu, o sexto, não sabemos nada. De Tomé, o sétimo, sabemos que tinha como apelido "Gêmeo", mas não se conta de quem. Foi ele quem convenceu os demais apóstolos a acompanharem Jesus, por ocasião da morte de Lázaro (Jo 11, 6-16); e foi ele quem duvidou das aparições do Senhor Ressuscitado (Jo 20, 24-29), pelo que foi chamado de incrédulo. De Mateus sabemos que era um cobrador de impostos. Dos três apóstolos que seguem – Tiago, filho de Alfeu; Tadeu e Simão, o zelote – não temos nenhum detalhe de suas vidas. E ao final da lista aparece Judas Iscariotes, o que entregou Jesus às autoridades judaicas que o mataram.

Problemas – Esta lista de Mateus coincide com a de Marcos. O problema aparece ao compará-la com as outras duas (de Lucas e Atos), porque nestas aparecem um apóstolo novo: um tal Judas, filho de Tiago (Lc 6, 16, At 1, 13). Quem é este Judas? Como nestas duas listas não há Tadeu, a solução que se encontrou foi que este Judas (de Lucas e Atos) fosse a mesma pessoa que Tadeu (de Mateus e Marcos). E o chamam Judas Tadeu. Mas, essa identificação carece de fundamento bíblico.

Mais problemas – Se prosseguirmos lendo os Evangelhos, veremos que Marcos narra a vocação de outro apóstolo, chamado Levi, cobrador de impostos. Por que ele tampouco aparece na lista dos doze? Aqui a tradição solucionou o problema do mesmo modo: identificando Levi com Mateus. O que não é possível, porque Marcos apresenta Levi e Mateus como pessoas claramente distintas: uma em uma lista dos nomes (Mc 3, 18) e outra no relato de sua vocação (Mc 2, 13-14). Por sua vez, o Evangelho de João relata a vocação de um apóstolo chamado Natanael (1, 45-51), que não está em nenhuma das quatro listas. Para poder seguir mantendo o número doze, a tradição o identificou com Bartolomeu, sem nenhuma razão válida.

Mais apóstolos? Vemos, pois, como os Evangelhos mencionam mais de doze apóstolos. Porém, se continuarmos buscando no Novo Testamento, encontraremos que Paulo e Barnabé eram também apóstolos (Atos 14, 14); que Silvano e Timóteo figuram como apóstolos (1 Ts 2, 5-7); que “Tiago, irmão do Senhor” é chamado apóstolo (Gálatas 1, 19); que Apolo é apóstolo (1 Cor 4, 6.9); e inclusive Andrônico e Júnia (uma mulher!) têm o título de apóstolos (Rm 16, 7).

Quantos eram, afinal, os apóstolos? A esta altura, já é evidente que não eram doze. Por que, então, nós falamos sempre em doze apóstolos? Bem ....  Isto nós veremos na próxima semana.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

O preço de testemunhar Jesus Cristo



No Evangelho deste domingo, João Batista vê Jesus e proclama: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo”. E dá o testemunho: “Eu vi o Espírito Santo descer do Céu como uma pomba e repousar sobre Ele. Ora eu vi e dou testemunho de que Ele é o Filho de Deus”. Atualmente, no mundo, quase 400 milhões de fiéis são discriminados ou perseguidos por darem o testemunho de sua religião, dos quais 200 milhões são cristãos.

Um pouco de História – As religiões cristãs nasceram com os ensinamentos de Cristo na Terra. Jesus Cristo nasceu no ano -7 a.C., foi batizado no ano 27 d.C., pregou entre os anos 27 e 30 d.C., foi crucificado e ressuscitou, em abril do ano 30 d.C. Portanto, a partir do ano 30 d.C., começaram a se formar as comunidades cristãs no mundo.

1º Século – No primeiro século do cristianismo (entre os anos 30 e 100 d.C.), os ensinamentos de Jesus são coletados e escritos, formando o Novo Testamento. Os apóstolos morrem, aparecendo a segunda geração de cristãos. As comunidades e igrejas cristãs proliferam dentro do Império Romano, aparecendo uma nova religião dentro do judaísmo. As perseguições aparecem, principalmente em Roma: Nero usa os corpos de cristãos como tochas humanas para iluminar os seus jardins e Dominiano ordena que todos devem cultuá-lo como “Senhor e Deus”. No ano 100 d.C., os cristãos eram 2 milhões (0,6% da população mundial), 25 mil tinham sido assassinados (1,2%), ou seja, 360 cristãos morriam por ano.

2º século – Entre anos 100 e 200 d.C., os martírios continuaram, aparecendo também as seitas heréticas e os apologistas. Os centros fortes da Igreja estavam na Ásia Menor, no Norte da África e em Roma. A Igreja continuou se espalhando e alcançando todas as classes, particularmente a mais baixa. No ano 200 d.C., os cristãos já eram 16 milhões (3,5% da população), 80 mil já tinham sido assassinados.

3º século – O imperador Setimo Severo (202-211 d.C.) foi o principal perseguidor da Igreja, no 3º século, proibindo a conversão para o Cristianismo. Assim mesmo, o cristianismo crescia: somente no Egito, no ano 300 d.C., existiam cerca de um milhão de cristãos. Até esse ano, os mártires cristãos já somavam 410 mil.

4º século – O séc. IV foi o século das grandes transformações. No início, deu-se a maior perseguição – instituída pelo imperador Dioclesio, em 305 d.C. – com a intenção de acabar com a Igreja. Em seguida, o imperador Constantino aceita o cristianismo e a Igreja é legalizada. É o século dos Concílios Ecumênicos e é definido o cânon do Novo Testamento. No ano 400 d.C., os cristãos já são 16% da população, o Novo Testamento existe em 11 idiomas e já existem 2 milhões de mártires cristãos.

Séculos seguintes – No 5º século a Igreja passa a usar o calendário cristão. Acontece a desintegração do Império Romano. As perseguições continuam. No ano 500 d.C. os cristãos já são 22% da população e já existem 2,5 milhões de mártires. A partir do 6º século, a Igreja ganha poder junto aos imperadores, diminuindo as perseguições.

Hoje – No início do século 21, 200 milhões de cristãos são perseguidos por causa de sua fé. Os responsáveis por isso são 70 Estados, nos quais impera um regime ateu (China, Vietnã, Cuba, Laos, Coréia do Norte), ou um crescente fundamentalismo religioso (Sudão, Paquistão, Egito, Índia, Indonésia, Arábia Saudita...).

Coreia do Norte – Segundo o “Open Doors 2011 World Watch List”, que avalia as condições em que vivem os cristãos em 77 nações, a Coreia do Norte é (pela nona vez) a que mais persegue os seguidores de Jesus, sendo citada como um dos lugares mais perigosos para um cristão viver.

Iraque – Nos últimos anos, há um êxodo de cristãos deixando o Iraque para escapar da perseguição. Atualmente, restam pouco mais de 300 mil cristãos nesse antigo berço do Cristianismo, onde hoje, milícias organizadas barbarizam famílias apenas pelo fato de não professarem a mesma fé que eles. No Natal de 2019 o mundo ficou chocado com um vídeo do grupo extremista Estado Islâmico mostrando 11 cristãos sendo degolados.

Perseguição – Estima-se que 75% das vítimas de perseguição religiosa no mundo seja de Cristãos. A cada cinco minutos, um cristão é assassinado por razão da sua fé. A cada ano, 105 mil cristãos no mundo são condenados ao martírio: um verdadeiro holocausto.

sábado, 4 de janeiro de 2020

Magos do Oriente: inteligência e fé




No Evangelho deste domingo (Mt 2,1-12), os “magos” do oriente (representantes de todos os povos da Terra) vêm ao encontro de Jesus. Atentos aos sinais da chegada do Messias, procuram o Menino com esperança, até que O encontram, reconhecendo n’Ele a “salvação de Deus” e aceitando-O como “o Senhor”.

Papa – Reproduzimos, a seguir, a reflexão realizada pelo Papa Bento XVI, durante o Ângelus do dia 6/1/2010, com os peregrinos reunidos na Praça de São Pedro.

Sinal – Queridos irmãos e irmãs! Celebramos hoje a grande festa da Epifania, o mistério da manifestação do Senhor a todos os povos, representados pelos Magos, vindos do Oriente para adorar o Rei dos Judeus (cf. Mt 2, 1-2). O evangelista Mateus, que relata o acontecimento, sublinha que estes chegaram a Jerusalém seguindo uma estrela, vista em seu surgimento e interpretada como sinal do nascimento do Rei anunciado pelos profetas, ou seja, o Messias.

Estrelas – Quando chegaram a Jerusalém, no entanto, os Magos precisaram das indicações dos sacerdotes e dos escribas para conhecer exatamente o lugar ao qual deveriam se dirigir, isto é, Belém, a cidade de Davi (Mt 2,5-6; Mq 5,1). A estrela e as Sagradas Escrituras foram as duas luzes que guiaram o caminho dos Magos, que aparecem como modelos dos autênticos buscadores da verdade.

Revelações – Eles eram sábios, que sondavam os astros e conheciam a história dos povos. Eram homens de ciência, em um sentido amplo, que observavam o cosmos, considerando-o quase como um grande livro, cheio de sinais e de mensagens divinas para o homem. Seu saber, portanto, longe de considerar-se autossuficiente, estava aberto a posteriores revelações e chamados divinos. De fato, não se envergonharam de pedir instruções aos chefes religiosos dos judeus. Eles poderiam ter dito: façamos isso sozinhos, não precisamos de ninguém, evitando, segundo nossa mentalidade atual, toda “contaminação” entre a ciência e a Palavra de Deus.

Profecia – No entanto, os Magos escutaram as profecias e as acolheram; e assim que voltaram ao caminho, rumo a Belém, viram novamente a estrela, quase como confirmação de uma perfeita harmonia entre a busca humana e a Verdade divina, uma harmonia que encheu de alegria seus corações de autênticos sábios (Mt 2, 10). O cume do seu itinerário de busca foi quando se encontraram diante do “Menino com Maria, sua mãe” (Mt 2, 11).

Sábios – O Evangelho diz que “ajoelharam-se diante dele e o adoraram”. Eles poderiam ter ficado desiludidos e, mais ainda, escandalizados. No entanto, como verdadeiros sábios, abriram-se ao mistério que se manifesta de forma surpreendente; e, com seus dons simbólicos, demonstraram que reconheciam em Jesus o Rei e o Filho de Deus. Precisamente, neste gesto, se cumprem os oráculos messiânicos que anunciam a homenagem das nações ao Deus de Israel.

Inteligência e fé – Um último detalhe confirma, nos Magos, a unidade entre inteligência e fé: é o fato de que, “avisados em sonho para não voltarem a Herodes, retornaram para a sua terra, seguindo outro caminho” (Mt 2, 12). Teria sido natural voltar a Jerusalém, ao palácio de Herodes e ao Templo, para proclamar sua descoberta. No entanto, os Magos, que escolheram o Menino como soberano, protegeram-nO, escondendo-O, segundo o estilo de Maria, ou melhor, do próprio Deus e, assim como tinham aparecido, desapareceram no silêncio, apagados, mas também transformados, após o encontro com a Verdade. Eles descobriram um novo rosto de Deus, uma nova realeza: a do amor.

Maria – Que a Virgem Maria, modelo de verdadeira sabedoria, nos ajude a sermos autênticos buscadores da verdade de Deus, capazes de viver sempre a profunda sintonia que existe entre a razão e a fé, entre a ciência e a revelação.