sábado, 28 de outubro de 2000

Jesus e a História (II)

Coluna "Ser Católico" – Jornal da Cidade – 28/10/2000

Inúmeras vezes nós, cristãos, somos questionados sobre a pessoa de Jesus Cristo. Alguns, mais extremados, chegam até a afirmar que Jesus nunca existiu, e que tudo não passa de pura invenção dos primeiros cristãos. Existem ainda os professores de História Geral que ensinam a seus alunos não haver provas extra-bíblicas sobre a existência de Jesus.

Vamos continuar o artigo da semana anterior, citando mais alguns documentos históricos sobre Jesus.

O primeiro texto é do historiador romano Tácito (55 – 120), intitulado "Anais", escrito em 64 d.C., relatando a origem do nome "cristãos", responsabilizados pelo imperador Nero pelo incêndio de Roma. Notar que o historiador confirma a morte (crucificação) sob as ordens de Pôncio Pilatos: "Nero firmou a culpabilidade e infligiu as torturas mais primorosas a uma classe odiada por suas abominações, os chamados cristãos. Este nome vem de Cristo, que o Imperador Pôncio Pilatos condenou à morte, sob o reinado de Tibério. Esta odiosa superstição, reprimida durante algum tempo, se propagou de novo não somente na Judéia, onde nasceu esse mal, mas também em Roma, para onde aflui tudo o que o mundo produz de detestável e desonroso, aí encontrando numerosos adeptos. A repressão foi primeiro aos que se confessaram culpados .. ." (Anais, 15, 44).

É importante não confundir Tácito, o historiador romano (autor do texto acima), com o imperador romano de mesmo nome, que viveu entre os anos 200 e 276, sendo imperador entre 275 e 276.

O segundo documento (datado de 112 d.C.) trata-se de uma carta de Plínio (61-112 d.C.), aristocrata, governador da Ásia Menor, ao imperador romano Trajano (viveu entre 53 e 117, sendo imperador entre 98 e 117), onde relata algumas particularidades dos cristãos. Nesta carta, Plínio pede a Trajano que legalize os cristãos. Eis um trecho da carta: "... os cristãos se reuniam em dias fixos, antes do nascer do sol, e cantavam um hino a Cristo, como se fosse um deus." (Cartas 10,96).

Cabe aqui uma explicação importante: o governador Plínio (autor do texto acima) não deve ser confundido com o historiador e naturalista romano Plínio (o Velho), que viveu entre os anos 23 e 79 d.C.

Existem ainda outros textos que comprovam a existência de Jesus como personagem histórico: Tallus, no seu livro de história escrito entre 50 e 70 d.C.; Suetonius, em ‘Vidas dos Caesars’ escrito em 125 d.C.; Galen, em vários textos datados de 150 d.C.; Celsus (filósofo pagão), em ‘Verdadeiro Discurso’, escrito em 170 d.C.; Mara Bar Serapion, em 73 d.C.; Julius Africanus, no livro ‘História do Mundo’ escrito no 3º século.

sábado, 21 de outubro de 2000

Jesus e a História (Parte 1)

Coluna "Ser Católico" – Jornal da Cidade – 21/10/2000


Jesus teria sido realmente uma figura histórica? Ele realmente existiu, ou seria apenas um mito criado pelos cristãos? Existiu o Jesus histórico, ou apenas o Cristo (Messias) da Igreja e dos Evangelhos? Existiriam documentos, fora da Igreja, que comprovariam, historicamente, a presença do homem Jesus na terra?

A resposta é: não existem dúvidas. Documentos históricos comprovam a existência física do homem Jesus, que viveu na região da Palestina, tendo morrido crucificado. É necessário, porém, que nos atentemos para um importante dado: Jesus viveu numa insignificante região agropecuária do mediterrâneo, numa faixa de terra de 240 km de norte a sul e 100 km de leste a oeste, entre o Mar Mediterrâneo e o Rio Jordão.

A Palestina, como era chamada, era colonizada pelo Império Romano desde 63 a.C. como um "Reino Cliente", com um rei próprio, e toda uma autonomia administrativa, portanto, independente do domínio de Roma. Era habitada pelos judeus, um povo extremamente religioso, com língua própria (o hebraico ou o aramaico), que não aceitava o domínio do Império, deflagrando inúmeras revoltas. Neste quadro, nós não podemos esperar que a documentação histórica sobre o Império Romano seja farta em documentos sobre a Palestina, ou sobre um revolucionário político ou agitador popular (é assim que os romanos viam Jesus) que viveu por lá entre os anos 28 e 30 d.C., sendo crucificado pelo procurador romano Pontius Pilatus.

Outro fator decisivo era o tipo de sociedade existente no século I: a população urbana era menor que 10% do total, e menos de 0,2% formava a classe dominante (elite, letrados, intelectuais), responsável pelos registros históricos da época. Também não podemos esperar que a elite dominante do primeiro século tenha deixado muitos documentos sobre Jesus.

Vamos citar alguns documentos históricos que comprovam a existência de Jesus:

- O primeiro documento é do maior historiador do primeiro século, o judeu Flávio Josefo (historiador judeu, que viveu entre 37 e 105 d.C., tendo escrito vários livros), no livro Antigüidades Judaicas, escrito em 93 ou 94 d.C., quando descreve a morte por apedrejamento de Tiago, irmão (primo) de Cristo e chefe da comunidade cristã de Jerusalém:

"... Anás (Ananus) vendo que teria uma boa oportunidade de exercer sua autoridade, convocou uma assembléia (sanhedrim) de juizes, e trouxe diante deles o irmão de Jesus, que foi chamado Cristo, cujo nome era Tiago, e outras pessoas (companheiros dele) e apresentou contra eles a acusação de serem transgressores da lei e os condenou para serem apedrejados." ( XX, 9,1).

O mesmo autor, em outro trecho do mesmo livro conhecido como Testimonium Flavianum, faz uma descrição detalhada de Cristo. Eis o texto:

"Naquela época viveu Jesus, um homem sábio, se realmente as pessoas devem chamá-lo de homem. Pois ele executou trabalhos surpreendentes, e era um mestre que as pessoas recebiam com prazer. Ele conquistou muitos judeus e muitos gregos. Ele era o Messias. E quando Pilatos o condenou à cruz, depois de ouvir as acusações feitas contra ele por homens da mais alta posição entre nós, os seus companheiros não perderam as idéias dele. Porque ele apareceu vivo diante deles no terceiro dia, como os profetas de Deus tinham previsto, além de outras coisas maravilhosas a seu respeito. E o grupo de cristãos, que recebeu este nome por sua causa, não desapareceu até hoje" (XVIII, 3, 3).

Portanto, o maior historiador do Século I cita Jesus, reconhecendo-o não apenas como um homem comum, mas como um mestre entre os judeus, o Messias.

(Continuamos no próximo artigo, com outras citações).

sábado, 14 de outubro de 2000

O CAMELO E O BURACO DA AGULHA

Coluna Ser Católico" – Jornal da Cidade – 14/10/2000


Todos nós conhecemos o episódio em que o jovem rico perguntou a Cristo o que deveria fazer para conseguir a vida eterna. Jesus lhe indicou os Dez Mandamentos da Lei de Deus. Tendo o jovem respondido que já os observava desde a juventude, o Senhor aconselhou-lhe que vendesse as suas posses, distribuísse aos pobres e o seguisse. Ao ouvir estas palavras, o jovem afastou-se entristecido, pois era proprietário de grandes posses. Esta atitude do jovem ocasionou as seguintes observações de Cristo:

"Em verdade vos digo que dificilmente um rico entrará no reino dos céus. Digo-vos ainda: é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus" (Mt 19,24).

Sem qualquer dúvida, a desproporção, o contraste quase absurdo, causa estranheza aos dizeres de Jesus. Os pesquisadores apresentam três explicações possíveis para a esquisita comparação:

1 – JESUS TERIA USADO UM DITO POPULAR

A primeira explicação sugere que Jesus realmente tenha dito tal frase, se utilizando de uma expressão (ditado) popular. Parece que Ele quis mostrar a dificuldade da salvação, recorrendo a uma comparação absurda. Cale lembrar que esta frase usada por Jesus em Mt 19,24 nunca foi encontrada em qualquer outro texto judaico, embora outras estranhas comparações tenham aparecido:

- "Ninguém imagina, nem mesmo em sonho, uma palmeira de ouro, ou um elefante que passe pelo buraco de uma agulha" (Talmud (352).

- "Pode um etíope mudar a própria pele? Ou um leopardo apagar as malhas do pêlo de que se reveste?" (Jr 13,23).

Se Cristo vivesse nos dia atuais e se utilizasse de um ditado dos nossos dias, talvez dissesse: "Nem que chova canivete, um rico entrará no reino dos céus".

2 – CAMELO OU CORDA

Na segunda explicação supõe-se que houve um erro na transcrição dos textos dos Evangelhos. Antes da invenção da imprensa, os textos eram copiados manualmente por copistas e sujeitos a inúmeros erros. Dentre estas falhas, o escriba deve ter escrito camelo (Kámelos, em grego) no lugar de corda (Kámilos, em grego). Kámilos era uma corda de grande diâmetro, usada para prender os barcos no porto. Esta cópia do Evangelho (com a palavra trocada) foi usada como original por outros copistas, chegando até nossos dias.

Esta explicação foi apresentada por S. Cirilo de Alexandria (444) e aceita por outros textos do século V como o Tractatus de Divitiis, atribuído ao bispo Fastídio (410-450).

Portanto, se aceitarmos esta justificativa, as verdadeiras palavras de Jesus foram (Mt 19,24): "É mais fácil uma corda passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus".

3 – A PORTA DE JERUSALÉM

A terceira explicação se refere a uma descoberta recente: alguns textos da época de Jesus, reportam a existência de uma pequena passagem (ou buraco) nos muros da cidade de Jerusalém, chamado de "Buraco da Agulha". Devemos lembrar que Jerusalém era cercada por altos muros e grandes portões que eram fechados durante a noite. O Buraco da Agulha era uma passagem (talvez usada para entrar ou sair ilegalmente da cidade) onde os animais de carga só podiam passar se fossem despojados da bagagem e dobrassem os joelhos; os homens só transitavam por aí se se curvassem.

Fica a dúvida: teria Jesus se referido a esta passagem em seu discurso aos discípulos?

sábado, 7 de outubro de 2000

A IGREJA CATÓLICA E O ABORTO

Coluna "Ser Católico" – Jornal da Cidade – 07/10/2000

ASSUNTO EM MODA

Na última semana várias reportagens em jornais trouxeram à evidência o assunto "aborto". O Jornal da Cidade de 28/09 (página 30) mostrava que manifestantes em toda a América Latina estavam comemorando o dia de luta contra a ‘descriminalização do aborto’. O mesmo jornal do dia 29 noticiava a autorização para a comercialização nos Estados Unidos da pílula abortiva RU-486, já comercializada na França.

Na América Latina ainda há resistência a qualquer abertura em relação ao aborto: trata-se de um procedimento ilegal e criminoso em todos os países americanos, além de ser rejeitado oficialmente por conselhos médicos.

Existe também o movimento "Católicas pelo Direito de Decidir" (CDD), que vem aparecendo no cenário nacional. Trata-se de um movimento de mulheres (fundado em 1970 nos USA) que prega o aborto e a liberdade sexual, atacando duramente a Igreja Católica.

A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

O abortamento é sempre o extermínio de uma vida inocente, que existe desde o momento em que se dá a fecundação do óvulo pelo espermatozóide. Só se pode admitir o homicídio em caso de legítima defesa ou quando alguém é injustamente agredido e não tem outro meio de escapar da morte iminente se não exterminar o agressor. Ora, o feto não é um injusto agressor; por isso conserva o seu direito à vida, mesmo que esta incomode a gestante; o fato de resultar de estupro não legitima a violência do abortamento.

O artigo 128 do Código Penal assim se exprime:

Não se pune o aborto praticado por médico:

I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante
II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. 

A redação é clara. Não está escrito "não constitui crime", mas tão somente "não se pune". O médico que pratica aborto nesses dois casos, comete crime, embora esteja isento de punição (para detalhes, solicite no E-mail abaixo).
Estudos profundos sobre a natureza jurídica do aborto têm sido publicados em revistas especializadas. Destaca-se o pronunciamento da União dos Juristas Católicos do Rio de Janeiro sobre a inconstitucionalidade de uma lei que permitisse o aborto e o texto do Deputado Severino Cavalcanti (Pernambuco) sobre a violação do direito à vida. Estes textos completos podem ser solicitados pelo E-mail abaixo.

A POSIÇÃO DA IGREJA CATÓLICA

A Igreja Católica sempre foi contrária ao aborto. Assim, por exemplo, reza a Didaqué (primeiro catecismo cristão), datado do ano 90-100: "Não matarás, não cometerás adultério ... Não matarás crianças por aborto nem criança já nascida" (2,2). No século III, a Epístola de Diogneto observava: "Os cristãos casam-se como todos os homens; como todos procriam, mas não rejeitam os filhos" (v. 6). A Epístola de Barnabé (século II) e depois Tertuliano (220), S. Gregório de Nissa (após 394), S. Basílio Magno (379) fizeram eco aos escritores precedentes. (solicite cópia pelo E-mail).

Todos os Concílios da Igreja rejeitaram o aborto. Desde o Concílio de Ancira (Ancara) em 314, que decretou: "As mulheres que fornicam e depois matam os seus filhos ou que procedem de tal modo que eliminem o fruto de seu útero, segundo uma lei antiga são afastadas da Igreja até o fim de sua vida".

O Código de Direito Canônico prevê excomunhão para o delito de aborto: "Quem provoca o aborto, seguindo-se o efeito, incorre em excomunhão latae sententiae".

O Catecismo da Igreja Católica (compêndio de toda doutrina católica) dedica um item da Parte III (A Vida em Cristo) para considerações sobre o aborto, destacando: "A vida humana deve ser respeitada e protegida de maneira absoluta a partir do momento da concepção. Desde o primeiro momento de sua existência, o ser humano deve ver reconhecidos os seus direitos de pessoa, entre os quais o direito inviolável de todo ser inocente à vida".