Estamos na
sequência do episódio que a liturgia de domingo passado nos apresentou. Jesus
foi a Nazaré, entrou na sinagoga, foi convidado a ler um trecho dos Profetas e
a fazer o respectivo comentário… Leu uma citação de Is 61,1-2 e “atualizou-o”, aplicando
o que o profeta dizia, a Si próprio e à sua missão: “cumpriu-se hoje mesmo este
trecho da Escritura que acabais de ouvir”. O Evangelho de hoje apresenta a
reação dos habitantes de Nazaré à ação e às palavras de Jesus.
Admiração e Fúria – Não é fácil entender o desfecho da visita de Jesus a
Nazaré, logo após o seu batismo. É muito violenta a mudança de atitude dos nazarenos:
eles vão da admiração à fúria. Talvez Lucas tenha unido dois acontecimentos
numa só história, mas, seja como for, alguns pontos importantes saltam aos
olhos.
Aprovação – Em
primeiro lugar "todos aprovavam Jesus, admirados com as palavras cheias de
encanto que saíam da sua boca". Com certeza esta reação não foi causada
pela oratória de Jesus, nem porque soubesse usar "artifícios para seduzir
os ouvintes", como fazem tantos pregadores e políticos hoje. Não, foram
palavras cheias de encanto porque brotaram da sua intimidade com o Pai, da sua
espiritualidade profunda, da sua capacidade de compaixão, da coerência entre a
sua fala e a sua vivência.
Palavra – Aqui há um
desafio para todos nós: deixar que sejamos tomados pela Palavra de Deus, de tal
maneira que a nossa palavra não seja mais a nossa, mas a manifestação do
Espírito que habita em nós. Só assim as nossas palestras e pregações surtirão
efeito. Do contrário, por mais eloqüente que possa ser a nossa fala, seremos
"sinos ruidosos ou címbalos estridentes": poderemos até chamar a
atenção, mas não deixaremos frutos!
Comparando os textos – Este episódio é relatado nos três Evangelhos sinóticos,
porém, Lucas muda a frase central de Jesus. Em Marcos Jesus diz que: "Um
profeta só não é estimado em sua própria pátria, entre seus parentes e em sua
família" (Mc 6,3). Mateus fala: "Um profeta só não é estimado em sua
própria pátria e em sua família" (Mt 13,57). Lucas diz: "Nenhum
profeta é bem recebido na sua pátria" (Lc 4,24), sem qualquer referência a
uma rejeição por parte da família ou dos parentes.
Maria em Lucas – Sem dúvida, atrás desta mudança está a crescente veneração
por Maria na comunidade de Lucas, bem como a lembrança da liderança dos
parentes de Jesus, na Igreja primitiva. Segundo os estudiosos, a Igreja de
Jerusalém foi dirigida por membros do clã de Jesus até 135 d.C.: Tiago, "o
irmão do Senhor", era o chefe da Igreja-Mãe, considerado uma das
"colunas da Igreja", junto com Pedro e João, como nos diz Paulo em
Gálatas 2, 9.
Rejeição – A
reação dos vizinhos de Nazaré encontra eco, muitas vezes, nas comunidades de
hoje. É o pobre que não acredita no pobre! Jesus é rejeitado por ser
considerado o filho de José, um simples carpinteiro de Nazaré. Quantas vezes,
hoje, acontece que, em lugar de incentivar as nossas lideranças das bases, os
próprios companheiros de comunidade os rejeitam por não serem
"doutores", por não saberem "falar bonito" como sabem muito
bem os nossos exploradores!!
Caminhada – Jesus
nos dá o exemplo de como enfrentar esses problemas. Ele "continuou o seu
caminho" (Lc 4,20) e nos ensinou que apesar das críticas, da
não-aceitação, das gozações, o cristão tem que "continuar o seu
caminho". Jesus sofreu com isso, mas não se abalou, pois a sua convicção
não se baseava na opinião, aprovação e aceitação dos outros, mas na oração, na
interiorização da Palavra. Oxalá todos nós cresçamos neste sentido, seguindo o
exemplo do Mestre!
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