No tempo de Jesus, a questão da salvação era muito debatida
nos ambientes judaicos. Para os fariseus, a “salvação” era reservada apenas aos
filhos de Abraão (povo judeu), enquanto que as nações gentias (povos pagãos) seriam
destruídas e condenadas. Este é o assunto tratado por Jesus no Evangelho deste
domingo (Lc 13, 22-30). Vamos fazer uma reflexão, usando o comentário do Pe. Cantalamessa,
pregador da Casa Pontifícia de Roma.
Quantos? – Existe uma questão que sempre
marcou os fiéis: são muitos ou poucos os que se salvam? Em certas épocas, este
problema se tornou tão agudo que levou algumas pessoas em uma angústia
terrível. O Evangelho deste domingo nos informa que um dia se propôs a Jesus
este problema: “Enquanto caminhava para Jerusalém, alguém lhe disse: ‘Senhor,
são poucos os que se salvam? ’”. A pergunta, como se vê, trata do número, sobre
quantos se salvam: muitos ou poucos? Jesus, em sua resposta, muda o centro da
atenção de “os que se salvam” para “como salvar-se”, isto é, entrando “pela
porta estreita”.
Sabedoria – É a mesma atitude que observamos
com relação ao retorno final de Cristo. Os discípulos perguntam quando
acontecerá a volta do Filho do Homem, e Jesus responde indicando como preparar-se
para essa vinda, o que fazer na espera (Mt 24, 3-4). Esta forma de atuar de
Jesus não é estranha ou descortês. Simplesmente é a maneira de atuar de alguém
que quer educar seus discípulos para que passem do plano da curiosidade ao da
verdadeira sabedoria; das questões sem importância, que seduzem as pessoas, aos
verdadeiros problemas que importam na vida.
Absurdos – Neste ponto, já podemos entender
o absurdo daqueles que crêem saber até o número preciso dos salvos: cento e
quarenta e quatro mil. Este número, que aparece no Apocalipse, tem um valor
puramente simbólico (12 ao quadrado, o número das tribos de Israel,
multiplicado por mil) e se explica imediatamente com a expressão que lhe segue:
“uma multidão imensa que ninguém poderia contar” (Ap 7, 4.9).
Lotado – Também, se esse fosse de verdade
o número dos salvos, então já podemos fechar a porta, nós e eles. Como na
entrada dos estacionamentos, na porta do paraíso deve estar pendurada, há muito
tempo, a placa de “lotado”.
Método – Para Jesus, não interessa tanto
revelar-nos o número dos que serão salvos, mas a forma de salvar-se. Sobre a
salvação, Ele nos diz duas coisas: uma negativa (não necessária) e outra
positiva (necessária).
Não é necessário
– ou em todo caso não
basta, o fato de pertencer a um determinado povo, a uma determinada raça,
tradição ou instituição, ainda que fosse o povo escolhido do qual provém o Salvador.
É necessário – O que situa no caminho da
salvação não é um certo título de propriedade (“Comemos e bebemos em tua
presença...”), mas uma decisão pessoal seguida de uma coerente conduta de vida.
Isso está mais claro ainda no texto de Mateus, que contrapõe dois caminhos e
duas entradas, uma estreita e outra ampla (Mateus 7, 13-14).
Caminhos – Por que esses dois caminhos são
chamados respectivamente de caminho “amplo” e “estreito”? Será que, talvez, o
caminho do mal seja sempre fácil e agradável de percorrer e o caminho do bem,
sempre duro e fatigoso? Aqui é preciso estar atento para não cair na freqüente
tentação de achar que tudo acontece magnificamente bem, aqui embaixo, aos malvados,
e tudo vai sempre mal para os bons.
Amplo e
estreito – O caminho dos ímpios
é amplo, sim, mas só no começo; na medida em que se adentram nele, ele se torna
estreito e amargo. E em todo caso é estreitíssimo no final, porque se chega a
uma rua sem saída. O desfrute que neste caminho se experimenta, tem como
característica que diminui na medida em que é provado, até gerar náusea e
tristeza. O caminho dos justos, ao contrário, é estreito no começo, quando se empreende,
mas depois se transforma em uma via espaçosa, porque nela se encontra esperança,
alegria e paz no coração.
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