sábado, 29 de outubro de 2011

Um só é vosso Mestre, o Cristo

O Evangelho deste domingo (Mt 23,1-12) coloca-nos, mais uma vez, em Jerusalém, nos últimos dias antes da paixão e morte de Jesus. É nesses dias que se desenrola o confronto final entre Jesus e o judaísmo. Jesus diz que “os mestres da Lei e os fariseus têm autoridade para explicar a Lei de Moisés, porém não imitem as suas ações, pois eles não fazem o que ensinam. Um só é vosso Mestre, o Cristo”. Para reflexão deste Evangelho, reproduzimos o comentário do padre Raniero Cantalamessa, pregador da Casa Pontifícia de Roma. 

Mestre – No Evangelho, os títulos de Cristo são como lados de um prisma, cada um dos quais reflete uma “cor” particular, isto é, um aspecto de sua realidade íntima. Este domingo, encontramo-nos com o importante título de Mestre “Um só é vosso Mestre, o Cristo”. Entre os artistas e certas categorias de profissionais, o nome do mestre em cuja escola se tenha formado é uma das coisas das quais se está mais orgulhoso e se põe na reunião das próprias referências. Mas a relação mestre-discípulo era ainda mais importante nos tempos de Jesus, quando não havia livros e toda a sabedoria se transmitia por via oral. 

Aprendei de mim – Em um ponto Jesus se distancia do que ocorria em seu tempo entre o mestre e os discípulos. Estes pagavam, por assim dizer, os estudos, servindo ao mestre, fazendo por ele pequenos encargos e prestando-lhe os serviços que um jovem pode fazer a um ancião, entre os quais estava lavar-lhe os pés. Com Jesus sucede ao contrário: é ele quem serve aos discípulos e lhes lava os pés. Jesus não é verdadeiramente da categoria dos mestres que “dizem e não fazem”. Ele não disse a seus discípulos que fizessem nada que não tivesse feito ele mesmo. É o contrário dos mestres admoestados na passagem do Evangelho do dia, que “atam cargas pesadas e as deixam às costas das pessoas, mas eles nem com o dedo querem movê-las”. Por isso Jesus pode dizer com toda verdade: “Aprendei de mim”. 

M maiúsculo – Mas o que quer dizer que Jesus é o único mestre? Que este título não devr ser utilizado de agora em diante por nenhum outro, que ninguém tem direito de fazer-se chamar mestre. Quer dizer que ninguém tem o direito de fazer-se chamar Mestre com M maiúsculo, como se fosse o proprietário último da verdade e ensinasse em nome próprio a verdade sobre Deus. Jesus é a suprema e definitiva revelação de Deus aos homens e contém em si todas as revelações parciais que foram dadas a conhecer antes ou depois dele.  

Verdades definitivas – Não se limitou a revelar-nos quem é Deus, também nos disse o que Deus quer, qual é sua vontade em nós. Isto há que recordar ao homem de hoje, tentado de relativismo ético. João Paulo II o fez com a encíclica “O esplendor da verdade” (Veritatis splendor) e seu sucessor, Bento XVI, não se cansa de insistir nisso. Não se trata de excluir um sadio pluralismo de perspectivas sobre as questões ainda abertas ou sobre os problemas novos que se apresentam à humanidade, mas de combater essa forma de relativismo absoluto que nega a possibilidade de verdades certas e definitivas. 

Verdade absoluta – Contra este relativismo, o Magistério da Igreja reafirma que existe uma verdade absoluta, porque existe Deus que é o mediador da Verdade. Esta verdade essencial, certamente a identificar sempre com maior esmero, está impressa na consciência. Mas já que a consciência se obscureceu pelo pecado, pelos costumes e os exemplos contrários, eis aqui o papel de Cristo, que veio revelar de forma clara esta verdade de Deus; eis aqui o papel da Igreja e de seu Magistério, que explica tal verdade de Cristo e a aplica às constantes mudanças de situações da vida. 

Discípulo – Um fruto pessoal da reflexão de hoje sobre o Evangelho será redescobrir que honra, que privilégio inaudito, que “título de recomendação” é, ante Deus, ser discípulo de Jesus de Nazaré. Coloquemos também nós, isso no cume de todas as nossas “referências”. Que vendo-nos ou ouvindo-nos qualquer um possa dizer de nós o que a mulher disse a Pedro, no átrio do Sinédrio: “Também tu és um de seus discípulos. Tua própria fala (tua atuação) te denuncia”.

sábado, 22 de outubro de 2011

Amarás a teu próximo

No Evangelho das missas deste domingo, Mateus (22,34-40) descreve mais uma discussão entre Jesus e os fariseus. Para testá-lo perguntam: "Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?". Jesus responde: “Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu entendimento e amarás teu próximo como a ti mesmo”. Para reflexão deste Evangelho, reproduzimos o comentário do padre Raniero Cantalamessa, pregador da Casa Pontifícia de Roma. 

Espelho – “Amarás teu próximo como a ti mesmo”. Acrescentando as palavras “como a ti mesmo”, Jesus nos pôs diante de um espelho ao que não podemos mentir; deu-nos uma medida infalível para descobrir se amamos ou não o próximo. Sabemos muito bem, em cada circunstância, o que significa amar-nos a nós mesmos e o que queríamos que os outros fizessem por nós. Jesus não diz, se se presta bem atenção: “o que o outro faz a ti, faça a ele”. Isto seria a lei do talião: “Olho por olho, dente por dente”. Diz: o que tu queres que o outro te faça, faça tu a ele (Mt 7, 12), que é bem diferente. 

Mandamento – Jesus considerava o amor ao próximo como “seu mandamento”, aquele no qual se resume toda a Lei. “Este é meu mandamento: que vos ameis uns aos outros assim como eu vos amei” (Jo 15, 12). Muitos identificam todo o cristianismo com o preceito do amor ao próximo, e não carecem de razão. Mas devemos tentar ir um pouco mais além da superfície das coisas. Quando se fala de amor ao próximo, a mente vai em seguida às “obras” de caridade, às coisas que há que fazer pelo próximo: dar-lhe de comer, de beber, visitá-lo; em resumo, ajudar o próximo. Mas isto é um efeito do amor, não é ainda o amor. Antes da beneficência vem a benevolência, antes que fazer o bem, vem o querer bem. 

Pureza – A caridade deve ser “sem fingimento”, isto é, sincera (literalmente “sem hipocrisia”, Rm 12, 9); deve-se amar “com coração puro” (1 Pd 1,22). Pode-se de fato fazer a caridade e a esmola por muitos motivos que nada têm a ver com o amor: para admoestar-se, para passar por benfeitor, para ganhar o paraíso, até por remorsos de consciência. 

Caridade – Muita caridade que fazemos a países do Terceiro Mundo não está ditada pelo amor, mas por remorso. Damo-nos conta da escandalosa diferença que existe entre nós e eles e nos sentimos em parte responsáveis por sua miséria. Pode-se carecer de caridade inclusive ao “fazer caridade”! Seria um erro fatal contrapor entre si o amor do coração e da caridade dos fatos, ou refugiar-se nas boas disposições interiores para os demais para encontrar nisso uma desculpa à própria falta de caridade ativa e concreta. 

Obras – Se encontras um pobre faminto e tremendo de frio, dizia São Tiago, de que lhe serve se lhe diz: “Pobrezinho, vê, acalenta-te, coma algo!”, mas não lhe dás nada do que necessita? “Filhos”, acrescenta São João, “não amemos de palavra nem de boca, mas com obras e segundo a verdade” (1 Jo 3, 18). Não se trata, portanto, de desvalorizar as obras exteriores de caridade, mas fazer que estas tenham o fundamento em um genuíno sentimento de amor e de benevolência. 

Olhar – A caridade do coração ou interior é a caridade que todos podemos exercitar, é universal. Não é uma caridade que alguns – os ricos e os sãos – só podem dar e os outros – os pobres e os enfermos – só receber. Todos podem dá-la e recebê-la. Também é concreta. Trata-se de começar a olhar com olhos novos as situações e as pessoas com as quais vivemos. Que olhos? É simples: os olhos com os quais queríamos que Deus nos olhasse! Olhos de desculpa, de benevolência, de compreensão, de perdão... 

Máscara – Quando isto sucede, todas as relações mudam. Caem, como por milagre, todos os motivos de prevenção e hostilidade que impediam de amar a certa pessoa e esta nos começa a aparecer pelo que é na realidade: uma pobre criatura que sofre por suas fraquezas e suas limitações, como tu, como todos. É como se a máscara que os homens e as coisas se puseram caísse e a pessoa aparecesse pelo que verdadeiramente é.

sábado, 15 de outubro de 2011

Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus

No Evangelho das missas deste domingo, Mateus (22,15-21) descreve mais uma discussão entre Jesus e os fariseus.  

Pegadinha – Os fariseus se reuniram para criar uma maneira de surpreender Jesus. Foram até Ele e perguntaram se era correto pagar o tributo a César (o Imperador de Roma). Percebendo a malícia, Jesus pediu que lhe mostrassem a moeda. Ao apresentarem uma moeda de um denário, perguntou: “De quem é esta imagem e esta inscrição?” Ao lhe responderem que era de César, Jesus disse: “Então, dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. 

O texto – Com esse texto, entramos em um bloco de quatro unidades, que apresentam diversas controvérsias entre Jesus e lideranças judaicas diferentes: os fariseus, os herodianos e os saduceus. A discussão do trecho deste domingo talvez seja a mais conhecida, mas muitas vezes tem sido interpretada de maneira errada, projetando sobre Jesus os nossos preconceitos políticos e sociais.

Herodianos – É necessário entender que não se tratava de uma pergunta sincera feita a Jesus, mas, de uma armadilha preparada por membros de dois grupos politicamente opostos e antagônicos: os herodianos (submissos à dominação romana) e os fariseus (muitos dos quais olhavam os herodianos como impuros, pela sua colaboração com o poder estrangeiro). 
 

Cilada – Se Jesus respondesse que era lícito pagar o imposto, correria o risco de ser apresentado pelos fariseus como um opressor do povo. Se Ele negasse, poderia ser denunciado pelos herodianos como subversivo político. Era uma situação semelhante àquela que aparece em João 8, 1-11 (a mulher adúltera), pois qualquer resposta deixaria Jesus em maus lençóis. Como naquela ocasião, Jesus se mostrou verdadeiro Mestre, escapando da cilada e, ainda por cima, oferecendo um ensinamento importante.

A Moeda – Primeiro Ele deixa claro que entendeu a “jogada”: “Hipócritas, por que me armais uma cilada?” Depois, coloca os seus interlocutores contra a parede, pedindo uma moeda do imposto e perguntando: “De quem são esta efígie e esta inscrição?” A inscrição seria “Tibério César Filho do Divino Augusto, Sumo Pontífice” - demonstrando as pretensões de divinização do Império Romano. Com a resposta: “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”, Jesus joga para os seus ouvintes uma questão essencial: o que é que pertence a César e o que é que pertence a Deus? 
 

Império – A divindade pertence a Deus, não ao Império Romano nem a César. Assim, Ele evita confirmar o projeto nacionalista violento de muitos judeus da sua época e condena também qualquer projeto que divinizasse o poder civil. Uma advertência muito atual para os nossos dias, quando o único poder imperial hegemônico (muito semelhante à situação do Império Romano do tempo de Jesus) reivindica para si o direito de impor as suas decisões sobre todas as nações, taxando de “terrorista” quem discorda da sua dominação ideológica, econômica e militar. O poder civil existe para cuidar do povo – que é de Deus – e não para explorá-lo. Desta forma, Jesus nega as aspirações imperialistas e, evitando uma resposta direta à pergunta, enfatiza e relativiza todo e qualquer poder, pois o verdadeiro poder só pertence a Deus.

Neoliberalismo – Nos nossos dias, ainda existem poderes com as mesmas aspirações dos romanos. Embora não digam abertamente, os defensores do neoliberalismo desenfreado divinizam um sistema ganancioso que só visa o lucro e explora o povo sofrido. As palavras de Jesus nos lembram de que nenhum cristão pode compactuar com qualquer sistema – seja político, econômico ou religioso – que atribua a si o que pertence a Deus. 
 

Dualismo – O texto de forma alguma justifica um dualismo entre o espiritual (de Deus) e o material (de César). Pelo contrário, mostra que o poder político, econômico e religioso deve estar a serviço do bem comum, pois, se não for assim, está roubando o que é de Deus: o seu povo. Não se pode entregar às garras de um poder opressor, seja ele estrangeiro ou nacional, o que pertence ao Pai. O poder é legítimo quando está a serviço da vida e do bem-estar comum; é ilegítimo quando está a serviço somente de uns poucos privilegiados. “Dar a Deus o que é de Deus” não se resume em rituais religiosos; refere-se à construção de uma sociedade solidária, justa e fraterna, na qual todos possam “ter a vida e a vida em abundância” (Jo 10, 10). À medida que lutamos por esse objetivo, estamos dando “a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.

sábado, 8 de outubro de 2011

Banquete do Reino

No Evangelho das missas deste domingo (Mt 22,1-14), o evangelista Mateus apresenta a parábola dos convidados para o banquete nupcial. 

O Evangelho – Jesus se dirige aos sacerdotes e anciãos do povo e conta a parábola do rei que preparou um banquete nupcial para o seu filho. Mandou chamar os convidados, mas eles não quiseram vir. Chamou todas as pessoas que encontrou, maus e bons, e a sala do banquete encheu-se de convidados. Ao entrar na sala, o rei viu um homem que não estava vestido com o traje nupcial e mandou retira-lo da festa. No final conclui: “Na verdade, muitos são os chamados, mas poucos os escolhidos”. 

Situação – Continuamos em Jerusalém, nos dias que antecedem a Páscoa. Os dirigentes religiosos judeus aumentam a pressão sobre Jesus. Instalados nas suas certezas e seguranças, já decidiram que a proposta de Jesus não vem de Deus; por isso, rejeitam de forma absoluta o Reino que ele anuncia. 

Banquete – O “banquete” era, na cultura semita, o lugar do encontro, da comunhão, do estreitamento de laços familiares entre os convivas. Além disso, o “banquete” era também a cerimônia através da qual se confirmava o “status” das pessoas e o seu lugar dentro da escala social. Quem organizava um “banquete” procurava fazer uma seleção cuidadosa dos convidados: a presença de gente “desclassificada” faria descer consideravelmente, aos olhos de toda a comunidade, o “status” da família; e, por outro lado, a presença à mesa de pessoas importantes realçava a importância e a honra da família. 

Reino – O sentido da parábola é óbvio… Deus é o rei que convidou Israel para o “banquete” do encontro, da comunhão, da chegada dos tempos messiânicos (as bodas do “filho”). Os sacerdotes, os escribas, os doutores da Lei recusaram o convite e preferiram continuar agarrados aos seus esquemas, aos seus preconceitos, aos seus sistemas de autossalvação. Então, Deus convidou para o “banquete” do Messias esses pecadores e desclassificados que, na perspectiva da teologia oficial, estavam excluídos da comunhão com Deus e do Reino. 

Pecadores – Esta parábola explicita bem o cenário em que o próprio Jesus se move… Ele aparece, com frequência, participando de “banquetes” ao lado de gente duvidosa e desclassificada. Os líderes de Israel, no entanto, sempre reprovaram que Jesus mantivesse esse contato com essas pessoas… Para eles, os publicanos e as prostitutas, por exemplo, estavam definitivamente excluídas da comunidade, da salvação. Sentá-los à mesa do “banquete” do Reino era algo que os líderes de Israel achavam absolutamente inapropriado. 

Traje – A segunda parte da parábola fala do convidado que se apresentou na festa sem o traje nupcial. O rei que organizou o “banquete” mandou, então, lançá-lo fora da sala onde se realizava a festa. A parábola constitui uma advertência àqueles que aceitaram o convite de Deus para a festa do Reino, aderiram à proposta de Jesus e receberam o Batismo.  

Batizados – Mateus escreve no final do século I (anos 80), quando os cristãos já tinham esquecido o entusiasmo inicial e viviam instalados numa fé pouco exigente. Consideravam que já tinham feito uma opção definitiva, ao serem batizados, e que já tinham assegurado a salvação. Mateus diz-lhes: cuidado, porque não basta entrar na sala do “banquete”; é preciso, além disso, vestir um estilo de vida que ponha em prática os ensinamentos de Jesus. Quem foi batizado e aderiu ao “banquete” do Reino, mas recusou o traje do amor, da partilha, do serviço, da misericórdia, do dom da vida e continua vestido de egoísmo, de arrogância, de orgulho, de injustiça, não pode participar na festa do encontro e da comunhão com Deus. Deus chamou todos os homens e mulheres para participarem no “banquete”; mas só serão admitidos aqueles que responderem ao convite e mudarem completamente a sua vida.

sábado, 1 de outubro de 2011

A Vinha de Deus

No Evangelho das missas deste domingo (Mt 21,33-43), o evangelista Mateus apresenta a parábola dos lavradores maus. 

O Evangelho – Um agricultor fez uma plantação de uvas e, em seguida, arrendou a plantação para alguns lavradores e foi viajar. Quando chegou o tempo da colheita, o dono mandou alguns empregados a fim de receber a parte dele, mas os lavradores agarraram e mataram os empregados. Aí o dono mandou mais empregados do que da primeira vez e os lavradores fizeram a mesma coisa. Depois, ele mandou o seu próprio filho, que também foi morto. E Jesus perguntou: “E agora, quando o dono da plantação voltar, o que é que ele vai fazer com aqueles lavradores?”. 

Situação – O texto proposto situa-nos em Jerusalém, na segunda ou terça-feira da semana da Paixão. No sábado anterior (1º de abril do ano 30), Jesus entrou solenemente em Jerusalém (Mt 21,1-11); na segunda-feira, os judeus se reuniram para condenar Jesus (Lc 19,47s) e, na próxima sexta-feira (7 de abril), Jesus será preso, condenado e morto. 

Tensão – De hora para hora, cresce a tensão entre Jesus e os seus adversários. Os líderes judaicos pressionam Jesus, num esquema organizado para realizar um processo judicial. Adivinha-se, no horizonte próximo de Jesus, a prisão, o julgamento, a condenação à morte. Jesus está plenamente consciente do destino que lhe está reservado, mas enfrenta os dirigentes e condena implacavelmente a sua recusa em acolher o Reino. 

Latifundiários – A história que nos vai ser narrada compreende-se melhor à luz da situação socioeconômica da Galileia do tempo de Jesus… A terra estava, quase sempre, nas mãos de grandes proprietários, que viviam nas cidades. Esses donos de terra utilizavam vários sistemas para a exploração de seus latifúndios; uma das formas preferidas consistia em arrendar pedaços de terra, em troca de uma parte considerável dos produtos recolhidos.  

Arrendatários – Os que arrendavam as terras, geralmente, eram camponeses que tinham perdido as suas próprias terras, por causa dos altos impostos ou devido às más colheitas. Estes camponeses viviam numa situação difícil: depois de descontados os gastos com a exploração, os impostos pagos e a parte que pertencia ao latifundiário, mal ficavam com o indispensável para sustentar a sua família. Em anos que as colheitas eram ruins, este esquema significava a mais absoluta miséria… Este quadro provocava conflitos sociais frequentes e o aparecimento de revolta por parte dos camponeses, que lutavam contra os proprietários ou contra a carga excessiva de impostos. É neste cenário que Jesus vai colocar a parábola da leitura deste domingo. 

A vinha – A vinha, na tradição profética de Israel, representa o povo. Deus é o proprietário da vinha (povo) que é entregue aos cuidados de agricultores arrendatários (uma alusão aos dirigentes religiosos de Jerusalém), aos quais cabia multiplicar os frutos da vinha (a justiça e o direito). Mas isso não aconteceu. Quando o Filho vem para colher estes frutos, não só não os encontra como será morto por estes dirigentes. 

Questão – Jesus interpela diretamente os seus ouvintes: “quando vier o dono da vinha, que fará àqueles vinhateiros?”. 

Resposta – A comunidade cristã primitiva encontrou facilmente a resposta para esta questão. Na perspectiva dos primeiros catequistas cristãos, a resposta de Deus à recusa de Israel foi dada em dois movimentos. Em primeiro lugar, Deus ressuscitou o “filho” que os “vinhateiros” mataram, glorificou-o e constituiu-o “pedra angular” de uma nova construção; em segundo lugar, Deus decidiu retirar a “vinha” das mãos desses “vinhateiros” maus e ingratos e confiá-la a outros “vinhateiros” – a um povo que fizesse a “vinha” produzir bons frutos e que entregasse ao “senhor” os frutos a que ele tem direito.