O
Evangelho deste domingo apresenta o encontro de Jesus com a mulher pecadora
que, arrependida de suas faltas, procura o perdão banhando os pés de Jesus com
perfume e enxugando-os com os próprios cabelos. Durante dois mil anos, os
cristãos associaram a imagem dessa mulher, considerada prostituta, com a de Maria
Madalena. Por que isso se deu?
Prostituta? –
A ideia que temos de Maria Madalena é de uma mulher charmosa, de longos
cabelos, atormentada por seus pecados e que de algum modo representa a imagem
penitencial da Igreja. Nos quadros e obras de arte, ela sempre aparece com
roupas provocantes, um manto vermelho, cabelos soltos, ajoelhada junto à cruz
ou atirada devotamente aos pés de Jesus. Porém, quando vamos procurar no Novo
Testamento a existência da pecadora Madalena, nada encontramos. Não encontramos
nem um episódio que descreva a imagem da prostituta que conhecemos. De onde
teria surgido essa história?
Madalena –
A primeira vez que Maria Madalena aparece é na metade do Evangelho de Lucas.
Jesus viajava com seus doze apóstolos e algumas mulheres, que haviam sido
curadas de “maus espíritos”; entre elas estava Maria Madalena (Lc 8, 2-3).
Maria era o nome mais comum no tempo de Jesus, por isso, quando se nomeava
alguma Maria, juntava-se alguma designação: “Maria, esposa de”, ou “Maria, mãe
de”, ou “Maria, irmã de”. Neste caso, se diz “Madalena” porque ela havia
nascido num povoado chamado “Magdala”, ou seja, Madalena não era um nome, mas
um apelido referente ao seu lugar de origem.
No Evangelho – A
segunda vez em que Madalena aparece é no momento da crucificação de Jesus; ela
está presente com as “outras” Marias e Salomé. A terceira vez que aparece nos
Evangelhos é na retirada de Jesus da cruz, junto com José de Arimateia. A
quarta vez é na madrugada do domingo de Páscoa, quando foi visitar o túmulo de
Jesus. Maria Madalena é mencionada uma quinta vez, quando, ao sair do sepulcro,
tem um fascinante encontro com Cristo ressuscitado.
Razões – Que
razões teriam levado à identificação de Madalena como prostituta? A primeira
explicação está no final do capítulo 7 do Evangelho de Lucas, lido neste final
de semana. Jesus foi comer na casa de um fariseu chamado Simão. Quando estava
na mesa, apareceu uma mulher pecadora, que lavou os pés dele com lágrimas e os enxugou
com os próprios cabelos. O dono da casa reconheceu a mulher como prostituta e
assustou-se ao ver que Jesus se deixou ser tocado por ela. Na sequência do
texto, inicia-se o capítulo 8 de Lucas, que menciona o nome de Madalena (Lc
8,1-3) Os cristãos relacionaram os textos, ligando a imagem da prostituta à de Madalena.
Outro engano –
No Evangelho de Marcos é apresentada a história de que Jesus, na cidade de
Betânia, encontrou-se com uma mulher que derramou um frasco de perfume em sua cabeça. Esta
mulher, por fazer algo semelhante à pecadora (de Lucas) foi também identificada
como Maria Madalena. Assim, as três mulheres (Maria Madalena que seguia Jesus,
a pecadora anônima e a mulher de Betânia) passaram a ser uma só pessoa,
identificada como Maria Madalena.
Mais enganos –
No Evangelho de João, capítulo 4, Jesus se encontra (junto ao poço de Jacó) com
uma promíscua samaritana, que já havia se relacionado com seis maridos. Embora
o Evangelho não apresente qualquer identificação desta samaritana, ela também
foi nomeada como Maria Madalena. O maior de todos os enganos relaciona-se ao
capítulo 8 do Evangelho de João: a mulher surpreendida em adultério, prestes a
ser apedrejada pelos judeus, também foi identificada como Maria Madalena.
A Igreja –
Muitos Papas e Santos da Igreja se opuseram a este erro histórico dentro da
Igreja, entre eles, Santo Agostinho (século IV) e Santo Ambrósio (século IV). Mas
o Papa Gregório Magno, numa célebre homilia pronunciada em 14 de setembro do
ano 591, afirmou: “Pensamos que aquela a quem Lucas denomina pecadora e que
João chama de Maria, designa essa Maria de quem foram expulsos sete demônios”.
Assim, a partir do século VII a Igreja passou a sustentar, unanimemente, que as
três mulheres eram uma só.
Estudos atuais –
Atualmente, num estudo mais detalhado, os exegetas, têm repudiado essa
identificação, sustentando que são três pessoas distintas: a primeira (Lc
8,1-3) é Maria Madalena, que não tinha uma vida pecadora, mas “os sete demônios”
(que se referem a alguma enfermidade); a pecadora pública (Lc 7, 36-50) é uma
segunda mulher, que lava os pés de Jesus com lágrimas e enxuga com os cabelos,
na tentativa de buscar perdão dos pecados; e a terceira mulher (distinta das
duas primeiras) derrama perfume na cabeça de Jesus (Mc 14, 3-9).
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