quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

“Hoje se cumpriu a Escritura”




O Evangelho deste domingo (Lc 1,1-4; 4,14-21) relata a primeira experiência da vida pública de Jesus. Aconteceu em maio/junho do ano 28 d.C., na cidade de Nazaré, onde Jesus foi criado. Jesus iniciava a sua vida pública com 34 anos de idade. Em dois anos, ele fará toda a sua pregação, sendo crucificado e morto em abril do ano 30.

Sinagoga – Era um sábado e Jesus foi à sinagoga para participar do culto semanal. O culto de então consistia do canto de um salmo, a recitação do Shema Israel e as Dezoito Bênçãos, uma primeira leitura do Torá e uma segunda dos Profetas, uma homilia sobre as leituras, a benção do presidente da assembléia e a benção sacerdotal de Nm 6,24-27. Segundo muitas autoridades, a primeira leitura era prescrita, a segunda à escolha do leitor. Qualquer judeu adulto (masculino) podia tomar a palavra, mas as autoridades sinagogais habitualmente confiavam esta incumbência aos que eram considerados versados nas escrituras. Jesus foi convidado a fazer a segunda leitura.

Isaías – Jesus buscou a passagem do livro de Isaías. A citação de Lucas não é exatamente como está no Antigo Testamento, mas uma combinação de Is 61,1-2 e 58.6, omitindo 61,1c e 61,2b-3a. Nós, cristãos, discípulos de Jesus e continuadores da sua missão no mundo atual, temos aqui os elementos essenciais para a vivência da nossa vocação. Olhemos esses elementos:

a) "Anunciar a Boa-Notícia aos pobres" – O Evangelho é "Boa Notícia"- não uma série de leis, nem uma lista de práticas rituais, mas uma experiência de Deus que traz alegria, felicidade – para os pobres!

b) "Proclamar a libertação aos presos" – Não somente aos presos da cadeia, mas aos que estão sem a liberdade dos filhos de Deus – presos pelas conseqüências trágicas do neoliberalismo, do desemprego, do salário mínimo; presos pelas correntes de racismo, machismo, clericalismo e todos os "ismos" que oprimem! Também os presos pelo próprio egoísmo, pois assumir os valores evangélicos liberta, através de uma mudança radical na nossa visão e maneira de viver. Nós somos convidados a rever se nós não estamos presos por estruturas antiquadas e sem importância, que impedem que sejamos realmente instrumentos de libertação para os oprimidos que estão próximos a nós.

c) "Aos cegos a recuperação da vista" – Quanta gente cega hoje! Não só por problemas de vista, mas cegas por não verem a realidade do mundo e dos pobres; tornadas cegas pelas falsas utopias da televisão – que cria um mundo de fantasia, totalmente alienante –; pela manipulação de informação pelos meios de comunicação, controlados pelas elites; pelo incentivo ao consumo, que induz a ter sempre mais, especialmente aqueles que carecem de um senso crítico mais apurado.

d) "Libertar os oprimidos" – Essa frase evoca o eixo fundamental da Bíblia – o Êxodo, como processo permanente de libertação. No livro do Êxodo, Deus se identificou como o Deus que liberta os oprimidos (Ex 3,7-10). E Jesus se coloca – e coloca todos os seus seguidores – neste mesmo compromisso. Hoje a época é diferente, mas a opressão continua, e Deus nos convoca para que todos nos empenhemos nesta luta permanente de concretizar a libertação dos oprimidos. O texto originalmente se referia aos presos por dívidas (cf. Lc 6,35.37; Nm 5,1-5). Aqui há a lembrança do Ano Jubilar. Atrás desta citação está a convicção de que as estruturas da vida social e econômica devem refletir o Reinado de Deus.

e) "Proclamar o Ano de Graça do Senhor" – O Ano de Graça – o Ano Jubilar! Memória da proposta de Lev. 25, o ano do perdão das dívidas, da libertação dos escravos, da devolução das terras aos seus donos originais! Um ano de alegria e graça, especialmente para o povo pobre e oprimido! Como concretizar esta visão, na realidade atual do Brasil? Júbilo e alegria, não podem ser decretados – têm que brotar de algum motivo profundo: o crescimento real da vivência do Reino de Deus entre nós, através de mudanças reais nas estruturas e relacionamentos, no nível pessoal, social, familiar e eclesial.


Hoje – Hoje continua o desafio de deixar bem claro o que significa para nós, no lugar onde nos achamos, "pregar a Boa Notícia aos pobres", "libertar os presos", "recuperar a vista dos cegos", "libertar os oprimidos" e "pregar o Ano da Graça do Senhor". E nós podemos enfrentar esse desafio com coragem, pois, como Jesus, todos nós fomos "consagrados com a unção", para esta missão e o Espírito que sustentou Jesus na sua missão não falhará no sustento de quem realmente se lança no seguimento de Jesus, para que o Reino de Deus realize-se entre nós.

Nenhum comentário:

Postar um comentário