sábado, 27 de janeiro de 2024

Um ensinamento novo

 

No evangelho deste domingo, Marcos (1,21-28) descreve a entrada de Jesus em uma sinagoga, em Cafarnaum, pondo-se a ensinar. Em sua narrativa, o evangelista descreve o conflito de Jesus com o rígido sistema religioso judaico e sua severa repreensão ao espírito impuro com o qual se defronta. Na conclusão, fica em destaque o ensinamento novo de Jesus, que vem subjugar os espíritos impuros.

 Descoberta – A primeira parte do Evangelho escrito por Marcos tem como objetivo fundamental levar o leitor a descobrir Jesus como o Messias que proclama o Reino de Deus. Ao longo de um percurso, os leitores são convidados a acompanhar a revelação de Jesus, a escutar suas palavras e a aderir à sua proposta de salvação/libertação. Este percurso de descoberta do Messias termina em Mc 8,29-30, com a confissão messiânica de Pedro: “Tu és o Messias”.

 Encontro libertador – O texto que nos é proposto neste final de semana aparece, exatamente, no princípio dessa caminhada de encontro com o Messias e com o seu anúncio de salvação. Já rodeado pelos primeiros discípulos, Jesus começa a revelar-Se como o Messias-libertador, que está no meio dos homens para lhes apresentar uma proposta de salvação.

 Local – O Evangelho situa-nos em Cafarnaum (em hebraico Kfar Nahum, a “aldeia de Naum”), a cidade situada na costa noroeste do Lago Kineret (o Mar da Galileia). De acordo com os Evangelhos Sinópticos, é aí que Jesus se vai instalar durante o tempo do seu ministério na Galileia. Vários dos discípulos – Simão e seu irmão André, Tiago, filho de Zebedeu, e seu irmão João – viviam em Cafarnaum.

 A cena – É um sábado. A comunidade está reunida na sinagoga de Cafarnaum para a liturgia do dia. Jesus, recém-chegado à cidade, entra na sinagoga – como qualquer bom judeu – para participar na liturgia sabática. A celebração comunitária começava, normalmente, com a “profissão de fé” (Dt 6,4-9), a que se seguiam orações, cânticos e duas leituras: a primeira, escolhida da Torah (os cinco primeiros livros do Antigo Testamento) e a segunda, de um dos livros dos Profetas; depois, vinha o comentário às Leituras e as bênçãos.

 Comentarista – É provável que Jesus tivesse sido convidado, nesse dia, para comentar as leituras feitas. Fez as reflexões sobre o texto de uma forma original, diferente dos comentários que as pessoas estavam habituadas a ouvir dos “escribas” (os estudiosos das Escrituras). As pessoas ficaram maravilhadas com as palavras de Jesus, “porque ensinava com autoridade e não como os escribas”. A referência à autoridade das palavras de Jesus pretende sugerir que Ele vem de Deus e traz uma proposta que tem a marca de Deus.

 Libertação – Numa encenação com um singular poder evocador, Marcos põe o “espírito mau” que domina “um homem” presente na sinagoga, a interpelar violentamente Jesus. A ação da cura do homem “com um espírito impuro” constitui “a prova” de que Jesus traz uma proposta de libertação que vem de Deus; pela ação de Jesus, Deus vem ao encontro do homem para salvá-lo de tudo aquilo que o impede de ter vida em plenitude.

 Ensinamento novo – É um ensinamento novo, que liberta e gera esperança e alegria entre todos. É a novidade do anúncio, com a proposta de conversão de vida, abandonando uma religião estéril para aderir a uma prática do amor transformante das relações humanas, no desapego, na fraternidade, na justiça e na paz.

sábado, 6 de janeiro de 2024

Magos: verdades e lendas

 

 

Evangelho – O Evangelho de Mateus (Mt 1,1) cita que Jesus foi visitado por “alguns magos”.  Descreve que eles foram guiados por uma estrela e que entregaram três presentes para o menino Jesus: ouro, incenso e mirra.  Estas são as únicas informações que temos sobre os magos; tudo o que aparece, além disso, são histórias, tradições, lendas, fábulas.  Vamos ver algumas:

 Os três reis magos – No segundo século da era cristã, as comunidades cristãs já diziam que os magos eram reis e eram em número de três. Isto em razão dos presentes recebidos por Jesus: apenas os reis presenteavam com ouro e os três presentes davam a entender que eram três pessoas.  Apareceram também os nomes dos magos: Baltazar (que significa ‘rei da luz’), Melchior (‘protetor de reis’) e Gaspar (‘vencedor de tudo’).  A única evidência histórica que existe nestes nomes é que, na Pérsia (lugar onde havia muitos magos), entre os anos 19 e 65 da era cristã, viveu um príncipe de nome Gundofarr (que apresenta alguma semelhança a Gaspar).

Mais lendas – Passaram-se mais alguns séculos e criaram a descrição física dos magos. Melquior era velho, ponderado, prudente, sisudo, de barba e cabelos longos e grisalhos; Gaspar era jovem, sem barba e louro; Baltazar era negro e totalmente barbado. A ideia da procedência persa dos magos influenciou até as roupas com que aparecem representados: chapéu redondo na cabeça, camisa curta presa por um cinturão, calças estreitas e uma capa por cima. Exatamente como os reis persas se vestiam.

Restos mortais – De acordo com uma tradição medieval, os magos teriam se reencontrado quase 50 anos depois do primeiro Natal, em Sewa, uma cidade da Turquia, aonde viriam a falecer. No ano de 474, os restos mortais dos três magos foram sepultados em Constantinopla e depois transferidos para Milão, na Itália. Em 1164 foram transferidos para a cidade de Colônia, na Alemanha, onde foi erguida a belíssima Catedral dos Reis Magos, que os guarda até hoje.

 A Lenda do Quarto Rei Mago – Uma antiga história conta que existia um quarto rei mago, que se chamava Artabam. Os quatro venderam tudo o que tinham e compraram os presentes. Artabam escolheu, como presentes, pedras preciosas: um rubi, uma esmeralda e diamantes. Quando estava a caminho de Belém, escutou gemidos de um homem – assaltado e largado à beira do caminho. Comovido, colocou-o no seu camelo, o levou a uma pousada próxima, cuidando dele até que se recuperasse. Como pagamento entregou o rubi ao dono da pousada.

 Sozinho – Procurou a trilha dos outros reis magos, mas a estrela já tinha desaparecido do céu. Continuou sozinho seu caminho, pois no fundo do coração, sabia que algum dia iria encontrar seu Rei. A certa altura da caminhada, avistou uma caravana vindo em sua direção e viu que se tratava de um comboio de escravos, que eram levados para a morte. Sentindo compaixão e amor, pegou a esmeralda e os diamantes e comprou os escravos, libertando-os em seguida.  Quando todos já haviam partido, Artabam ficou sozinho.

 Encontro – O Sol se pôs e a escuridão tomou conta do deserto. Não tinha mais presentes para oferecer, não havia mais a estrela-guia, tinha perdido o contato com seus três amigos. Nunca desistiu de encontrar o seu Rei.  Um dia, passando próximo à Jerusalém, encontrou três homens crucificados.  Um deles lhe perguntou o que procurava.  Artabam respondeu que há mais de 30 anos buscava o Rei dos Judeus.  O homem lhe disse: “Pois acaba de encontrar!”.

sábado, 18 de novembro de 2023

Os talentos

  


No Evangelho das missas deste domingo (Mt 25,14-30), Jesus apresenta a parábola dos talentos.

 Ambiente – Mais uma vez, o Evangelho apresenta-nos o tema da segunda vinda de Jesus. A catequese que Mateus apresenta neste discurso tem em conta as necessidades da sua comunidade cristã. O texto foi escrito no final do séc. I (década de 80). Os cristãos, fartos de esperar a segunda vinda de Jesus, esqueceram o seu entusiasmo inicial… Instalaram-se na mediocridade, na rotina, no comodismo, na facilidade. As perseguições que se adivinham provocam o desânimo e a deserção… Por esta razão, Mateus encoraja a todos, para que se lembrem de que a segunda vinda do Senhor acontecerá no final da história humana; e que, até lá, os crentes devem “colocar os seus talentos para render”. A parábola fala de “talentos” que um senhor distribuiu entre os servos. Um “talento” corresponde a 36 quilos de prata e ao salário de aproximadamente 3.000 dias de trabalho de um operário não qualificado.

 A “parábola dos talentos” – Conta que um “senhor” partiu em viagem e deixou a sua fortuna nas mãos dos seus servos. A um, deixou cinco talentos, a outro dois e a outro um. Quando voltou, chamou os servos e pediu-lhes contas do que haviam feito com o que tinham recebido. Os dois primeiros duplicaram a soma recebida; mas o terceiro tinha escondido cuidadosamente o talento que lhe fora confiado, pois conhecia a exigência do “senhor” e tinha medo. Os dois primeiros servos foram louvados pelo “senhor”, ao passo que o terceiro foi severamente criticado e condenado.

 O Reino – Provavelmente a parábola, tal como saiu da boca de Jesus, era uma “parábola do Reino”. O “senhor” exigente seria Deus, que reclama para Si uma lealdade a toda a prova e que não aceita meios tons e situações de acomodação e de preguiça. Os servos a quem Ele confia os valores do Reino devem acolher os seus dons e fazer com que eles rendam, a fim de que o Reino seja uma realidade. No Reino, ou se está completamente comprometido, ou não se está.

 Dons – No texto de Mateus, o “senhor” é Jesus que, antes de deixar este mundo, entregou bens consideráveis aos seus “servos” (os discípulos). Os “bens” são os dons que Deus, através de Jesus, ofereceu aos homens. Os discípulos de Jesus são os depositários desses “bens”. A questão é, portanto, esta: como devem ser utilizados estes “bens”? Eles devem dar frutos, ou devem ser cuidadosamente conservados enterrados? Os discípulos de Jesus podem – por medo, por comodismo, por desinteresse – deixar que esses “bens” fiquem infrutíferos? Na perspectiva da parábola, os “bens” que Jesus deixou aos seus discípulos têm de dar frutos.

 Comodismo – Através desta parábola, Mateus incentiva a sua comunidade a estar alerta e vigilante, sem se deixar vencer pelo comodismo e pela rotina. Esquecer os compromissos assumidos com Jesus e com o Reino, demitir-se das suas responsabilidades, deixar na gaveta os dons de Deus, aceitar passivamente que o mundo se construa de acordo com valores que não são os de Jesus, instalar-se na passividade e no comodismo é privar os irmãos, a Igreja e o mundo dos frutos a que têm direito.

 Construir – O discípulo de Jesus não pode esperar o Senhor de mãos erguidas e de olhos postos no céu, alheio aos problemas do mundo e preocupado em não se contaminar com as questões do mundo… O discípulo de Jesus espera o Senhor profundamente envolvido e empenhado no mundo, ocupado em distribuir a todos os homens, seus irmãos, os “bens” de Deus e em construir o Reino.

sábado, 4 de novembro de 2023

Quem são os santos

 


Neste domingo a Igreja comemora a Solenidade de Todos os Santos. Publicamos o comentário do Pe. Raniero Cantalamessa, pregador da Casa Pontifícia do Vaticano, sobre a liturgia de hoje.

 Comunicação – Faz tempo que os cientistas enviam sinais ao cosmos em espera de respostas por parte de seres inteligentes em algum planeta perdido. A Igreja desde sempre mantém um diálogo com os habitantes de outro mundo: os santos. É o que proclamamos ao dizer: “Creio na comunhão dos santos”. Ainda que existissem habitantes fora do sistema solar, a comunicação com eles seria impossível, porque entre a pergunta e a resposta passariam milhões de anos. Aqui, ao contrário, a resposta é imediata, porque existe um centro de comunicação e de encontro comum que é Cristo Ressuscitado.

 Embrião – Talvez também pelo momento do ano em que cai, a Solenidade de Todos os Santos tem algo especial que explica sua popularidade e as numerosas tradições ligadas a ela em alguns setores da cristandade. O motivo está no que diz João na segunda leitura. Nesta vida, “somos filhos de Deus e ainda não se manifestou o que seremos”; somos como o embrião no seio da mãe que anseia nascer. Os santos “nasceram” (a liturgia chama “dia do nascimento”, dies natalis, no dia de sua morte); contemplá-los é contemplar nosso destino. Enquanto ao nosso redor a natureza se desnuda e caem as folhas, a festa de todos os santos nos convida a olhar para o alto; e nos recorda que não estamos destinados a ficar na terra para sempre, como as folhas.

 Santos – A passagem do Evangelho é a das bem-aventuranças. Uma bem-aventurança em particular inspirou a escolha da passagem: “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados”. Os santos são aqueles que tiveram fome e sede de justiça, isto é, na linguagem bíblica, de santidade. Não se resignaram à mediocridade, não se contentaram com meias palavras.

 Unidos ou separados? – A primeira leitura da Solenidade nos ajuda a entender quem são os santos. São “os que lavaram suas vestes no sangue do Cordeiro”. A santidade se recebe de Cristo; não é uma produção própria. No Antigo Testamento, ser santos queria dizer “estar separado” de tudo o que é impuro; na acepção cristã, quer dizer o contrário, ou seja, “estar unidos”, mas a Cristo.

 Santos leigos – Os santos, isto é, os salvos, não são apenas os que o calendário ou o santoral enumeram. Existem os “santos desconhecidos”: que arriscaram suas vidas pelos irmãos, os mártires da justiça e da liberdade, ou do dever, os “santos leigos”, como alguém os chamou. Sem saber, também suas vestes foram lavadas no sangue do Cordeiro, se viveram segundo a consciência e lhes importou o bem dos irmãos.

 Louvor – Surge espontaneamente uma pergunta: o que os santos fazem no paraíso? A resposta está, também aqui, na primeira leitura: os salvos adoram, deixam suas coroas ante o trono, exclamando: “Louvor, honra, bênção, ação de graças...”. Realiza-se neles a verdadeira vocação humana, que é a de ser “louvor da glória de Deus” (Ef 1, 14). Seu coro é guiado por Maria, que no céu continua seu canto de louvor: “Minha alma proclama a grandeza do Senhor”. É neste louvor que os santos encontram sua bem-aventurança e seu gozo: “Meu espírito se alegra em Deus”. O homem é aquilo que ama e aquilo que admira. Amando e louvando a Deus, ele se une Deus, participa de sua glória e de sua própria felicidade.

 Paraíso – Um dia, um santo, São Simeão, o Novo Teólogo, teve uma experiência mística de Deus tão forte que exclamou para si: “Se o paraíso não for mais que isso, já me basta!”. Mas a voz de Cristo lhe disse: “És bem mesquinho se te contentas com isso. O gozo que experimentaste em comparação com o do paraíso é como um céu pintado no papel com relação ao verdadeiro céu”.

domingo, 29 de outubro de 2023

São Judas Tadeu

 


 Nas semanas anteriores iniciamos uma série de textos sobre os apóstolos que acompanharam Jesus durante os 30 meses de sua pregação na Terra.  Vimos quem eram os apóstolos, a missão deles e os mais próximos de Jesus.  Hoje continuaremos estudando os demais apóstolos.

 

Judas Tadeu – Existe grande divergência sobre o nome do 11º apóstolo de Cristo. A maioria dos textos antigos traz o nome Tadeu (Mc, 3,18); outros trazem Lebeu ou Lebê (Mt 10, 3); outros Judas, filho de Tiago (Lc 6,16); outros Judas, o Zelote; outros ainda Judas de Tiago. Os estudiosos admitem que dificilmente estes nomes tenham pertencido a uma só pessoa, ou seja, na época em que os Evangelhos foram escritos, não havia uma forte tradição quanto ao nome do 11º Apóstolo.

 

Os dois Tadeus – O Novo Testamento descreve duas pessoas com o nome de Judas Tadeu: o Apóstolo e o irmão (primo) de Jesus.  Existem sérias dificuldades em aceitar que se trata da mesma pessoa.

 

Judas Tadeu, primo de Jesus – Era natural de Caná da Galiléia, na Palestina. Sua família era constituída do pai, Alfeu (ou Cléofas) e a mãe, Maria Cléofas, parentes de Jesus. O pai, Alfeu, era irmão de São José e a mãe, Maria Cléofas, prima-irmã de Maria Santíssima, portanto, Judas Tadeu era primo-irmão de Jesus (confira em Mt 13,55).

 

Judas Tadeu, Apóstolo – Judas Tadeu é citado apenas uma vez no Novo Testamento (além das listas de apóstolos, como Mt 10,4). Aparece em João Jo 14,22, durante a última ceia, quando perguntou a Jesus: "Mestre, por que razão hás de manifestar-te só a nós e não ao mundo?" Jesus lhe respondeu afirmando que teria manifestação dele todo aquele que guardasse sua palavra e permanecesse fiel a seu amor.

 

Quem escreveu a Epístola de Judas? – O próprio autor se apresenta como “irmão de Tiago” (Jd 1), ou seja, pode tratar-se de Judas Tadeu, primo de Jesus, irmão de Tiago, José e Simão (confira em Mt 13,55).  A maioria dos exegetas (estudiosos da Bíblia) tem muitas dúvidas em fazer esta afirmação por diversas razões, entre elas a época em que o texto foi escrito (anos 90 do primeiro século).  Eles preferem atribuir a autoria da Epístola a um outro Judas (que não é o apóstolo, nem o primo de Jesus, nem o Iscariotes).

 

São Judas Tadeu – Na Igreja Católica, o Apóstolo Judas Tadeu, o primo de Jesus e o autor da Epístola de Judas são comemorados como a mesma pessoa.  A história do Santo diz que ele iniciou sua pregação na Galiléia, passando pela Samaria, Iduméria e outras populações judaicas. Pelo ano 50, tomou parte no primeiro Concílio, o de Jerusalém. Em seguida, foi evangelizar a Mesopotâmia, Síria, Armênia e Pérsia. Nesse país recebeu a companhia de outro apóstolo, Simão.

 

Santo e Mártir – A pregação e o testemunho de São Judas Tadeu impressionaram os pagãos que se convertiam. Isso provocou a inveja e fúria contra o apóstolo, que foi trucidado, com pauladas, lanças e machados, pelo ano 70. Dessa maneira, tornou-se mártir, ou seja, mostrou que sua adesão a Jesus era tal, que testemunhou a fé com a doação da própria vida. Os seus restos mortais, após terem sido guardados no Oriente Médio e na França, foram definitivamente transferidos para Roma, na Basílica de São Pedro.  É o santo das causas impossíveis ou dos desesperados, comemorado em 28 de outubro.

 

São Judas Tadeu em Bauru – A Paróquia de São Judas Tadeu e São Dimas em Bauru é localizada no Jardim Estoril, nos altos da cidade. A programação deste sábado (dia 28) conta com missas às 8:00 horas com o padre Reinaldo, às 11:00 horas com o bispo Dom Rubens, às 16:00 horas com o bispo emérito Dom Caetano e às 19:30 horas com o padre Reinaldo. Haverá o Terço da Misericórdia uma hora antes de cada missa. Haverá quermesse com diversas barracas durante o dia todo.

Uma ‘pegadinha’ para Jesus

  


No Evangelho das missas deste domingo, Mateus (22,15-21) descreve mais uma discussão entre Jesus e os fariseus.

 Pegadinha – Os fariseus se reuniram para criar uma maneira de surpreender Jesus. Foram até Ele e perguntaram se era correto pagar o tributo a César (o Imperador de Roma). Percebendo a malícia, Jesus pediu que lhe mostrassem a moeda. Ao apresentarem uma moeda de um denário, perguntou: “De quem é esta imagem e esta inscrição?” Ao lhe responderem que era de César, Jesus disse: “Então, dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.

 O texto – Com esse texto, entramos em um bloco de quatro unidades, que apresentam diversas controvérsias entre Jesus e lideranças judaicas diferentes: os fariseus, os herodianos e os saduceus. A discussão do trecho deste domingo talvez seja a mais conhecida, mas muitas vezes tem sido interpretada de maneira errada, projetando sobre Jesus os nossos preconceitos políticos e sociais.

Herodianos – É necessário entender que não se tratava de uma pergunta sincera feita a Jesus, mas, de uma armadilha preparada por membros de dois grupos politicamente opostos e antagônicos: os herodianos (submissos à dominação romana) e os fariseus (muitos dos quais olhavam os herodianos como impuros, pela sua colaboração com o poder estrangeiro).

 Cilada – Se Jesus respondesse que era lícito pagar o imposto, correria o risco de ser apresentado pelos fariseus como um opressor do povo. Se Ele negasse, poderia ser denunciado pelos herodianos como subversivo político. Era uma situação semelhante àquela que aparece em João 8, 1-11 (a mulher adúltera), pois qualquer resposta deixaria Jesus em maus lençóis. Como naquela ocasião, Jesus se mostrou verdadeiro Mestre, escapando da cilada e, ainda por cima, oferecendo um ensinamento importante.

A Moeda – Primeiro Ele deixa claro que entendeu a “jogada”: “Hipócritas, por que me armais uma cilada?” Depois, coloca os seus interlocutores contra a parede, pedindo uma moeda do imposto e perguntando: “De quem são esta efígie e esta inscrição?” A inscrição seria “Tibério César Filho do Divino Augusto, Sumo Pontífice” - demonstrando as pretensões de divinização do Império Romano. Com a resposta: “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”, Jesus joga para os seus ouvintes uma questão essencial: o que é que pertence a César e o que é que pertence a Deus?

 Império – A divindade pertence a Deus, não ao Império Romano nem a César. Assim, Ele evita confirmar o projeto nacionalista violento de muitos judeus da sua época e condena também qualquer projeto que divinizasse o poder civil.

 Dualismo – O texto de forma alguma justifica um dualismo entre o espiritual (de Deus) e o material (de César). Pelo contrário, mostra que o poder político, econômico e religioso deve estar a serviço do bem comum, pois, se não for assim, está roubando o que é de Deus: o seu povo. Não se pode entregar às garras de um poder opressor, seja ele estrangeiro ou nacional, o que pertence ao Pai. O poder é legítimo quando está a serviço da vida e do bem-estar comum; é ilegítimo quando está a serviço somente de uns poucos privilegiados. “Dar a Deus o que é de Deus” não se resume em rituais religiosos; refere-se à construção de uma sociedade solidária, justa e fraterna, na qual todos possam “ter a vida e a vida em abundância” (Jo 10, 10). À medida que lutamos por esse objetivo, estamos dando “a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.

sábado, 14 de outubro de 2023

Vinde ao banquete nupcial

  


No Evangelho das missas deste domingo (Mt 22,1-14), o evangelista Mateus apresenta a parábola dos convidados para o banquete nupcial: um rei que preparou um banquete nupcial para o seu filho. Mandou chamar os convidados, mas eles não quiseram vir. Chamou todas as pessoas que encontrou, maus e bons, e a sala do banquete encheu-se de convidados. Ao entrar na sala, o rei viu um homem que não estava vestido com o traje nupcial e mandou retira-lo da festa. No final conclui: “Na verdade, muitos são os chamados, mas poucos os escolhidos”.

 Publicamos o comentário do padre Raniero Cantalamessa OFM, pregador da Casa Pontifícia, ao Evangelho do próximo domingo.

 O que é importante? É instrutivo observar quais são os motivos pelos quais os convidados da parábola rejeitaram participar do banquete. O evangelista Mateus diz que eles “não fizeram caso” do convite e “se foram um para seu campo, outro para seus negócios”. O Evangelho de Lucas, sobre este ponto, é mais detalhado e apresenta assim as motivações da rejeição: “Comprei um campo e tenho de ir vê-lo... Comprei cinco juntas de bois e vou aprová-las... Casei-me, e por isso não posso ir” (Lc 14, 18-20). Que têm em comum estes personagens? Os três têm algo urgente a fazer, algo que não pode esperar, que reclama imediatamente sua presença. E que representa o banquete nupcial? Este indica os bens messiânicos, a participação na salvação trazida por Cristo, portanto a possibilidade de viver eternamente. O banquete representa, pois, o importante na vida, mais ainda, o único essencial. Está claro então em que consiste o erro cometido pelos convidados; está em deixar o importante pelo urgente, o essencial pelo contingente!

 Isto é um risco tão difundido e insidioso, não só no plano religioso, mas também no puramente humano, que vale a pena refletir sobre isso um pouco. Antes de tudo no plano religioso. Deixar o importante pelo urgente significa adiar o cumprimento dos deveres religiosos porque cada vez se apresenta algo urgente que fazer. É domingo e é hora de ir à Missa, mas tem-se que fazer aquela visita, aquele trabalho no jardim, e tem-se que preparar a comida. A liturgia dominical pode esperar, a comida não; então se adia a Missa.

 Disse que o perigo de omitir o importante pelo urgente está presente igualmente no âmbito humano, na vida de todos os dias, e queria aludir também a isto. Para um homem é certamente importante dedicar tempo à família, estar com os filhos, dialogar com eles se são maiores, brincar com eles se são pequenos. Mas no último momento se apresentam sempre coisas urgentes que despachar no escritório, extras para fazer no trabalho, e se prorroga para outra ocasião, acabando por regressar à casa demasiado tarde e demasiado cansado para pensar em outra coisa.

 Para um homem e uma mulher é uma obrigação moral ir cada tanto visitar o ancião progenitor que vive só em casa ou em uma residência. Para alguns é importante visitar um conhecido enfermo para mostrar-lhe o próprio apoio e talvez fazer-lhe algum serviço prático. Mas é urgente, se se prorroga aparentemente o mundo não cai, ou melhor ninguém se dá conta. E assim se adia.

 O mesmo se faz no cuidado da própria saúde, que também está entre as coisas importantes. O médico, ou simplesmente o físico, adverte que deve cuidar-se, tomar um período de descanso, evitar aquele tipo de estresse... Responde-se sim, sim, o farei sem falta, quando eu terminar esse trabalho, quando tiver arrumado a casa, quando tiver liquidado todas as dívidas... Até que se perceba que é tarde demais.

 Eis aqui onde está a insídia: passa-se a vida perseguindo os mil pequenos afazeres que há que despachar e não se encontra tempo para as coisas que incidem de verdade nas relações humanas e que podem dar a verdadeira alegria (e descuidam-se, a verdadeira tristeza) na vida. Assim, vemos como o Evangelho, indiretamente, é também escola de vida; ensina-nos a estabelecer prioridades, a tender ao essencial. Em uma palavra: a não perder o importante pelo urgente, como sucedeu aos convidados de nossa parábola.