Coluna "Ser Católico" – Jornal da Cidade – 28/04/2001
O novo texto – Entre os anos 80 e 90 d.C. surgiu um terceiro texto (também anônimo), que a Igreja primitiva identificou como sendo de autoria de Mateus. Foi o texto mais rapidamente reconhecido e absorvido pelas comunidades cristãs, com inúmeras citações em textos primitivos da Igreja, entre eles Papias (130 d.C.), Clemente de Roma (95 d.C.), Policarpo (150 d.C.), Hermas (120 d.C.), etc. O Evangelho de Mateus aparece como o primeiro Evangelho em nossas Bíblias porque até meados do século XX era considerado o primeiro texto (cronologicamente) escrito.
O autor – O autor deste terceiro relato sobre a vida de Cristo era um judeu letrado e profundo conhecedor das Escrituras Judaicas (livros do Antigo Testamento lidos na época). Conhecia e respeitava as tradições judaicas, mas interpelava rudemente os chefes religiosos de seu povo. Além de sua cultura e grande conhecimento da língua grega, outra característica do autor era a sua didática, sendo reconhecido como ‘um homem perito na arte de ensinar’.
Ainda o autor – A atribuição do texto ao apóstolo Mateus é duvidosa (senão impossível), pois dificilmente ele estaria vivo na época da composição deste Evangelho (entre 80 e 90 d.C.). Supondo que o apóstolo Mateus tivesse a mesma idade de Cristo, no ano 80 ele deveria estar com 87 anos, o que representa uma idade muito avançada para a época. Entre os exegetas modernos é quase unanimidade a não atribuição do 3º Evangelho ao apóstolo Mateus (Levi, ou Marcos Levi, equivalente às formas de Matias ou Matatias). É importante lembrar que o apóstolo Mateus aparece uma única vez em todos os quatro Evangelhos: no momento em que é convocado por Cristo para segui-lo (Mt 9,9 ou Mc 2,13-17 ou Lc 5, 27-32). Estava presente também na reunião dos apóstolos após a morte de Jesus (At 1,13).
Quatro razões – Os estudiosos citam quatro fundamentos que distanciam Mateus da autoria do terceiro Evangelho, todos eles relativos ao texto ser incompatível com a descrição de uma testemunha ocular dos fatos: a forma impessoal de escrever (relatos frios de fatos distantes), a sua teologia pós-apostólica, a sua dependência do texto de Marcos (não incluindo qualquer detalhe nas narrações) e, por último, as indicações topográficas e geográficas muito vagas.
A Época em que foi escrito – O texto deve ser datado entre 80 e 90 d.C. (com certeza após 80 d.C., pois o autor parece se envolver na polêmica do judaísmo sinagogal ortodoxo, manifestado em Jâmnia no ano 80 d.C.), o que faz com que vários estudiosos coloquem sua composição após 90 d.C. ou, até mesmo, após o ano 100 d.C. Outra característica que coloca o Evangelho em tempos mais tardios é o envolvimento do autor em questões polêmicas sobre Jesus, próprias do final do primeiro século, como ilegitimidade do nascimento, residência em Nazaré e não em Belém, o roubo do corpo de Jesus, etc.
O texto – Podemos afirmar que o autor (escrevendo em grego) "garimpou os fatos da vida de Jesus", pois a análise do Evangelho mostra a montagem de textos de diferentes estilos, recortados e alinhados de forma não cronológica. O texto é claramente dirigido aos judeus convertidos ao cristianismo, tendo como objetivo básico apresentar Jesus como o Messias, o Cristo descrito e profetizado no Antigo Testamento, o novo Moisés. Para isso, o autor se ampara, por inúmeras vezes, em profecias do A.T. (130 citações), algumas distorcidas ou alteradas, ou ainda compondo textos de vários profetas, para justificar palavras e atos de Jesus. Mas isto é assunto para a próxima semana ...
VOCÊ SABIA QUE ...
... o chamado "Sermão da Montanha" é uma situação fictícia criada pelo autor do Evangelho de Mateus (Cap. 5, 6 e 7) para juntar todos os discursos de Jesus proclamados nos 2 anos e 6 meses de sua pregação, como se todos os pronunciamentos do Mestre tivessem ocorrido num mesmo local e em um único discurso. Nos outros Evangelhos (inclusive Marcos, usado como fonte pelo autor de Mateus) os sermões são distribuídos em toda vida pública de Jesus. A tradição em torno das Bem-aventuranças foi tão grande na Igreja primitiva, que logo se identificou uma montanha onde teria acontecido tal sermão.
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