sábado, 2 de fevereiro de 2008

As bem-aventuranças

  

O Evangelho deste domingo proclama os “bem-aventurados” e recomenda, aos crentes, a misericórdia, a sinceridade de coração, a luta pela paz, a perseverança diante das perseguições: essas são as atitudes que correspondem ao compromisso pelo “Reino”. Enquanto que no primeiro grupo de “bem-aventuranças” se constatam situações, no segundo grupo propõem-se atitudes que os discípulos devem assumir.

 

A nova Lei – Ao longo do seu texto, Mateus apresenta cinco longos discursos, nos quais agrupa “ditos” e ensinamentos, provavelmente proferidos por Jesus em várias ocasiões e contextos. Na visão de Mateus, esses cinco discursos traziam uma nova Lei, destinada a substituir a antiga Lei dada ao Povo por meio de Moisés e escrita nos cinco livros do Pentateuco.

 

As bem-aventuranças – As “bem-aventuranças” que Mateus coloca na boca de Jesus, são consideravelmente diferentes das “bem-aventuranças” propostas por Lucas (cf. Lc 6,20-26). Mateus tem nove “bem-aventuranças”, enquanto que Lucas só apresenta quatro; além disso, Lucas prossegue com quatro “maldições”, que estão ausentes do texto mateano; outras notas características da versão de Mateus são a espiritualização (os “pobres” de Lucas são, para Mateus, os “pobres em espírito”) e a aplicação dos “ditos” originais de Jesus à vida da comunidade e ao comportamento dos cristãos. É muito provável que o texto de Lucas seja mais fiel à tradição original e que o texto de Mateus tenha sido mais trabalhado.

 

O Reino – As “bem-aventuranças” são fórmulas freqüentes na tradição bíblica e definem sempre uma alegria oferecida por Deus. Devem ser entendidas no contexto da pregação sobre o “Reino”: Jesus proclama “bem-aventurados” aqueles que estão numa situação de debilidade, de pobreza, porque Deus está a ponto de instaurar o “Reino” e a situação destes “pobres” vai mudar radicalmente; além disso, são “bem-aventurados” porque, na sua fragilidade, debilidade e dependência, estão de espírito aberto e coração disponível para acolher a proposta de salvação e libertação que Deus lhes oferece em Jesus (a proposta do “Reino”).

Os pobres – As quatro primeiras “bem-aventuranças” referidas por Mateus (vers. 3-6) dirigem-se aos “pobres” (as segunda, terceira e quarta “bem-aventuranças” são apenas desenvolvimentos da primeira, que proclama: “bem-aventurados os pobres em espírito”). Saúdam a felicidade daqueles que se entregam confiadamente nas mãos de Deus e procuram fazer sempre a sua vontade; daqueles que, de forma consciente, deixam de colocar a sua confiança e a sua esperança nos bens, no poder, no êxito, nos homens, para esperar e confiar em Deus; daqueles que aceitam renunciar ao egoísmo, que aceitam despojar-se de si próprios e estar disponíveis para Deus e para os outros.

Os “mansos” – Não são os fracos, os que suportam passivamente as injustiças, os que se conformam com as violências orquestradas pelos poderosos; mas, são aqueles que recusam a violência, que são tolerantes e pacíficos, embora sejam, muitas vezes, vítimas dos abusos e prepotências dos injustos… A sua atitude pacífica e tolerante os torna membros de pleno direito do “Reino”.

Os que choram - São aqueles que vivem na aflição, na dor, no sofrimento provocados pela injustiça, pela miséria, pelo egoísmo; a chegada do “Reino” vai fazer com que a sua triste situação se mude em consolação e alegria…

Os que têm fome e sede de justiça – Provavelmente, a justiça deve entender-se, aqui, em sentido bíblico – isto é, no sentido da fidelidade total aos compromissos assumidos para com Deus e para com os irmãos. Jesus dá-lhes a esperança de verem essa sede de fidelidade saciada, no Reino que vai chegar.

Misericordiosos e puros de coração – Os “misericordiosos” são aqueles que têm um coração capaz de compadecer-se, de amar sem limites, que se deixam tocar pelos sofrimentos e alegrias dos outros homens e mulheres, que são capazes de ir ao encontro dos irmãos e estender-lhes a mão, mesmo quando eles falharam. Os “puros de coração” são aqueles que têm um coração honesto e leal, que não pactua com a duplicidade e o engano.

Os “que constroem a paz” – São aqueles que se recusam a aceitar que a violência e a lei do mais forte dirijam as relações humanas; e são aqueles que procuram ser – às vezes com o risco da própria vida – instrumentos de reconciliação entre os homens.

Os perseguidos por causa da justiça – São aqueles que lutam pela instauração do “Reino” e são desautorizados, humilhados, agredidos, marginalizados por parte daqueles que praticam a injustiça, que fomentam a opressão, que constroem a morte… Jesus garante-lhes: o mal não poderá vencer; e, no final do caminho, espera o triunfo, a vida plena.

Os perseguidos por causa de Jesus – Na última “bem-aventurança” (vers. 11), o evangelista dirige-se, em jeito de exortação, aos membros da sua comunidade que têm a experiência de serem perseguidos por causa de Jesus e convida-os a resistir ao sofrimento e à adversidade. Esta última exortação é, na prática, uma aplicação concreta da oitava “bem-aventurança”.

No seu conjunto, as “bem-aventuranças” deixam uma mensagem de esperança e de alento para os pobres e débeis. Anunciam que Deus os ama e que está do lado deles; confirmam que a libertação está para chegar e que a sua situação vai mudar; asseguram que eles vivem já na dinâmica desse “Reino” onde vão encontrar a felicidade e a vida plena.

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