A Solenidade da Epifania do Senhor, a
liturgia apresenta-nos a visita dos Magos ao menino de Belém. Trata-se de um
episódio que, ao longo dos séculos, tem provocado um impacto considerável nos
sonhos e nas fantasias dos cristãos... No entanto, não estamos diante de uma
reportagem jornalística que faz a cobertura da visita oficial de três chefes de
Estado a outro país; estamos diante de uma catequese sobre Jesus, destinada a
apresentá-lO como o salvador/libertador de todos os homens.
Catequese
–
Os numerosos detalhes do relato demonstram, claramente, que o propósito de
Mateus não é de tipo histórico, mas catequético. Notemos, em primeiro lugar, a
insistência de Mateus no fato de Jesus ter nascido em Belém de Judá (Mt
2,1.5.6.7). Para entender esta insistência temos de recordar que Belém era a
terra natal do rei David. Afirmar que Jesus nasceu em Belém é ligá-l'O a esses
anúncios proféticos que falavam do Messias como o descendente de David que
havia de nascer em Belém (Miq 5,1.3; 2Sam 5,2) e restaurar o reino ideal de seu
pai. Com esta nota, Mateus quer aquietar aqueles que pensavam que Jesus tinha
nascido em Nazaré e que viam nisso um obstáculo para O reconhecerem como
Messias.
Estrela
–
Notemos, em segundo lugar, a referência a uma estrela "especial" que
apareceu no céu por esta altura e que conduziu os "Magos" para Belém.
A interpretação desta referência como indicação histórica levou alguém a
cálculos astronômicos complicados para concluir que, no ano 6 a.C., uma
conjunção de planetas explicaria o fenômeno luminoso da estrela refulgente
mencionada por Mateus; outros andaram à procura do cometa que, por esta época,
devia ter sulcado os céus do Médio Oriente ... Na realidade, não podemos
entender esta referência como histórica, mas antes como catequese sobre Jesus.
Segundo a crença popular, o nascimento de um personagem importante era
acompanhado da aparição de uma nova estrela. Também a tradição judaica
anunciava o Messias como a estrela que surge de Jacob (Nm 24,17). É com estes
elementos que a imaginação de Mateus, posta a serviço da catequese, vai
inventar a "estrela". Mateus está, sobretudo, interessado em fornecer
aos cristãos da sua comunidade argumentos seguros para rebater aqueles que
negavam que Jesus era o Messias esperado.
Magos
–
Temos, ainda, as figuras dos "Magos". A palavra grega
"mágos", usada por Mateus, abarca um vasto leque de significados e é
aplicada a personagens muito diferentes: mágicos, feiticeiros, charlatães,
sacerdotes persas, propagandistas religiosos ... Aqui, poderia designar
astrólogos mesopotâmios, entrados em contato com o messianismo judaico. Seja como
for, esses "Magos" representam, na catequese de Mateus, esses povos
estrangeiros de que falava a primeira leitura (Is 60,1-6), que se põem a
caminho de Jerusalém com as suas riquezas (ouro e incenso) para encontrar a luz
salvadora de Deus que brilha sobre a cidade. Na opinião de Mateus e da
catequese da Igreja primitiva, Jesus é essa luz.
Reconhecimento
–
Além de uma catequese sobre Jesus, este relato recolhe, de forma paradigmática,
duas atitudes que se vão repetir ao longo de todo o Evangelho: o povo de Israel
rejeita Jesus, enquanto que os "Magos" do oriente (que são pagãos) O
adoram; Herodes e Jerusalém "ficam perturbados" diante da notícia do
nascimento de Jesus e planeiam a sua morte, enquanto que os pagãos sentem uma
grande alegria e reconhecem-n'O como o seu Senhor.
Caminho
–
Mateus anuncia, aqui, que Jesus vai ser rejeitado pelo seu povo; mas vai ser
acolhido pelos pagãos, que passarão a tomar parte do novo Povo de Deus. O
itinerário seguido pelos "Magos" reflete o processo que os pagãos
seguiram para encontrar Jesus: estão atentos aos sinais (estrela), percebem que
Jesus traz a salvação, põem-se decididamente a caminho para O encontrar,
perguntam aos judeus – que conhecem as Escrituras – o que fazer, encontram
Jesus e adoram-n'O. É muito possível que um grande número de pagãos-cristãos da
comunidade de Mateus descobrisse neste relato as etapas do seu próprio caminho
em direção a Jesus.
Refletindo – Em primeiro
lugar, meditemos nas atitudes dos personagens criados por Mateus. Diante de
Jesus, eles assumem atitudes diversas que vão desde a adoração (os
"Magos") até à rejeição total (Herodes), passando pela indiferença
(os sacerdotes e os escribas). Identificamo-nos com algum destes grupos? Os
"Magos" são apresentados como os "homens dos sinais", que
sabem ver na "estrela" o sinal da chegada da libertação. Somos
pessoas atentas aos "sinais" - isto é, somos capazes de ler os
acontecimentos da nossa vida à luz de Deus? Procuramos perceber nos
"sinais" a vontade de Deus?
Procurar – Somos capazes
da mesma atitude dos Magos (deixaram tudo para procurar Jesus), ou estamos
demasiado agarrados ao nosso sofá, ao nosso colchão, à nossa televisão, à nossa
aparelhagem, à nossa internet? Os "Magos" representam os homens de
todo o mundo que vão ao encontro de Cristo e que se prostram diante d'Ele. É a
imagem da Igreja, essa família de irmãos, constituída por gente de muitas cores
e raças, que aderem a Jesus e que O reconhecem como "o Senhor".
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