Uma das críticas feitas ao filme
“Paixão de Cristo” é que Pilatos é retratado como uma pessoa fraca e indecisa.
De acordo com estudiosos, porém, Pilatos era um Governador enérgico, romano até
a medula e com uma idéia fixa: a fidelidade ao imperador.
Fraco?
– De acordo com Marta Sordi (professora de História grega e
romana, por 25 anos, na Universidade Católica de Milão e pesquisadora das
relações entre cristianismo e império romano),
Pôncio
Pilatos não era um tipo indeciso, "Era um governador enérgico". Para
Giuseppe Ricciotti (escritor do livro Vida de Jesus Cristo), Pilatos era
"briguento" e "obstinado". Enfim, era um tipo duro, romano
ao extremo; um funcionário que tinha por ideal a fidelidade ao imperador e que
pecou por excesso de zelo: em 36, seis anos depois da morte de Cristo,
expulsou, com energia, uma multidão de samaritanos para o monte Garizim.
Saindo da
história
- Os samaritanos, que eram inimigos dos judeus e aliados dos romanos,
recorreram a Tibério. E o pobre Pilatos foi chamado de volta a Roma. Desde
então, saiu da história e sua figura foi remodelada por lendas. Tornou-se, para
muitos, o homem que urdiu a condenação de Jesus Cristo à morte, o que é um
erro: o Sinédrio decretou a morte do Messias. Como não era possível aos judeus,
condenar alguém à pena capital, a última palavra cabia a Roma, por isso
recorreram a Pilatos. Eis por que ele entrou na história: a condenação,
decidida por razões religiosas, foi mascarada com as cores da política e Jesus
foi apresentado como um perigoso agitador político.
Duelo – Para
conseguir o que queriam, os judeus usaram uma tática arriscada, mas vitoriosa,
levada em frente à base da chantagem: Pilatos algumas vezes já havia provocado
os judeus, mostrando os símbolos da dominação romana e os judeus haviam reagido
recorrendo a Tibério. O próprio evangelho de Lucas, no capítulo treze, fala de
outra intervenção de Pilatos, contra os galileus, que terminou com um banho de
sangue. Enfim, os sumos sacerdotes e seus ilustres padrinhos sabiam como
atingir o Governador: o imperador Tibério.
Superarma
- A
"superarma" (a chantagem), porém, só foi mostrada no final de um
extenuante duelo. Pilatos tinha o sentimento do Direito e sua função era fazer
respeitar a lei; além disso, nutria por aqueles chefes do judaísmo um sentimento
de desprezo e de confronto e via aí, portanto, uma ótima ocasião para
contradizê-los em nome da lei. Enfim, tinha boas razões para absolver o acusado
e aplicar um golpe nos chefes do povo, que não suportava. Viu naquele momento
uma oportunidade de dar uma lição naquelas pessoas.
Diálogo com
Jesus
- "Tu és o rei dos judeus?", "Dizes isso por ti mesmo ou
foram outros que te disseram a meu respeito?", "O que fizeste?",
"O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, meus
servidores teriam lutado para que eu não fosse entregue aos judeus. O meu reino
não é daqui". Um diálogo breve, mas suficiente para compreender que o
Messias não era, de fato, um subversivo; a sua pregação podia até desarmar as
mensagens de violência que sempre estavam presentes no meio da Palestina. No
máximo, pensou que tinha diante de si um visionário: "Todo aquele que é
da verdade escuta a minha voz". "O que é a verdade?",
perguntou. E a tentativa de abrir o diálogo se defrontou com o clamoroso
silêncio de Cristo, que havia preenchido todo o cenário com a sua presença.
"Não me respondes, não vês de quantas coisas estás sendo acusado?".
Jesus tinha se calado, porque a verdade fala sem precisar de palavras e não
necessita de didática nem de observações.
Cartas - Antes de
perder a “partida”, Pilatos apostou pelo menos em três “cartas”. Primeiro,
enviou o prisioneiro a Herodes Antipas, o rei de um Estado fantoche. Pilatos
tentou, assim, reaproximar-se do Tetrarca, com quem estava meio estremecido.
Além disso, como pessoa prática e experiente, estava convencido de que seria
fácil acabar com o “caso Jesus”. Alcançou o primeiro objetivo, tornando-se bom
amigo do tirano; mas fracassou quanto ao segundo. Herodes mandou Jesus de
volta. A esta altura, Pilatos, sempre se equilibrando entre as exigências da
política e as razões da justiça, tentou uma segunda saída: "Portanto,
depois de castigá-lo – comunicou – vou colocá-lo em liberdade".
O
"prêmio de consolação" – Segundo Ricciotti, o verdadeiro erro
dialético dessa conclusão está nesse “portanto”. Se nem Pilatos nem
Herodes tinham encontrado culpa alguma, nem nada que justificasse condená-lo à
morte, como justificar esse “portanto”’? Prometendo o “prêmio de
consolação” do flagelo, punição terrível, que em geral terminava com a morte,
Pilatos dava mais um passo em falso. E apressou o tombo com a promessa de
libertar um prisioneiro, pedindo que o povo escolhesse entre Jesus e Barrabás.
A previsão de que Jesus seria o escolhido demonstra que ele tinha pouco
conhecimento da nação que governava, bem como dos guias espirituais do povo. A
ideia de colocar nas ruas o terrorista Barrabás tornou-se uma faca de dois
gumes.
Golpe fatal
- E
os acusadores foram para o golpe fatal: "Se soltas (Jesus) não
és amigo de César. Quem quer que se faça rei, opõe-se a César". Diante
desse argumento, Pilatos, homem de carne e osso, magistrado romano despido de
qualquer preocupação religiosa, cioso apenas da sua posição em Roma e da sua
carreira política, não podia mais permanecer titubeante. Foi tomado pelo medo
de ser driblado mais uma vez e ter de ouvir uma repreensão do próprio Tibério.
Os inimigos de Jesus contra-atacaram: "Crucifica-o, crucifica-o".
"Crucificar o vosso rei?". "Só temos um rei, que é
César". Era o fim. Pilatos viu que não havia saída. O povo e seus mais
ilustres representantes proclamavam só reconhecer como único e exclusivo rei, o
César de Roma: evidentemente, o representante de César em Roma não podia
expressar um parecer diverso desse e também, para não ferir os sentimentos
religiosos dos acusadores, tinha de mandar crucificar aquele falso rei.
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