sexta-feira, 31 de julho de 2015

Eu sou o pão da Vida


A história contada no Evangelho das missas deste domingo (Jo 6, 24-35) acontece logo após a multiplicação dos pães. Durante a noite, junto com os apóstolos, Jesus foi com os discípulos para a cidade de Cafarnaum (centro de toda ação evangelizadora de Jesus) e, ao amanhecer, vendo que Jesus tinha se retirado, a multidão foi a Sua procura. Jesus advertiu-os: “estais me procurando não porque vistes sinais, mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos. Esforçai-vos não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna, e que o Filho do Homem vos dará". Então pediram: "Senhor, dá-nos sempre desse pão". Jesus lhes disse: "Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim não terá mais fome e quem crê em mim nunca mais terá sede".

Sinais – O sexto capítulo de João é talvez o capítulo mais denso em conteúdo, de todo o Novo Testamento, pois contêm elementos do ensinamento eucarístico de João (no relato da Ceia ele nem menciona a sua instituição), que nele desenvolve um raciocínio sobre a pessoa e missão de Jesus e as implicações de segui-Lo. No trecho deste domingo, Jesus adverte que muitos o procuravam por causa dos seus milagres e não para assumir o seu projeto de vida ou para segui-lo na doação até a morte. Uma observação que pode valer para muitas expressões religiosas da atualidade e para todas as igrejas cristãs que buscam o “milagroso” e a prosperidade individual, ao invés de buscar o seguimento diário de Jesus, na construção de um mundo onde todos tenham vida “e a vida plenamente" (Jo 11,10).

Espiritual ou material – Diante desse interesse das multidões, Jesus ensina que devem trabalhar pelo alimento que não se estraga. Embora, à primeira vista, possa parecer que esse versículo apresente o seguimento de Jesus como algo somente “espiritual”, sem conseqüências maiores para a sociedade e o mundo atual, uma leitura mais atenta e profunda, faz perceber que esse é um grande engano: longe de pregar uma mensagem que resulte no abandono dos pobres e marginalizados, Jesus contesta os que têm por objetivo acumular bens. De novo, uma advertência mais do que atual para nossa sociedade, que prega como garantia de felicidade: consumir e amontoar riquezas. Isso, no entanto, só gera exclusão dos que não podem produzir nem consumir, quando deveríamos buscar equilíbrio nas nossas vidas, de maneira que os meios materiais fossem usados para construir uma sociedade digna para todos e não para a acumulação de poucos.

Teoria da prosperidade – O texto é um alerta atualíssimo para todas as igrejas que pregam a "teologia de retribuição e prosperidade individual": a busca desenfreada de bens coloca o bem-estar material como centro e finalidade de vida – uma verdadeira idolatria. Isso foi compreendido mais de duzentos anos antes de Jesus, pelo sábio autor de Eclesiastes, que escreveu: "Quem gosta de dinheiro nunca se sacia de dinheiro. Quem é apagado às riquezas, nunca se farta com a renda. Isso também é fugaz!" (Ecl 5,9).

Qual a mensagem? – É de buscar, em primeiro lugar, o Pão descido do Céu, ou seja, o próprio Jesus. Procurar Jesus implica uma opção pela sua pessoa, mensagem e prática. Não é possível ter uma relação verdadeira com Jesus, sem assumir a sua prática, atualizada para as condições de hoje. Num âmbito religioso em que, muitas vezes, prega-se um Jesus "light", alienado e alienante, que não incomoda, este texto nos leva ao Jesus real, que incomodava tanto que é abandonado pelas multidões (como se vê ao final do capítulo 6) e, finalmente, liquidado por uma conspiração dos poderes políticos, religiosos, econômicos e judiciais.

Fome? – O texto nos assegura que quem vai a Jesus como discípulo "nunca mais terá fome, nunca mais terá sede", pois, apesar de não ser fácil segui-Lo, essa adesão é capaz de saciar os desejos mais íntimos da pessoa humana, algo muito maior do que a simples posse de bens materiais é capaz de promover. Nós vivemos um tempo em que talvez nunca tenha havido tanta riqueza nem tanta pobreza, tanta acumulação e tanta exclusão. Será que, com honestidade, podemos dizer que este modelo globalizado, neoliberal e pós-moderno têm melhorado a qualidade de vida da maioria das pessoas?


Que fé nós temos? – O texto de hoje nos desafia a reexaminar a nossa fé, a realidade do nosso seguimento a Jesus, as nossas motivações, metas e objetivos de vida. Convida-nos a colocar, no centro da nossa existência, o projeto de Deus, encarnado em Jesus e continuado nos seus seguidores. Convida-nos, também a nos alimentarmos com o Pão da Palavra e da Eucaristia, para termos a vontade e a força de criar um mundo de vida, no qual todos tenham vida em plenitude.

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