No Evangelho deste domingo (Marcos 9, 30-37), Jesus termina
a sua viagem pela Galiléia e chega a Cafarnaum. Estamos em agosto do ano 29.
Jesus estava chegando de uma longa viagem de vários meses: saiu da região das
cidades de Tiro e Sidom, atravessou a Fenícia, passou próximo da cidade de
Cesaréia de Felipe e, finalmente, chegou a Cafarnaum.
Primeiro e
último – Sabendo o que os
discípulos haviam discutido durante a viagem, Jesus sentou-se, chamou os doze e
lhes disse: "Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e
aquele que serve a todos!" Em seguida, pegou uma criança, colocou-a no meio
deles e, abraçando-a, disse: "Quem acolher, em meu nome, uma destas
crianças, é a mim que estará acolhendo. E quem me acolher está acolhendo não a
mim, mas àquele que me enviou".
Uma questão – Será que, com estas palavras, Jesus
condena o desejo de sobressair, de fazer grandes coisas na vida, de dar o
melhor de si, e privilegia, ao contrário, a apatia, o espírito de abandono, os
negligentes?
Nietzsche – Assim pensava o filósofo Nietzsche,
que se sentiu no dever de combater ferozmente o cristianismo por ter (em sua
opinião) introduzido, no mundo, o “câncer” da humildade e da renúncia. Em sua
obra “Assim falava
Zaratustra”, ele opõe a este valor
evangélico o da “vontade de poder”, encarnado pelo “super-homem”, o homem da
“grande saúde”, que quer levantar-se, não abaixar-se.
Ser o primeiro
– Pode ser que os
cristãos, às vezes, tenham interpretado mal o pensamento de Jesus e tenham dado
ocasião a este mal-entendido. Mas, certamente, não é isso o que o Evangelho
quer nos dizer. “Se alguém quiser ser o primeiro...” indica que é
possível querer ser o primeiro, não está proibido, não é pecado. Jesus não só não
proíbe o desejo de querer ser o primeiro, mas, o estimula.
Ser o último – Só que revela uma via nova e
diferente para realizá-lo: não à custa dos outros, mas a favor dos outros. De
fato, acrescenta: “... seja o último de todos e o servidor de todos”. Mas,
quais são os frutos de uma ou outra forma de sobressair? A ânsia de poder
conduz a uma situação na qual a pessoa se impõe e os outros servem; e a pessoa
é “feliz”, enquanto os outros são infelizes; só se sente vencedor com todos os outros
derrotados e se domina, com os outros dominados.
Guerras? – Sabemos os resultados alcançados
com o “ideal do super-homem” alardeado por Hitler. Aliás, não se trata só do
nazismo: quase todos os males da humanidade provêm dessa raiz. Na segunda leitura
deste domingo, Tiago propõe a angustiosa e perene pergunta: “De onde procedem
as guerras?”. Jesus, no Evangelho, nos dá a resposta: do desejo de dominar! Domínio
de um povo sobre outro, de uma raça sobre outra, de um partido sobre os outros,
de um sexo sobre o outro, de uma religião sobre a outra...
Serviço – No serviço, ao contrário, todos
se beneficiam da grandeza das pessoas. Quem é grande no serviço, se torna grande
e torna os outros grandes também; mais que elevar-se acima dos outros, eleva os
demais consigo. É o caso de Madre Teresa de Calcutá, Raoul Follereau e todos os
que diariamente servem à causa dos pobres e dos feridos das guerras, frequentemente
arriscando sua própria vida.
Dúvida – Resta somente uma dúvida. O que
pensar do antagonismo no esporte e da concorrência no comércio? Também estas
coisas estão condenadas pela palavra de Cristo? Não; quando estão contidas
dentro de limites da concorrência esportiva e comercial, estas coisas são boas,
servem para aumentar o nível das possibilidades físicas e para abaixar os
preços no comércio...
Esporte – O convite de Jesus, a ser o
último, não se aplica, certamente, às corridas ciclísticas ou às de Fórmula 1! Mas,
especialmente o esporte, serve para esclarecer o limite desta grandeza em
relação ao serviço: “Nas corridas do estádio, todos correm, mas um só recebe o
prêmio”, diz São Paulo (1Cor 9,24). Basta recordar o que ocorre no término de
uma final de 100 metros rasos: o vencedor exulta, é rodeado de fotógrafos e
levado triunfalmente; todos os outros se afastam tristes e humilhados. “Todos
correm, mas um só recebe o prêmio.”
Nova Corrida – São Paulo extrai das competições
atléticas um ensinamento positivo: “Os atletas se privam de tudo; e isso por
uma coroa corruptível!; Nós, ao contrário [para receber de Deus a], coroa
incorruptível [da vida eterna]”. Luz verde, portanto, à nova corrida inventada
por Cristo, na qual o primeiro é quem se torna último de todos e servo de
todos.
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