quarta-feira, 23 de janeiro de 2002

Que língua falava Jesus?

            Os evangelistas transmitiram poucos testemunhos sobre a língua original falada por Jesus, mas apenas uma ou outra palavra que tenha ficado profundamente registrada na memória dos apóstolos.

Três expressões – Marcos, discípulo e intérprete de Pedro, registrou três expressões de Jesus: “Talitha qûm” (menina eu te mando, levanta-te – 5,41), que é a palavra carregada de poder, dita à jovem filha de Jairo, morta há pouco, e a quem Jesus chama de volta à vida; “Ephpheta” (abre-te – 7,34), que é a palavra dita ao surdo-mudo a quem Jesus fez ouvir e falar; “Abba” (Pai –14,36) que é a invocação filial com a qual se dirige a Deus, revelando sua intimidade de filho e a proximidade do pai. 

Aramaico – As palavras acima (veja também a oração de Jesus na cruz: Elol, Eloí lemá sabachtaní?” citada por Mateus 27,46 e Marcos 15,34) estão na língua aramaica; por isso, somos levados a crer que a língua normalmente falada por Jesus era o aramaico. Além do mais, o quadro histórico que se pode fazer da época em que Jesus viveu, nos faz chegar à mesma conclusão, visto que os hebreus do século I, na Palestina, falavam o aramaico em suas variantes dialetais judaicas ou galilaicas. 

Outras duas línguas – De acordo com o contexto histórico em que Jesus viveu, devemos mencionar outras duas línguas com as quais ele devia ter certa familiaridade: a dos textos sagrados, isto é, o hebraico, e a das relações mais genéricas, o grego.  O grego também permitia que os hebreus provenientes das mais diversas partes do mundo helenístico e do império Romano se comunicassem entre si. Era difundido não só no Império Romano do Oriente como no do Ocidente e na própria capital, Roma. Se Roma e seus administradores adotavam o latim como língua oficial, o mesmo não ocorria no Oriente, onde só os funcionários administrativos o empregavam, jamais o povo.  O hebraico, embora já não fosse falado na época de Jesus, continuava a ser a língua dos textos sagrados lidos nas sinagogas aos sábados e era também a língua erudita dos sábios de alguns grupos religiosos. 

Hebraico – Supõe-se que Jesus, depois do bar-mitzva — isto é, depois dos treze anos — quando adolescente, não podendo seguir uma escola rabínica, como Paulo (At 22,3), tenha freqüentado a escola anexa à sinagoga e aprendido a ler a Escritura, a declamá-la, traduzi-la e comentá-la. O episódio da sinagoga de Nazaré como nos relata Lucas 4,16 (“Foi a Nazaré, onde se tinha criado, e entrou na sinagoga, segundo o seu costume, em dia de sábado, e levantou-se para fazer a leitura”); o fato de Jesus com freqüência ensinar nas sinagogas durante sua vida pública; o próprio título de rabi atribuído a ele não só pelos discípulos, mas também pelo povo e até pelos escribas — tudo isso nos leva a crer que conhecesse o hebraico clássico, a língua dos textos sagrados com a qual se proclamava a palavra de Deus nas sinagogas, antes de ser traduzida para os fiéis. 

Grego – Já o grego (Koiné) era um idioma muito difundido, falado tanto pelos hebreus da diáspora, que não conheciam mais o aramaico, quanto pelos povos de cultura helenística, como os habitantes da Fenícia e da Decápole; era a língua de intercâmbio entre as populações regionais presente em quase todas as moedas e inscrições. Era a língua das cortes de Filipe e de Herodes Antipas.  É provável que Jesus conhecesse um pouco de grego, tanto quanto se aprende quando uma língua é relativamente generalizada no local em que se vive. Segundo os evangelistas, no interrogatório ao qual foi submetido Jesus, Pilatos inquiriu-o diretamente: “Tu és o Rei dos Judeus? Jesus disse-lhe: Tu o dizes” (Mateus 27,11). Do extenso diálogo relatado por João (18,33-38), infere-se que Jesus tenha respondido às perguntas do procurador que falava grego, sem auxílio de intérprete. 

Portanto ... – Podemos dizer que Jesus falava o aramaico no seu dia-a-dia, para conversar, pregar e ensinar as pessoas. Usava o hebraico (língua de seus antepassados) na leitura e ensinamento dos textos sagrados nas sinagogas.  Deveria também falar o grego, pela cultura da região onde vivia.

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