O texto –
Em seguida Jesus dialoga com três homens (candidatos a discípulos): o primeiro
diz que está pronto para seguir Jesus e recebe a resposta: “As raposas têm as
suas tocas e os pássaros, os seus ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde
descansar”. Para o segundo, Jesus diz: “Venha comigo”, e recebe a resposta: “Senhor,
primeiro deixe que eu volte e sepulte o meu pai”, e Jesus lhe responde: “Deixe
que os mortos sepultem os seus mortos”. O terceiro homem diz: “Eu seguirei o
senhor, mas primeiro deixe que eu vá me despedir da minha família”, e Jesus lhe
responde: “Quem começa a arar a terra e olha para trás não serve para o Reino de
Deus”.
O 4º Mandamento –
O rabino americano Jacob Neusner escreveu um livro (“Um Rabino fala com Jesus”)
no qual se imagina entre os presentes quando Jesus falava à multidão. Neusner
explica por que, apesar de sua grande admiração pelo Mestre de Nazaré, não
teria podido ser seu discípulo. Um dos motivos é precisamente a postura de
Jesus com relação aos seus familiares. Em várias ocasiões, afirma o rabino, Ele
parece convidar a transgredir o Quarto Mandamento (Honrarás teu pai e tua mãe).
No texto deste domingo, Jesus pede ao homem para renunciar a ir sepultar o
próprio pai e em outro lugar diz que quem ama o pai ou a mãe mais que Ele, não
é digno d’Ele.
O Papa –
Bento XVI, em seu livro “Jesus de Nazaré” (publicado em abril de 2007), dá uma
resposta profunda e iluminadora a esta objeção que não é só do rabino Neusner,
mas também de muitos leitores cristãos do Evangelho. Ele usa as próprias palavras
de Jesus em Mt 12, 49-50: ao ser anunciada a visita de seus parentes, Ele
respondeu: “Quem é minha mãe e quem são meus irmãos?... Todo o que cumpre a
vontade de meu Pai celestial, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”.
Nova família –
Jesus não quer com isso eliminar a família natural, mas revela uma nova família
na qual Deus é Pai e os homens e as mulheres são todos irmãos e irmãs, graças à
comum fé n’Ele, o Cristo. Mas Jesus tinha o direito e o poder de fazer isso? –
perguntam os leitores (e certamente o rabino Neusner).
Substituindo a Torá –
Esta família espiritual já existia: era o povo de Israel unido pela observância
da Torá (lei fundamental do povo judeu, instituída por Moisés, composta pelo
Pentateuco ou os cinco primeiros livros do Antigo Testamento). A única condição
para um filho de judeu deixar a casa paterna era para estudar a Torá. Mas Jesus
não diz: “Quem ama seu pai ou sua mãe mais que a Torá, não é digno da Torá”.
Diz: “Quem ama seu pai ou sua mãe mais que a mim, não é digno de mim”. Põe a si
mesmo no lugar da Torá e isso pode ser feito só por quem é superior à Torá e
superior a Moisés, que a promulgou.
Jesus Deus –
O rabino judeu Neusner aprofunda a discussão, com a seguinte afirmação: “Só
Deus pode exigir de mim o que Jesus está pedindo”. Para esta indagação, o Papa também
responde: A discussão sobre Jesus e os vínculos de parentesco (como aquela
sobre Jesus e a observância do sábado) nos leva ao verdadeiro núcleo da questão,
que é saber quem é Jesus. Se um cristão não crê que Jesus atua com a própria autoridade
de Deus e que Ele mesmo é Deus, então há mais coerência na postura do rabino judeu
que rejeita segui-lo. Não se pode aceitar o ensinamento de Jesus se não se
aceita também sua pessoa.
Família –
Tiremos também um ensinamento prático do debate. A “Família de Deus”, que é a
Igreja, não só não está contra a família natural, mas é sua garantia e
promotora. Nós o vemos hoje. É uma pena que algumas divergências de opiniões no
seio da sociedade atual sobre questões ligadas ao matrimônio e à família impeçam
muitos de reconhecer a obra providencial da Igreja a favor da família, e que a
deixe freqüentemente sozinha nesta batalha decisiva para o futuro da humanidade.