sábado, 9 de novembro de 2013

Filhos da ressurreição

No Evangelho deste domingo (Lc 20,27-38), Jesus discute com os saduceus sobre a ressurreição.

A questão – Jesus é procurado por um grupo de saduceus, que lhe propõe a seguinte questão: uma mulher casou, sucessivamente, com sete irmãos, cumprindo a lei do levirato (Dt 25,5-10). Quando ressuscitarem, ela será mulher de qual dos irmãos?

Os saduceus – No tempo de Jesus, os saduceus formavam um grupo aristocrático, recrutado sobretudo entre os sacerdotes da classe superior. Exerciam a sua autoridade à volta do Templo e dominavam o Sinédrio (realmente seriam eles os responsáveis pela condenação de Jesus). A sua importância política era real, ainda que muito limitada pela presença do procurador romano. Politicamente, eram conservadores e entendiam-se bem com o opressor romano… Pretendiam manter a situação, para não ver comprometidos os benefícios políticos, sociais e econômicos de que desfrutavam.

Mais saduceus – Para os saduceus, apenas interessava a Lei escrita – a “Torah”. Negavam que a Lei oral (aceita pelos fariseus) tivesse qualquer valor. Este apego conservador à Lei escrita explica que negassem algumas crenças e doutrinas admitidas nos ambientes populares frequentados pelos fariseus. Por isso, não aceitavam a ressurreição dos mortos: nenhum versículo da “Torah” apoiava essa crença.

Casamento levítico – O Livro de Deuteronômio (Dt 25,5-6) diz: “Quando dois irmãos moram juntos e um deles morre sem deixar filhos, a viúva não sairá da casa para casar-se com nenhum estranho; seu cunhado se casará com ela, cumprindo o dever de cunhado. O primogênito que nascer receberá o nome do irmão morto, para que o nome deste não se apague em Israel”. Certamente, uma lei que para nós parece no mínimo estranha! Mas, na época, antes da fé na ressurreição, era de suma importância para Israel que o nome de um homem se propagasse nos seus filhos. Por isso, era dever do irmão sobrevivente suscitar um filho para o falecido, para que este não morresse na memória do seu povo.

Questão – A questão central do nosso texto gira em torno da ressurreição, um tema que não significava nada para os saduceus. Com o objetivo de ridicularizar a crença em ressurreição, os saduceus apresentaram a Jesus a questão hipotética da mulher que se casou, sucessivamente, com sete irmãos, cumprindo a lei do levirato. Quando ressuscitarem, ela será mulher de qual dos irmãos?

Ressurreição – A primeira parte da resposta de Jesus afirma que a ressurreição não é (como pensavam os fariseus do tempo) uma simples continuação da vida que vivemos neste mundo (como uma revivificação, ideia apresentada na primeira leitura da missa), mas uma vida nova e distinta, uma vida de plenitude que dificilmente podemos entender, baseados somente em nossas realidades quotidianas. Nessa nova vida não haverá casamento (são semelhantes aos anjos), pois a única preocupação será servir e louvar a Deus.

Vida nova – O poder de Deus, que chama os homens da morte à vida, transforma e assume a totalidade do ser humano, de forma que nascemos para uma vida totalmente nova e em que as nossas potencialidades serão elevadas à plenitude. A nossa capacidade de compreensão deste mistério é limitada, pois estamos contemplando as coisas e classificando-as à luz das nossas realidades terrenas; no entanto, a ressurreição que nos espera ultrapassa totalmente a nossa realidade terrena.


Certeza da ressurreição – A segunda parte da resposta de Jesus é uma afirmação da certeza da ressurreição. Jesus cita-lhes a “Torah” (Ex 3,6): no episódio da sarça-ardente, Jahwéh revelou-se a Moisés como “o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob”… Ora, se Deus Se apresenta dessa forma – muitos anos depois de Abraão, Isaac e Jacob terem desaparecido deste mundo – isso quer dizer que os patriarcas não estão mortos (um homem “morto” – ou seja, um homem reduzido ao estado de uma sombra inconsciente e privada de vida, no “sheol”, segundo a ideia semita corrente – tinha perdido a proteção de Deus, pois já não existia como homem vivo e consciente). Na perspectiva de Jesus, portanto, os patriarcas não estão reduzidos ao estado de sombras, na obscuridade absoluta do “sheol”, mas vivem atualmente em Deus. Conclusão: se Abraão, Isaac e Jacob estão vivos, podemos falar em ressurreição. 

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