O Evangelho
das missas deste domingo (Mt 18,15-20) sugere-nos uma reflexão sobre a nossa
responsabilidade face aos irmãos que nos rodeiam. Publicamos o comentário do
padre Raniero Cantalamessa, pregador da Casa Pontifícia do Vaticano, sobre os
versículos 15 a 18.
Texto – “Naquele tempo, Jesus disse a seus discípulos: ‘Se o seu irmão pecar, vá
e mostre o erro dele, mas em particular, só entre vocês dois. Se ele der
ouvidos, você terá ganho o seu irmão. Se ele não lhe der ouvidos, tome com você
mais uma ou duas pessoas, para que toda a questão seja decidida sob a palavra de
duas ou três testemunhas. Caso ele não dê ouvidos, comunique à Igreja. Se nem
mesmo à Igreja ele der ouvidos, seja tratado como se fosse um pagão ou um
cobrador de impostos. Eu lhes garanto: tudo o que vocês ligarem na terra, será
ligado no céu, e tudo o que vocês desligarem na terra, será desligado no céu’.
Irmão – A convivência humana está permeada de contrastes, conflitos, pelo fato
de que somos diferentes por temperamento, pontos de vista, gostos. O Evangelho
tem algo a nos dizer também neste aspecto tão comum e cotidiano da vida. Jesus
apresenta o caso de alguém que cometeu algo que é realmente equivocado em si
mesmo: ‘Se o seu irmão pecar...’. Não se refere só a uma culpa cometida contra
nós. Neste último caso é quase impossível distinguir se o que nos move é o zelo
pela verdade ou mais o amor próprio ferido. Em todo caso, seria mais uma
autodefesa que uma correção fraterna.
Dignidade – Por que diz Jesus: ‘mostre o erro dele, mas em particular’? Antes de
tudo, por respeito ao bom nome do irmão, de sua dignidade. Diz: ‘entre vocês
dois’, para dar a possibilidade à pessoa de poder se defender e explicar suas
ações em plena liberdade. Muitas vezes, aquilo que, a um observador externo,
parece uma culpa, nas intenções de quem fez a ação, não é. Uma franca
explicação dissipa muitos mal-entendidos.
Correção – Mas isso não é possível quando o problema se leva ao conhecimento de
todos. Qual é, segundo o Evangelho, o verdadeiro motivo pelo qual é necessário
praticar a correção fraterna? Não é, certamente, o orgulho de mostrar aos outros
os erros que cometeram, para ressaltar nossa superioridade. Nem para desencargo
de consciência, para poder dizer: ‘Eu te disse. Eu te adverti! Pior para você,
se não me levou a sério’.
Fraterna – Não, o objetivo é ganhar o irmão; é o genuíno bem do outro, para que
possa melhorar e não se encontrar com desagradáveis consequências. Se for uma
culpa moral, [a correção é] para que não comprometa seu caminho espiritual e
sua salvação eterna. Nem sempre depende de nós o bom resultado da correção
(apesar das melhores disposições, o outro pode não aceitá-la, fazer-se mais
rígido); pelo contrário, depende sempre e exclusivamente de nós o bom
resultado... na hora de receber uma correção.
Dever – Não existe somente a correção ativa, mas também a passiva; não existe só
o dever de corrigir, mas também o dever de deixar-se corrigir. E aqui é onde se
vê, se somos suficientemente maduros para corrigir os demais. Quem quer
corrigir alguém tem de estar disposto a ser corrigido. Quando se vê que uma
pessoa recebe uma observação e se ouve que responde com simplicidade – ‘Você tem
razão, obrigado por ter me dito!’ –, você está diante uma pessoa de valor.
Cisco – O ensinamento de Cristo sobre a correção fraterna deverá ser lido sempre
junto ao que Ele diz em outra ocasião: ‘Por que você fica olhando o cisco no
olho do seu irmão, e não presta atenção na trave que há no seu próprio olho?
Como é que você pode dizer ao seu irmão: ‘Irmão, deixe-me tirar o cisco do seu
olho’, quando você não vê a trave no seu próprio olho?’ (Lucas 6, 41-42).
Amor – Em alguns
casos não é fácil compreender se é melhor corrigir ou deixar passar, falar ou
calar. Por este motivo, é importante ter em conta a regra de ouro, válida para
todos os casos, que o apóstolo Paulo oferece na segunda leitura (Romanos 13, 8.10)
deste domingo: ‘Não fiquem devendo nada a ninguém, a não ser o amor mútuo... O
amor não pratica o mal contra o próximo...’. É necessário assegurar-se, antes de tudo, de
que no coração se dê a disposição de acolhida à pessoa. Depois, tudo o que se
decida, seja corrigir ou calar, estará bem, pois o amor ‘não faz mal a ninguém’.
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